Reforma tributária nos EUA vai punir países exportadores
Um imposto de fronteira nos EUA poderá mudar completamente o modelo econômico baseado em exportação que trouxe prosperidade a milhões de pessoas na Ásia, disseram analistas, à medida que a região se dá conta das reformas propostas pelos republicanos no Congresso.
Embora a atenção ainda esteja concentrada na questão sobre se o presidente eleito Donald Trump vai impor tarifas sobre a China ou atacar companhias que transferirem produção para o exterior, as propostas para um regime tributário que pune as importações dos EUA poderão ter um efeito mais permanente e de maior alcance. “Penso que será uma grande questão para a Ásia”, disse Frederic Neumann, do HSBC em Hong Kong. “Isso também aumenta a ameaça de medidas de retaliação por parte de outros países.”
Dependendo do quanto um dólar mais forte irá compensar a mudança, um imposto de fronteira poderá inviabilizar o caminho adotado pelos países da Ásia, do Japão à China e agora pelo Vietnã, que construíram uma indústria baseada na exportação aos EUA, o que forçará a região a buscar um novo modelo econômico.
Várias propostas de imposto corporativo dos republicanos preveem impor um “ajuste de fronteira” sobre insumos importados, ao mesmo tempo que isentam exportações do imposto. A estrutura é similar ao imposto sobre valor agregado, mas como as companhias americanas podem deduzir os custos com salários, o efeito potencial se assemelha a uma tarifa sobre bens estrangeiros. Republicanos, como o presidente da Câmara Paul Ryan, se opõem à ameaça de Trump de impor tarifas e defendem uma reforma tributária, apesar da forte oposição de varejistas e outros setores dependente de importações. Republicanos pró-comércio veem isso como uma forma de evitar uma guerra comercial com a China, enquanto estimulam a produção industrial nos EUA.
Michael Gapen, do Barclays em Nova York, disse que incluiu tarifas sobre o México e a China em seu cenário base, mas alertou que há de “25% a 30% de chance de termos ajustes de fronteira”. Gapen avalia que é improvável que a valorização do dólar vá anular completamente essa mudança e o impacto dependerá de como os parceiros comerciais dos EUA vão reagir. Eles podem mudar seu próprio sistema, abrindo um processo na Organização Mundial do Comércio (OMC) ou retaliar de outras formas.
“O motivo desses planos prever um ajuste na fronteira é para tentar evitar uma reação”, disse Gapen. Os mais prejudicados serão os exportadores de produtos com baixa margem de lucro, onde pouco valor é acrescentado nos EUA e a demanda é sensível ao preço. Isso pode incluir muitos dos bens vendidos por varejistas americanos, como a Walmart, onde os preços mais altos provavelmente vão reduzir o consumo, atingindo seus produtores.
“Destacaria as economias altamente dependentes do comércio, como Coreia do Sul, Taiwan, China em certa medida, Malásia e Vietnã”, diz Neumann. “Índia, Indonésia e as Filipinas estariam menos exportas.”
Neumann também avalia que, mesmo se um ajuste na fronteira for compensado por uma forte ala no dólar, isso poderia levar a uma nova rodada de tensão nos mercados de câmbio, mesmo se os países asiáticos resistirem à tentação de intervir para proteger suas economias durante uma transição.
Em contraste com a tarifa que tem um país em particular como alvo, como a China, o imposto de fronteira vai afetar as importações de países do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês), atingindo até mesmo montadoras que têm alguma produção no Canadá ou no México. “Parece que a proposta de um novo código tributário será punitivo para os carros importados e conteúdo de qualquer nação”, observou o analista Kurt Sanger, do Deutsche Bank. “Precisamos redefinir nossas análises sobre fração de importação para incluir México e Canadá.”
Montadoras japonesas estão bem avançadas na produção local na América do Norte, mas muitas colocaram algumas fábricas no México ou Canadá. As importações correspondem a 34% dos carros que a Honda vende nos EUA, enquanto esse número é de 45% para a Nissan, 50% para a Toyota e 100% para a Mazda, segundo o Deutsche.
No caso da Hundai, as importações representam 41% e, para a Kia, 63%, embora essa produção venha de suas matrizes na Coreia do Sul, em vez do México ou Canadá, portanto, o risco potencial para a economia nacional é maior.
Todos serão prejudicados por um imposto de fronteira, mas o encargo real vai depender de quanto do produto final é feito nos EUA. De acordo com Sanger, no geral, as companhias japonesas estão melhores que as sul-coreanas e não estão em posição pior que as rivais americanas, considerando a forte dependência delas na produção no México.
Fonte: Valor