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O direito (dos parlamentares) de ir à praia

Chamou pouca atenção do público em geral um interessante diálogo travado nas páginas do Valor em princípios deste ano. O referido diálogo teve como protagonistas o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e o presidente do Senado, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN). O pano de fundo da discussão foram as medidas tomadas pelo governo para compensar a perda de arrecadação da CPMF.
Ao comentar sobre as queixas da oposição, que se sentiu traída com o anúncio das medidas fiscais, o ministro afirmou: “Está dentro do marco democrático eles (a oposição) criarem dificuldades, anunciarem que vão atrapalhar e votar contra o governo. Eles fazem isso e nós temos que fazer a outra parte, que é manter o equilíbrio do orçamento, o superávit fiscal, tranqüilizar o país. Não pode é ter inversão de papéis. Não pode é a oposição querer governar o país, principalmente, lá da praia” (Valor , 04/01/08).
A “praia” a qual o ministro se refere diz respeito, evidentemente, ao recesso parlamentar de fim de ano. A oposição, descontente com as medidas do governo, pediu convocação da Comissão Representativa do Congresso Nacional, em meio ao recesso, para solicitar esclarecimentos do ministro da Fazenda, Guido Mantega, e também para deliberar sobre um projeto de decreto legislativo para derrubar as medidas. O presidente do Senado optou por não reunir a comissão e esperar para debater as questões em fevereiro, afirmando: “Para esse assunto não há urgência. Não há nenhuma medida exorbitante. O que há, realmente, é a possibilidade de um debate muito mais aprofundado, muito mais consistente de que no restante desse recesso”, justificou Garibaldi, acrescentando que os parlamentares também têm direito a férias na praia. “Todo mundo tem direito a ir à praia. Menos os senadores?”, questionou (Valor , 09/01/08).
O diálogo revela um quadro, no mínimo, peculiar: enquanto parlamentares de diversos partidos da oposição clamavam por ação contra as medidas do governo, o Congresso se encontrava literalmente fora de serviço, inviabilizando qualquer discussão mais abrangente. Não é meu objetivo entrar no mérito ou demérito das medidas propostas pelo governo. Desejo, de fato, abordar um assunto mais elementar, mas não menos importante. Os parlamentares têm, por suposto, o direito de ir à praia, como todo mundo. Ocorre que os parlamentares, diferentemente de todo mundo, têm 54 dias de férias no ano: o recesso parlamentar, que vai de 18 a 31 de julho, e de 23 de dezembro a 1º de fevereiro.
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Os parlamentares têm o direito de ir à praia como todo mundo, mas diferentemente de todos, eles têm 54 dias de férias
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A situação atual, na realidade, representa uma evolução: até 2006, o recesso era de três meses. O trabalhador, por sua vez, goza de trinta dias de férias no ano, isso quando tem carteira assinada. Diante da pressão popular, na esteira dos escândalos do mensalão, o Congresso aprovou a Emenda Constitucional nº 50, em fevereiro de 2006, reduzindo o recesso para os atuais 54 dias e abolindo o pagamento de remuneração indenizatória para convocação extraordinária durante o recesso.
De fato, o processo que culminou na EC nº 50 já começara algum tempo antes. Em seu primeiro dia como líder do PT na Câmara, o deputado Arlindo Chinaglia abordou os temas que viriam a tomar corpo na referida Emenda. A idéia era reduzir o período de férias do Legislativo (além do Judiciário e do Ministério Público) com base no princípio de que todo trabalhador deve ter 30 dias de férias por ano (“Jornal do Brasil”, 02/02/2004). Os trinta dias de férias por ano são definidos pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), e nada mais natural que o Partido dos Trabalhadores tivesse como agenda estender a validade do dispositivo a todos, sem distinção.

Fonte: Valor

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