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Previdência complementar em transformação: longevidade, tecnologia e sustentabilidade

Vivemos um tempo em que a velocidade das transformações nos desafia a repensar modelos, estratégias e até mesmo o significado de segurança para o futuro. No setor de previdência complementar, essas mudanças são ainda mais críticas: falamos de decisões que precisam garantir sustentabilidade por décadas, em um cenário marcado por incertezas.

O setor previdenciário, em todo o mundo, enfrenta pressões semelhantes: envelhecimento populacional, necessidade de inovação em produtos e busca por governança mais sólida. O relatório Pension Markets in Focus 2025, da OECD, indica que os ativos de previdência nos países da organização alcançaram 61,5 trilhões de dólares ao final de 2024, reforçando a relevância e a dimensão desse mercado (OECD, 2025).

Neste artigo, compartilho algumas das tendências que moldarão o setor nos próximos anos e como essas forças reposicionam a previdência complementar como um serviço essencial de planejamento financeiro e de vida.

A longevidade como megatendência

O Brasil caminha rapidamente para ser um país com muitos idosos. Projeções do IBGE estimam que um terço da população terá mais de 60 anos em 2050 (IBGE, 2024). Isso significa maior pressão sobre o regime público de previdência e, consequentemente, uma demanda crescente por planos complementares.

O desafio está na sustentabilidade atuarial: planos precisam oferecer soluções que acompanhem vidas mais longas, como rendas vitalícias, planos híbridos e integração entre previdência e saúde. A longevidade também exige repensar contribuições, fórmulas de benefícios e estratégias de investimento de longo prazo. O Global Risks Report 2025, do World Economic Forum, alerta que crises de pensão tendem a se intensificar em sociedades envelhecidas, reforçando a urgência de adaptação do sistema previdenciário (WEF, 2025).

Digitalização e inteligência artificial

A tecnologia já não é diferencial, é requisito. Na previdência, isso significa jornadas digitais de contratação, atendimento via chatbots e simulações personalizadas com base em algoritmos preditivos.

No backoffice, a IA é aliada na prevenção a fraudes, na melhoria da governança e no compliance regulatório. E o open finance abre espaço para que a previdência complementar seja ofertada em múltiplas plataformas, de seguradoras e entidades a insurtechs e HR Techs, ampliando o acesso da população, mas também acirrando a concorrência.

Educação financeira e flexibilidade dos produtos

Nenhum plano sobrevive sem adesão voluntária. E isso depende de conscientização. Cada vez mais, a previdência precisa ser comunicada como parte do bem-estar financeiro, não apenas como uma alternativa de acumulação para o futuro.

Produtos flexíveis, adaptados ao ciclo de vida, com resgates simplificados e portabilidade facilitada, tendem a atrair pessoas em diferentes fases da vida, que buscam clareza e autonomia em suas decisões financeiras.

ESG como imperativo

Pressões de investidores, reguladores e da sociedade levam seguradoras e entidades de previdência a incorporarem práticas ESG de forma efetiva. Mais que uma tendência, é um imperativo competitivo: quem não alinhar seus investimentos a critérios ambientais, sociais e de governança corre o risco de perder legitimidade perante participantes e mercado.

Na prática, isso significa adotar políticas de investimento responsável, criar métricas socioambientais claras, ampliar a transparência na alocação de recursos e fortalecer mecanismos de governança. Incorporar ESG também implica avaliar riscos de longo prazo ligados a mudanças climáticas, desigualdade social e condutas corporativas, integrando esses fatores ao processo de decisão e ao relacionamento com participantes. Ao fazê-lo, a previdência complementar reforça sua relevância como agente de geração de valor sustentável para pessoas, mercado e sociedade.

Supervisão baseada em risco

Outro aspecto central é a evolução regulatória. A SUSEP vem ampliando a aplicação da supervisão baseada em risco, exigindo das entidades estruturas robustas de gestão de riscos, controles internos e adequação de capital (SUSEP, 2025). Isso fortalece a confiança no setor e garante que seguradoras e entidades estejam preparadas para enfrentar cenários adversos sem comprometer os compromissos assumidos.

Conclusão

Entre tantas forças em movimento, três tendências se destacam como as mais transformadoras para a previdência complementar:

  • O envelhecimento populacional, que pressiona a sustentabilidade dos planos;
  • A digitalização e a inteligência artificial, que mudam a experiência dos participantes e a eficiência das operações;
  • A educação financeira e a flexibilidade, que influenciam a adesão e a permanência das pessoas nos planos.

Somadas às exigências de ESG e à supervisão baseada em risco, essas tendências reposicionam a previdência complementar como parte essencial de um ecossistema de planejamento financeiro e de bem-estar ao longo da vida. O desafio e a oportunidade é construir soluções inclusivas, sustentáveis e inovadoras, que deem segurança e dignidade em uma sociedade cada vez mais longeva.

Referências

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Projeção da População do Brasil. 2024. Disponível em: <https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9109-projecao-da-populacao.html?=&t=resultados>. Acesso em: 22 ago. 2025.

OECD – Organisation for Economic Co-operation and Development. Pension Markets in Focus 2025 – Preliminary 2024 Data. Disponível em: <https://www.oecd.org/content/dam/oecd/en/topics/policy-sub-issues/asset-backed-pensions/PMF%202025%20-%20Preliminary%202024.pdf>. Acesso em: 22 ago. 2025.

SUSEP – Superintendência de Seguros Privados. Supervisão baseada em risco. Solvência – Regulação Prudencial. 2025. Disponível em: <https://www.gov.br/susep/pt-br/assuntos/informacoes-ao-mercado/solvencia-regulacao-prudencial-1>. Acesso em: 22 ago.2025.

WEF – World Economic Forum. Global Risks Report 2025. Disponível em: <https://www.weforum.org/publications/global-risks-report-2025/>. Acesso em: 22 ago. 2025.

Daniela Paschoal

Conselheira Consultiva Sou Segura e Professora da Escola de Negócios e Seguros
Advogada, professora, palestrante. Especialista em Seguros, Previdência e Gestão de Riscos, com atuação nos mercados financeiro, de seguros e previdência, na gestão das áreas de Compliance, PLD, Controladoria e Operações. Mestre em Gestão de Negócios. MBAs em Direito do Seguro, Resseguro e Gestão de Seguros. Autora do livro Risco e Compliance, coautora dos livros Previdência Privada - Cases de Sucesso e Mulheres no Seguro.

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