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Tributo verde cresce no continente, mas sai do radar brasileiro

O que há em comum entre México, Chile e Colômbia, além da colonização hispânica? Esses países latino-americanos foram pioneiros em alterar sua política fiscal para precificar emissões de carbono como forma de estimular a economia mais limpa.

O México foi o primeiro país a criar um imposto sobre a venda de combustíveis fósseis, em 2014, com base na intensidade de carbono: quanto maior a emissão de poluentes, maiores as taxas, sendo mais alta para o óleo diesel e para a gasolina.

O Chile seguiu a ideia, e foi o primeiro na América do Sul a promulgar uma lei para taxar as emissões, também em 2014.0 imposto faz parte de uma ampla reforma fiscal e teve como alvo o setor de energia, especialmente as termelétricas a carvão, com o objetivo de estimular a produção por fontes renováveis. As empresas terão de pagar USS 5 por tonelada de C02 liberada na atmosfera.

No ano passado, a Colômbia se juntou ao grupo: em sua última reforma tributária, introduziu um imposto de US$ 5 por tonelada sobre os combustíveis fósseis.

Com isso, o país espera reduzir 43 bilhões de toneladas de carbono até 2030, o que ajudará a cumprir os objetivos firmados no Acordo de Paris sobre mudanças climáticas. A Colômbia vai usar os recursos em projetos contra o desmatamento.

Nos dias 28 e 29 de setembro, um encontro do Banco Mundial em Bogotá reuniu ministros da Fazenda e técnicos da área tributária para discutir como a transição para a economia de banco carbono pode ser incentivada por meio de instrumentos fiscais. O Brasil foi convidado, mas não chegou a enviar representantes do governo.

“Enquanto outros países latino-americanos correram para regulamentar políticas fiscais para o clima, o Brasil está desconectado da agenda internacional em relação ao tema”, afirma Juliana Lopes, diretora de uma ONG internacional que estimula em presas e governos a divulgarem suas informações sobre carbono e água, a CDP (Carbon Disclosure Project).

Segundo Lopes, que participou do encontro em Bogotá, o México, o Chile e a Colômbia estão vislumbrando oportunidades ao atrelar suas políticas econômicas e fiscais à questão ambiental.

Os três países estão prestes a se tornarem membros da OCDE (Operação para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e também compõem, com o Peru, a Aliança do Pacífico, um acordo comercial que tem entre seus interesses o de criar um mercado comum de carbono.

Nesses países, os governos têm mostrado uma visão progressista sobre incentivos voltados à questão climática. “O Brasil também poderia se beneficiar dessa estratégia, pois temos matriz energética de base renovável e florestas, mas aqui a questão ambiental não está incorporada a uma agenda de desenvolvimento”, diz a diretora da CDP.

Não é por falta de subsídios: nos últimos anos, várias instituições e economistas produziram estudos sobre como a tributação pode auxiliar o país na transição para a economia de baixo carbono. Alguns deles foram realizados por encomenda do próprio Ministério da Fazenda.

Um desses estudos é o “Política Fiscal Verde no Brasil”, desenvolvido pelo GVCes (Centro de Estudos em Sus-tentabilidade da FGV) em 2013, com atualização em 2015. Partindo dos marcos regula tórios para a área no Brasil, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos e a Lei de Nacional de Mudanças Climáticas, o estudo conclui que as leis em vigor já têm instrumentos suficientes para estimulara economia verde. Não seria necessário criar novas leis ou taxas, só oferecer tratamento tributário diferenciado para produtos que cumprem metas ambientais.

“Sem uma reforma tributária mais abrangente, ninguém teria coragem de propor imposto sobre o carbono no Brasil, pois o país já é onerado com alta carga tributária”, diz Guarany Osório, coordenador de política e economia ambiental do GVCes.

Outra proposta, encomendada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia ao economista Bernard Appy, que trabalhou no Ministério da Fazenda no governo Lula, previa reformulação da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) com aumento da taxa sobre combustíveis fósseis e pecuária de baixa produtividade.

SEM PREVISÃO

A proposta não foi adiante. As crises econômica e política fizeram o tema sair do radar do governo.

A coordenação de meio ambiente e mudanças climáticas do Ministério da Fazenda é um grupo técnico cuja função é reunir esses estudos e avaliar a possibilidade de adotar um mecanismo semelhante aos dos vizinhos.

O Ministério da Fazenda informou em nota que neste momento não há uma definição quanto à adoção de um tributo ou de um sistema de comércio de licenças de emissão. Mas que, tendo em vista o cumprimento do compromisso do Brasil no Acordo de Paris, estão sendo avaliados mecanismos de precificação das emissões de gases de efeito estufa. O objetivo, segundo a Fazenda, é “gerar sinais de preço de longo prazo para estimular investimentos eficientes não só do ponto de vista econômico, mas também ambiental”. A equipe da pasta diz conhecer os estudos citados e informa que tem feito outras análises sobre o tema, como a revisão da experiência internacional em tributação de carbono.

ICMS ecológico, regulamentado em 17 Estados, é exemplo de sucesso no país

Um caso bem-sucedido no Brasil de aplicação de tributos já existentes para o incentivo a causas ambientais é o ICMS verde ou ecológico, regulamentado em 17 Estados.

Essa medida tributária permite que cidades brasileiras com áreas de preservação ou mananciais recebam um repasse diferenciado do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), que é um imposto estadual.

Segundo a lei atual, 75% do ICMS arrecadado fica nas mãos dos Estados, enquanto 25% vai para os municípios. Desses 25%, três quartos (18,75%) são repassados conforme o valor adicionado, proporcional a quanto cada município contribuiu na arrecadação, e um quarto (6,25%) é definido por lei estadual —e é aqui que entra o ICMC ecológico.

O Paraná foi o primeiro Estado a adotar o princípio, seguido por São Paulo e Minas Gerais. A ideia inicial era compensar financeiramente as cidades localizadas em áreas de preservação, que enfrentavam baixa arrecadação por não terem indústrias.

Embora não existam garantias de que o município utilize o recurso para fins ambientais, o ICMS verde tem se mostrado eficiente como instrumento de conservação.

“Na Mata Atlântica, 40% dos municípios que estão no bioma têm 17% ou mais de seu território coberto por unidades de conservação, muitas delas criadas para receber recursos do ICMS verde”, diz Monica Fonseca, consultora da ONG SOS Mata Atlântica.

Com população de pouco mais de 4.000 habitantes, a pequena Marliéria (MG) tem economia pouco pujante: prestação de serviços e agricultura são os pilares do PIB da cidade. Mas seu ICMS per capita é maior do que municípios de maior porte por causa do ICMS verde. Localizada no Vale do Rio Doce, Marliéria tem 76% do território coberto por duas unidades de conservação municipais.

Na Amazônia, o ICMS verde foi regulamentado em três dos seis Estados: Pará, Acre e Mato Grosso. Tem sido eficaz jjara promover políticas ambientais em cidades com alto índice de desmatamento. “No Pará, os municípios com maior índice de regularização ambiental são justamente os que recebem repasse de ICMS verde”, diz Eugênio Pantoja, diretor de políticas de desenvolvimento territorial do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. É o caso de Paragominas, que no passado foi um dos municípios amazônicos campeões em desmatamento.

Fonte: Folha de São Paulo

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