Previdência emperrada
Dois anos depois da criação do sistema eletrônico pelas seguradoras para acelerar os processos de migração de Planos Geradores de Benefícios Livres (PGBLs), Vida Gerador de Benefícios Livres (VGBLs) e tradicionais entre instituições, os participantes ainda têm dificuldades em transferir recursos. Nesse período, segundo a Federação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), R$ 2,5 bilhões mudaram de uma empresa para outra. Mas apenas 72% dos 82 mil pedidos até março foram plenamente liquidados e o participante já pode acompanhar sua aplicação na seguradora nova e fazer aportes. Além da falta de eficácia em mais de um em cada quatro pedidos de portabilidade, os investidores também sofrem com a demora de meses para o pleno encerramento desses processos. Um deles até conseguiu na Justiça indenização por danos morais pela demora.
Os fatores que dificultam esse processo podem ser muitos. O principal deles está em questões burocráticas. Diferentemente de uma simples transferência entre fundos ou contas, a migração de planos de previdência exige ainda papéis e assinaturas das partes envolvidas. Por se tratar de um processo que envolve o preenchimento de requerimentos e com diversas variáveis, ele fica mais vulnerável a erros. Se é feito um pedido de transferência de PGBL para VGBL, por exemplo, a migração emperra, já que isso não é permitido por lei. Também não é possível mudar a forma de recolhimento de imposto de renda, de regressiva para a progressiva, por exemplo. Como as diferenças gramaticalmente são tênues, surgem os problemas.
O ambiente automatizado, denominado Sistema para Intercâmbio de Documentos Eletrônicos (Side), criado em abril de 2006, conseguiu melhorar essa situação. O prazo médio total para migrações foi reduzido de 55 dias, no lançamento, para 16 em março, último dado disponível. Segundo Marco Antonio Rossi, presidente da Bradesco Vida e Previdência e vice-presidente da Fenaprevi, o tema era motivo de reclamações dos participantes para a Superintendência de Seguros Privados (Susep), mas agora essas queixas são menos freqüentes. “Os números de reclamações reduziram-se drasticamente.” Porém, norma da Susep, que regula o setor, exige prazo de apenas cinco dias úteis para que isso ocorra, embora seja discutível quando exatamente esse prazo começa a ser contado.
As dificuldades para migração podem crescer quanto mais distante estiver o investidor dos grandes centros urbanos, diz Rossi. Também será mais provável o participante encontrar obstáculos ao migrar quanto mais antigo tiver contratado seu plano. Mas ele lembra que, independentemente do prazo do processo de migração, o investidor não fica sem ter rentabilidade sobre os recursos investidos nenhum dia. O patrimônio só deixa de render no primeiro plano quando o dinheiro for para o segundo, explica.
O Side foi criado justamente para tentar sanar o problema com a migração dos dados, comenta Renato Russo, vice-presidente de Previdência e Vida da SulAmérica e também integrante da Fenaprevi. Vale destacar que a média de R$ 130 mil em transferências mensais registradas no Side nos últimos 12 meses está ainda distante de incomodar os sistemas operacionais de um setor que tem patrimônio de R$ 129 bilhões, embora o excesso de burocracia dificulte. Em números absolutos, a média foi de 3.574 portabilidades cadastradas por mês nos últimos 12 meses, segundo a federação. No mesmo período, foram recusados 622 pedidos por mês.
Há poucas dúvidas de que os pedidos de transferência tendem a aumentar por conta do crescimento do setor, que avança a ritmo percentual de dois dígitos por ano, ou pelo aumento do patrimônio dos participantes. A idéia é que, quanto mais recursos acumulados, mais o participante vai se preocupar com o retorno e migrar. A média de saldo nas migrações é de R$ 45 mil.
“O crescimento das migrações é ótimo, porque significa um mercado mais concorrido e mais maduro”, diz Rossi. Nessa linha, Russo acredita que, à medida que o mercado amadureça, os investidores tenderão a procurar com mais cuidado o seu prestador de serviço e, daí, irão migrar com mais freqüência.
Fonte: Valor