Tecnologia revoluciona o setor de seguros
O Valor Investe destaca que a velocidade com a qual as seguradoras conseguiram melhorar seu resultado operacional no Brasil a partir de 2018 chama a atenção. Grande parte do crédito tem de ser atribuído à acelerada transformação digital do setor. As ferramentas online, a automação, o uso de tecnologias como inteligência artificial, análise de dados, plataformas e a própria mudança de hábitos do consumidor, com uso maciço de smartphones, trouxeram aumento de eficiência, redução de custos, possibilidade de ganhos de escala e impulsionaram a criação de novos produtos.
O setor passou o ano de 2017 e boa parte de 2018 sob forte desconfiança sobre a capacidade de se recuperar após dois anos de queda das receitas financeiras, impactadas pelo ciclo que levou a taxa Selic de 14,25% para a casa dos 6%. Isso porque as seguradoras ganhavam muito mais aplicando os recursos no mercado financeiro do que com o negócio delas em si.
Para se ter ideia do tamanho do desafio, no segundo trimestre de 2016, o resultado financeiro consolidado de um grupo de cinco companhias — Porto Seguro, SulAmérica, BB Seguridade e IRB Brasil Re, todas listadas na B3, mais Bradesco Seguros — chegou a representar o dobro do operacional.
A partir do segundo semestre do ano passado, com a Selic já no nível de 6,5% ao ano havia 15 meses, o quadro começou a mudar. As seguradoras apresentaram forte crescimento dos resultados operacionais, que compensaram com sobras a redução das receitas financeiras. No segundo trimestre deste ano, o resultado operacional consolidado do grupo de cinco empresas atingiu o maior valor trimestral absoluto desde, pelo menos, 2015.
O impacto potencial do novo cenário digital sobre a indústria pode ser visto nos dados da Minuto Seguros, principal corretora online no país, que mostram que a plataforma tem sido muito eficiente em alcançar um público que estava fora do mercado. Segundo a insurtech, 70% de seus clientes de seguros de automóveis nunca tinham contratado apólices para seus veículos.
“Há muitas localidades onde não há ninguém que conheça seguros, como um corretor, e as pessoas ficam inseguras em comprar a proteção”, conta o CEO da startup, Marcelo Blay. “Mas, hoje em dia, quando alguém quer encontrar algo vai na internet e, no caso dos seguros, nos acham.”
“Estamos fazendo uma verdadeira transformação digital na SulAmérica”, afirmou o CEO da seguradora, Gabriel Portela, durante teleconferência com analistas para comentar os resultados do segundo trimestre.
O executivo citou soluções como o “médico na tela”, pela qual os pais de crianças até 12 anos podem fazer consultas em vídeo com um pediatra por meio de um aplicativo ou pelo site da empresa. A ferramenta permite que as pessoas “tirem dúvidas com o médico, que pode fazer diagnósticos de sintomas simples”.
Para o diretor de negócios e investimentos da Porto Seguro, Marcelo Picanço, “o papel da tecnologia é vital em várias dimensões”. Conforme o executivo, as ferramentas digitais permitem não apenas melhorar a experiência do cliente, como também levar um apoio de inteligência de dados e processos automatizados para facilitar o trabalho do corretor, além de, internamente, trazer ganhos de eficiência e de redução de custos.
A Porto foi pioneira em lançar um aplicativo, o “Trânsito+Gentil”, que usa a telemetria proporcionada pelos sensores dos smartphones para avaliar a maneira como o motorista conduz o veículo e, eventualmente, oferecer descontos na apólice, caso a pessoa tenha um perfil de direção mais seguro. A inciativa já ganhou rivais, como o app “Auto.Vc”, da SulAmérica, e o “Direção em Conta”, da Liberty.
Telemetria
A telemetria é uma das grandes apostas da indústria para obter uma melhor definição de preços, reduzir sinistros e criar novos produtos. “Chamamos isso de apólices conectadas”, afirma John Drzik, presidente da Marsh Global Risk and Digital.
“Por exemplo, no caso das propriedades, ações preventivas podem ser tomadas a partir do monitoramento ativo, em que sensores vão sinalizar os riscos em tempo real, como falhas em equipamentos, superaquecimento de máquinas, vazamentos e problemas elétricos.”
Em termos de benefícios para as próprias companhias, Picanço, da Porto, explica que um dos maiores ganhos vem da automação. Em alguns casos, aponta o executivo, a digitalização tornou quase instantâneos processos manuais que poderiam levar até dias para serem feitos.
A subscrição, por exemplo, tem sido um dos focos. “Uma vez automatizada, diminui o tempo necessário para gerar uma avaliação de risco e, consequentemente, agiliza o processo de emissão e comercialização da apólice”, aponta Mathias Jungen, CEO da Swiss Re Brasil.
A resseguradora suíça desenvolveu uma ferramenta que automatiza a subscrição de seguro de vida. A solução se comunica com um conjunto de regras pré-programadas no sistema, compatível com o Life Guide, o manual de subscrição online de vida e saúde da Swiss Re, atualizado a cada seis meses.
Outro exemplo de ganhos trazidos pela digitalização da indústria vem da insurtech Cilia, que desenvolveu uma solução proprietária para elaborar orçamentos de reparos de veículos baseado apenas em imagens. “Desse modo, o orçamento, em caso de um sinistro, é feito instantaneamente”, aponta o CEO, Daniel Barbosa.
Segundo o executivo, a automatização dos processos de vistoria e orçamento pode trazer uma economia de cerca de 70% para os custos das áreas de sinistro de uma companhia e torna instantâneo um processo que hoje leva, pelo menos, 48 horas para ser finalizado. A Cilia já trabalha com grande grupos seguradores, como Bradesco Seguros, Tokio Marine, Sompo, Generali e Essor, além de locadoras de veículos, entre as quais Localiza, Movida, Unidas e Locamerica.
O diretor comercial da Allianz, Eduardo Grillo, cita ainda como exemplo do impacto das soluções digitais sobre os processos das companhias a experiência da própria companhia no cálculo de riscos para veículos. “Por meio de 14 perguntas, um algoritmo faz o cálculo do risco do cliente e em um minuto conseguimos emitir a apólice para o veículo” , conta. “É uma transformação geral do nosso modelo de negócios”, diz Grillo, ao incorporar também modelos preditivos baseados em inteligência artificial e aprendizado de máquina.
Redes sociais
Os dados disponíveis online têm se mostrado recursos muito relevantes na avaliação de riscos e confirmação de perfis. As seguradoras já estão usando as redes sociais para cruzar informações fornecidas pelo segurado e até validar interesse segurável.
“A melhor forma de entender o consumidor é através do acompanhamento de redes sociais, pesquisas e análise de tendências”, afirma a diretora de vida e longevidade do IRB Brasil RE, Alessandra Monteiro. Para a executiva, “dados sobre estilo de vida, perfil de risco e poder aquisitivo podem auxiliar a subscrição de riscos de vida, por exemplo, de forma surpreendente”.
Dentro desse cenário, a tecnologia tem galgado degraus em importância nas estratégias das empresas. A Tokio Marine, por exemplo, investe só no Brasil R$ 100 milhões por ano em desenvolvimento digital, segundo o CEO da filial da seguradora japonesa, José Adalberto Ferrara.
Uma outra frente que surge como aposta das seguradoras é o desenvolvimento de soluções para apoiar o trabalho de corretores e assessorias. A Tokio Marine criou uma plataforma própria, a Brokertech, que oferece treinamentos sobre as 16 ferramentas digitais disponibilizadas pela seguradora à sua força comercial.
Para Ferrara, o investimento é necessário para aumentar vendas e reduzir custos operacionais. São soluções que permitem aos profissionais que atendem os consumidores usar inteligência artificial e análise de dados para prospecção de novos negócios e geração e conversão de leads, ou seja, a sinalização dada por um potencial comprador durante pesquisas pela internet.
Fonte: NULL