Processos políticos congestionam os tribunais superiores na volta do recesso
BRASÍLIA – Os tribunais superiores voltam hoje do recesso de julho com processos que poderão mudar o rumo das eleições de outubro. Ações envolvendo o mensalão, as sanguessugas, a minirreforma eleitoral e a abertura de CPIs devem dominar o dia-a-dia dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em contrapartida, casos de relevância para investidores e a economia terão maiores dificuldades para serem colocados na pauta de julgamentos.
A definição do marco regulatório no saneamento é bastante esperada por investidores e se arrasta há 12 anos no STF. O pagamento de Cofins pelas prestadoras de serviços é outro processo cuja decisão irá movimentar bilhões de reais e não tem data para ser decidido. O fim do monopólio dos Correios é outro assunto, cujo posicionamento do Supremo é importante para o mercado. Enquanto processos de forte interesse econômico encontram-se sem previsão para julgamento, assuntos relevantes para o mundo político deverão ser o destaque dos tribunais logo na primeira sessão de julgamento após o recesso, marcada para amanhã.
O STF decidirá, nessa terça-feira, ação do PT contra o bloqueio de CPIs na Assembléia Legislativa de São Paulo. Esse julgamento deverá ter conseqüências importantes para as eleições, pois a ação foi proposta justamente para permitir a abertura de investigações contra a administração do candidato Geraldo Alckmin no governo paulista.
A expectativa é que o STF libere a abertura das CPIs em São Paulo, assim como fez no caso da CPI do Bingos, no ano passado. Na ocasião, o Supremo concluiu que o direito da minoria dos parlamentares deve ser reconhecido e permitiu o início da CPI – um tormento para o governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Agora, o tribunal decidirá sobre 69 pedidos de CPIs na Assembléia paulista e, portanto, há o risco de Alckmin se ver acuado em meio a explicações em plena campanha eleitoral.
Ainda na terça-feira, o TSE decidirá se os deputados acusados de corrupção no escândalo das sanguessugas podem perder o mandato. Caso a resposta do TSE seja positiva, quase cem parlamentares estarão impedidos de concorrer à reeleição.
A volta do recesso também marca a retomada de dois inquéritos, cujas decisões terão impacto nas eleições de outubro: o caso do mensalão e o das sanguessugas. O inquérito do mensalão não será concluído até outubro. A expectativa é que o caso demore até cinco anos para chegar a uma conclusão. Mas determinações no processo como a que tornaram indisponíveis os bens do publicitário Duda Mendonça, podem ganhar repercussão no período eleitoral e, dessa forma, afetar a disputa.
Já o inquérito das sanguessugas deverá ter a sua tramitação acelerada devido a uma estratégia adotada pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Ele separou os pedidos de investigação por parlamentares. Assim, o inquérito foi desmembrado, agilizando as investigações caso a caso.
O STF também deverá decidir, neste mês, se as regras da minirreforma terão validade para a votação de outubro. As regras foram aprovadas neste ano pelo Congresso para reduzir o custo das campanhas e estabeleceram o fim dos showmícios, da distribuição de brindes e camisetas e da campanha em outdoors. O PDT, do candidato Cristovam Buarque, e dois partidos nanicos – o PSC e o PTC (social e trabalhista cristão) – ingressaram no STF contra as mudanças.
O julgamento da minirreforma deverá marcar um conflito entre jurisprudências do tribunal. Se por um lado, o STF não altera decisões do TSE – e o TSE foi a favor da maior parte das medidas da minirreforma -, por outro, o Supremo decidiu, no início deste ano, que não aceita modificações nas regras das eleições durante o ano do pleito. Este último posicionamento foi tomado, por 9 votos a 2, no julgamento da regra da verticalização e, agora, poderá derrubar a minirreforma.
Relator das ações do PDT e dos partidos nanicos, o ministro Ricardo Lewandowski também tem processos econômicos importantíssimos para julgar. Ele pediu vista da ação que definirá se o governo deve ou não pagar pensões a aposentados em valores iguais a 100% dos vencimentos do morto. O ministro Gilmar Mendes foi contrário a essa equiparação, mas Eros Grau foi favorável. Lewandowski ficou de apresentar uma solução. São bilhões de reais em jogo para os cofres da Previdência.
O excesso de processos de políticos na pauta não é uma preferência dos ministros do Supremo. Eles acabam sendo convocados para tomar decisões urgentes envolvendo CPIs e são pressionados pelo calendário eleitoral a dar respostas antes do período de campanha.
O STF também está se esforçando para dar uma resposta às demandas econômicas. Neste mês, o tribunal tentará decidir a correção da tabela do imposto de Renda, a cobrança de taxa de fiscalização pela Comissão de Valores Mobiliários, e a possibilidade de as empresas com nome no Cadastro de Inadimplentes (Cadin) receberem incentivos fiscais.
Há também processos com repercussões ao mesmo tempo políticas e econômicas. A transposição do Rio São Francisco – um projeto político do governo atual aguardado por investidores – transformou-se num caso de difícil solução no STF. Há 14 ações sobre o assunto, cada uma com um pedido diferente, o que está dificultando o tribunal quanto à forma de organizá-las para, em seguida, realizar o julgamento. Quem sabe, antes das eleições.
(Juliano Basile | Valor Econômico)
Fonte: Valor