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Risco sistemático

O drama político sobre como regulamentar o setor financeiro, onde não faltou um enfático palavrão disparado por Timothy Geithner, obscureceu uma enorme questão não solucionada: o que fazer em relação às instituições financeiras grandes demais para que se possa admitir seu colapso.
Na realidade, as questões envolvendo essas instituições – bancos, seguradoras, corretoras e sabe-se lá o que mais – se avolumaram. Isso coloca um grande ponto de interrogação sobre um vasto segmento do sistema financeiro.
O governo não descobriu como tratar essas companhias em meio a uma crise e também não conseguiu decidir-se sobre como lidar com elas em tempos normais. Deveriam essas companhias manter seu formato atual, ser desmembradas ou submetidas a rédeas curtas e transformadas em estatais de serviços financeiros?
Em vez de receber respostas, os investidores estão assistindo batalhas políticas em disputa por território. Isso levou o Wall Street Journal a publicar uma matéria sobre a explosão de Geithner, que soltou um palavrão durante reunião, na semana passada, com agentes de supervisão financeira, como Ben Bernanke, presidente do Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA), Sheila Bair, presidente da Federal Deposit Insurance Corp. e Mary Schapiro, presidente da Comissão de Valores Mobiliários americana (SEC).
Entrementes, todo dia é Natal para o pessoal das grandes demais para falir, com os contribuintes do fisco no papel de Papai Noel. Basta ver como os gastos com pagamento de juros caíram à metade para bancos como o Citigroup Inc. graças a garantias sobre empréstimos e juros nulos, ou os 46 dias, no segundo trimestre, em que o Goldman Sachs negociou mais de US$ 100 milhões.
“A noção de grande demais para falir cria um círculo vicioso que precisa ser rompido”, disse Bair, da FDIC, nesta semana, durante audiência da Comissão do Senado para o Setor Bancário. “Hoje, acionistas e credores de grandes firmas financeiras têm racionalmente todo incentivo para assumir risco excessivo. Quando tudo vai bem, elas levam tudo; quando a coisa vai mal, nunca perdem mais do que investiram – e com a cláusula do grande demais para falir, o governo até funciona como socorro de última instância”.
Bair acrescentou, “essa história de grande demais para falir precisa acabar”. Grandiosas aspirações. É pena que o governo não possa dar as respostas mais simples que nos ajudem a alcançar esse objetivo. Examinemos, por exemplo, o que é, exatamente, uma empresa grande demais para falir e quantas existem.
Ninguém se dispõe a dizer com exatidão. Sem dúvida, sabemos que o grupo deve incluir os quatro grandes bancos: JPMorgan Chase & Co., Bank of America Corp., Citigroup e Wells Fargo & Co. O Goldman e o Morgan Stanley também entrariam no time.
A seguradora American International Group (AIG) e as gigantescas firmas de financiamento habitacional Fannie Mae e Freddie Mac possivelmente pertenceriam a esse clube. Mas, por outro lado, o governo já é dono delas.
Deveríamos também incluir empresas semifinanceiras, como a General Electric Co. ou Berkshire Hathaway Inc.? Será que Warren Buffett é grande demais para falir?
Durante uma audiência da Comissão da Câmara para Controle dos Serviços Financeiros, no mês passado, pediu-se a Bernanke que fornecesse um número. “Um número aproximado seria em torno de 25”, respondeu ele sem dar detalhes.
Uau! Esses 25 são um número assustadoramente grande. Quanto mais companhias grandes demais para falir existirem, mais difícil será para o governo contê-las. Afinal de contas, quanto mais empresas existirem nessa categoria, maiores serão as pressões, sem falar na fonte, mais disseminada, das contribuições de campanha.
E o que torna uma instituição grande demais para falir? O fator crucial poderia ser o volume de seus depósitos em relação ao fundo segurador da FDIC. Talvez o fator crítico seja a exposição de uma companhia ao mercado de balcão de derivativos, que movimenta US$ 600 trilhões. Outro critério poderia ser o alcance sistêmico de empresas como os bancos de custódia State Street Corp. e Bank of New York Mellon Corp.
Pelo menos saber quem são essas empresas e porque estão na lista permitiriam que os investidores monitorassem seu desempenho e avaliassem melhor seu valor.
Se, por exemplo, a Berkshire Hathaway estivesse nessa lista, um seguro contra uma falência da companhia provavelmente não custaria mais do que o dobro da obtenção de proteção mediante swaps de risco de crédito com o JPMorgan.
A questão maior é que as autoridades governamentais não conseguirão decidir-se sobre como lidar com essas companhias se não souberem o que o termo significa. Tampouco as empresas compreendem como poderiam sair desse clube.
“Se a definição de risco sistêmico for suficientemente imprecisa, as companhias poderão encontrar maneiras de driblar a definição e tornarem-se grande demais para falir sem serem definidas como grandes demais para falir”, disse o senador Robert Bennett durante a audiência. É claro que esse tipo de artifício seria mais provável caso “ser grande demais para falir” estigmatizasse as empresas. No cenário atual, não é o que acontece.
Hoje em dia, ser grande demais para falir é uma licença para imprimir dinheiro. É um status invejável – quem não gostaria de ganhar dinheiro como o Goldman Sachs? E, sendo limitado o número de membros desse clube, o risco real está em ser deixado do lado de fora.
Não é assim que deveria funcionar. A questão do grande demais para falir precisa ser posta no centro do palco e ser solucionada logo.
Caso contrário, tanto o secretário do Tesouro, Geithner, como todos nós, teremos razões para xingar.

Fonte: Valor

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