Voto de migrantes afeta disputa eleitoral no pólo do etanol
Silvestre Ferreira da Cunha, de 40 anos, natural de Timbiras, nordeste maranhense, corta cana em Guariba, noroeste paulista, há dois anos. Ausente da terra que nasceu e cresceu, deixou de votar no presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2006. Lá, o petista foi quase uma unanimidade: teve 83,5% do apoio do eleitorado, quase o dobro da votação obtida na cidade em que passou aquele domingo, primeiro de outubro, sob o sol escaldante de um canavial, em que 46,8% optaram pelo então candidato à reeleição. Silvestre e outros 7 mil timbirenses que trabalham nos canaviais da região de Guariba contribuíram para elevar as estatísticas de abstenção em sua cidade de origem: 30,3%, bem maior que a média nacional de 16,75%.
A migração desses trabalhadores não tem peso estatístico para interferir no resultado nacional mas, para as próximas eleições municipais, seus efeitos político-eleitorais deverão ser mais sentidos. Silvestre é um dos que, tão logo retorne a Guariba (337 km a noroeste de São Paulo) no início de 2008, irá providenciar a transferência eleitoral. “Fica até mais fácil se tiver alguém que a gente conhece na política aqui pra quando a gente chegar já tiver de quem cobrar”, afirma, no estreito corredor da entrada da pequena casa que mora com outros 13 migrantes, todos timbirenses. A próxima safra será a sua terceira seguida e, se depender dele, continuará vindo todo ano. “A gente passa oito meses aqui. Metade do que a gente ganha gasta com aluguel, comida e passagem, e a outra metade a gente manda pra nossas famílias”, diz. Esse montante acumulado mensalmente varia de acordo com a produção do trabalhador, mas na média fica entre R$ 500 e R$ 700.
Situadas no topo do ranking dos municípios que mais geraram empregos no primeiro mandato de Lula, as cidades paulistas canavieiras registraram um decréscimo nos votos dados ao presidente em 2006 em relação à sua primeira eleição. Considerando-se as dez cidades que mais abriram postos de trabalho, todas paulistas e sucroalcooleiras, a votação de Lula foi de 40,7% em 2002 para 34,2% em 2006. Bem diferente dos dez municípios que mais receberam Bolsa-Família per capita. Nesses, a média de Lula saltou de 36,3% para 64,9%. A princípio, os números colocariam em xeque a geração de empregos como elemento capitalizador de votos, em contraposição aos programas de transferência de renda. No entanto, os postos de trabalho abertos nesses locais foram ocupados em sua maior parte pelos mais de 100 mil migrantes nordestinos e mineiros que passam cerca de oito meses por ano cortando cana em terras paulistas.
Em 2008, a área de cana plantada no Estado será maior, e, conseqüentemente, haverá mais trabalhadores migrantes no corte da cana. Como muitos deles já vivem neste trânsito desde a consolidação da importância do etanol para o PIB, há cerca de quatro anos, consideram-se com dupla residência: na cidade de origem e na de destino. Ficando a maior parte do tempo onde trabalham, começaram, aos poucos, a transferir seus títulos eleitorais, evitando, assim, puniçãoda Justiça Eleitoral e, de quebra, passam a participar dos processos eleitorais nas cidades em que trabalham.
Fonte: Valor