Setor financeiro pede cautela
O setor financeiro recebeu com “serenidade” a Medida Provisória 784, que aumenta o poder punitivo do Banco Central (BC) e traz inovações como o acordo de leniência. A afirmação é do presidente-executivo da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), José Ricardo Alves. No entanto, a matéria precisa de alguns ajustes e a CNF vai atuar nesse sentido.
“Feitos os devidos ajustes no texto, para a CNF, esta Medida Provisória poderá ser um importante instrumento para os órgãos reguladores do sistema financeiro ampliarem a disciplina do mercado. Contudo, é preciso muita cautela. O texto precisa ser cirúrgico para evitar o aumento no risco da atividade das instituições supervisionadas, pois quanto maior o risco, maior a despesa com observância e, consequentemente, maior o custo do crédito”, ponderou o executivo em entrevista exclusiva ao Valor.
A MP eleva o valor das multas que podem ser aplicadas pelo BC de R$ 250 mil para até R$ 2 bilhões. Para Alves esse ponto do texto precisa ser aperfeiçoado para garantir dois efeitos. O primeiro é que a multa tenha efeito pedagógico preventivo, ou seja, desestimule a prática de infrações. O segundo é o efeito punitivo, pois a multa também precisa “doer no bolso de quem decide assumir o risco intencional de descumprir a legislação vigente”.
No entanto, Alves avalia que a aplicação da multa tem que ser equilibrada. “Ela não pode ser aplicada sem uma dosimetria razoável para evitar a quebra de instituições que possam repercutir em uma situação de risco sistêmico”, diz.
Sobre o acordo de leniência, que dará ao BC a capacidade de efetuar delações premiadas para infrações administrativas, a avaliação de Alves é de que se trata de uma medida importante para instrumentalizar o BC com meios alternativos de solução de controvérsias, trazendo a possibilidade de resultados ainda mais efetivos das ações de supervisão e dissuasão de infrações.
Já o termo de compromisso, diz o presidente, pode ser um instrumento importante para ampliar o raio de alcance da fiscalização e contar com a iniciativa de o próprio regulado se apresentar espontaneamente para cessar a prática de ilícitos que possam prejudicar o mercado.
“São inovações importantes que ampliarão a eficiência do Estado na supervisão, regulação, fiscalização e punição de ilícitos no âmbito do sistema financeiro”, diz, complementando que em hipótese alguma haverá impunidade, pois o Estado será mais eficiente para fiscalizar e punir infrações cometidas no âmbito do sistema financeiro.
O porém, segundo Alves, é que a MP merece vários ajustes para que o texto aprovado seja claro, traga segurança jurídica e não deixe brechas. “Vamos sugerir ao Congresso Nacional algumas ponderações para garantir a efetividade da proposição idealizada e editada pelo Poder Executivo”, diz.
Entre os pontos, a CNF entende que são necessários ajustes na definição de infrações para evitar dúvidas na aplicação da norma. Para Alves é fundamental que haja clareza na definição das condutas a serem reprimidas e combatidas pelo Estado. “Queremos ajudar a sanar essas dúvidas”, diz.
O contexto da aplicação das penalidades também precisa estar claro, pondera o presidente, explicando que a redação tem de trazer quais são as situações agravantes, quais seriam as atenuantes de penalidades, quais os critérios para a dosimetria, quais as infrações mais graves e suas penas, qual o rito para celebração de acordo de leniência e qual a disciplina do termo de compromisso.
“Os avanços já contidos na Medida Provisória 784 podem ser aprimorados. Além de analisar as 97 emendas apresentadas pelos deputados e senadores, acreditamos que a relatoria da matéria será importante para a aprovação de um texto que fortaleça o papel do Banco Central, da CVM e do Coaf, de fiscalizar e punir ilícitos”, acrescenta.
Sobre a resistência do Ministério Público aos acordos de leniência administrativos serem fechados pelo BC, Alves aponta que MPF e BC terão de encontrar um ponto de equilíbrio, destacando que o BC segue obrigado a comunicar indícios de crime ao MPF.
Fonte: Valor
