Para base, Previdência exige mais concessões
A reforma da Previdência enfrenta amanhã a última etapa na comissão especial que analisa a proposta de emenda à Constituição (PEC) apresentada pelo governo: a votação dos destaques. Na última quarta-feira, o texto base do relator, Arthur Maia (PPS-BA), foi aprovado por 23 votos a 14 na comissão especial.
Para conseguir o apoio, o governo precisou arquitetar a troca de integrantes do colegiado e fazer muitas concessões, como reduzir a idade mínima de aposentadoria para mulheres, que foi de 65 para 62 anos, e voltar a vincular a pensão por morte ao salário mínimo. Vencida essa etapa, o desafio é maior. Para que a reforma passe no plenário da Câmara, é preciso convencer ao menos 308 deputados, três quintos dos 513, a votarem “sim” em dois turnos.
Com o objetivo de discutir a estratégia daqui para frente, o presidente Michel Temer reuniu-se ontem com Maia, com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e com o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, no Palácio da Alvorada. Eles também conversaram sobre a reforma trabalhista, que tramita no Senado , e o governo quer ver aprovada em dois meses. Antes, Temer almoçou com o presidente da Casa, Eunício Oliveira (PMDB-CE) para tratar do tema.
Conseguir convencer os parlamentares da necessidade da reforma da Previdência nos moldes que o governo defende exigirá maior prazo e, provavelmente, mais concessões. “Usaremos o tempo que for necessário para o convencimento”, defende o líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). O texto dificilmente terá a votação antes do fim de junho no plenário. No início deste ano, a expectativa era de que passasse pelas duas casas do Congresso até essa data.
Embora boa parte da base aliada acredite que a simples explicação das mudanças possa garantir muitos votos, o mais provável, avaliam lideranças partidárias, é que essa estratégia não seja suficiente. Por isso, pontos importantes do texto ainda estão em jogo, o que pode comprometer ainda mais a economia buscada com a reforma. No início da tramitação na Câmara, esse ganho era estimado em R$ 800 bilhões em 10 anos. Com as alterações sugeridas pelo relator, foi reduzida para R$ 600 bilhões.
Margem pequena
“Acho que ainda há espaço para negociação, mas não muito”, avalia o advogado Andre Fittipaldi, especialista em direito previdenciário da Tozzini Freire. Ele diz que o governo “pesou a mão” em alguns itens e teve de voltar atrás em várias questões. Sobrou pouca margem para negociar.
Segundo ele, os principais problemas enfrentados pela reforma são a aposentadoria precoce, que será evitada com a instituição da idade mínima, e os altos gastos com pensões, problema que o governo também pretende resolver ao instituir novo cálculo para o benefício e limite de dois salários mínimos para que ele seja acumulado com a aposentadoria. Outros itens, na opinião de Fittipaldi, ainda têm margem para ser negociados. Isso inclui assuntos que devem ser retomados em plenário, como a exclusão dos militares e os detalhes das aposentadorias especiais.
É mesmo importante que haja margem para discussão, porque vários deputados governistas ainda têm críticas à proposta. Há quem afirme que não votará favoravelmente a não ser que novas alterações sejam feitas. A deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP), por exemplo, da base aliada, não ficou satisfeita com as mudanças incorporadas no parecer de Arthur Maia. Ela tem uma lista de pontos que, sem mudança, farão com que rejeite o texto.
Um dos itens que ela defende é a manutenção do Benefício de Prestação Continuada (BPC), concedido a idosos e deficientes de baixa renda. De nada adianta, segundo ela, manter o vínculo do benefício com o salario mínimo, aumentando a idade de concessão para 68 anos. “Uma das coisas que pedi muito foi para não desvincular. O relator atendeu. Mas, na verdade, meu pedido era para não mexer no BPC”, explica.
_______
Servidor quer integralidade
O ponto com maior chance de ser modificado na proposta de emenda à Constituição (PEC) da reforma previdenciária é quanto aos servidores públicos, que estão insatisfeitos com o endurecimento das regras propostas pelo relator. Agora, para conseguir a paridade e a integralidade – ou seja, a possibilidade de manter, quando se aposentar, o último salário e receber os mesmos aumentos que os funcionários na ativa – os servidores que ingressaram antes de 2003 no serviço público precisarão completar 62 anos de idade, no caso de mulheres, e 65, se forem homens.
Há temor do governo de que seja grande a reação negativa aos trabalhadores da iniciativa privada caso o plenário volte atrás na decisão. Mas a cobrança dos servidores é forte. Nos bastidores, repercute muito a influência de detentores de carreiras influentes, como juízes e procuradores, que resistem a abrir mão das regras atuais. “São muitas pressões nesse sentido. O Judiciário está batendo forte nessa questão. É bem provável que mude ainda na Câmara”, afirma um deputado da base aliada.
Resistência
Na opinião do coordenador de Previdência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Rogério Nagamine, o ideal seria que o Legislativo não cedesse à pressão. “Considero importante que se mantenha essa condicionalidade. Integralidade e paridade são benefícios muito grandes. Já é uma grande bondade deixar a chance de que, ao atingir as idades mínimas, os servidores mantenham os privilégios”, avalia.
Flexibilizar a regra, segundo o especialista, certamente impactaria negativamente a economia esperada pela reforma. “Não há como estimar as perdas por ora. Mas não há dúvidas de que voltar atrás seria um erro muito grande. Seria manter um privilégio que não se justifica”, defende Nagamine. O ideal, segundo ele, seria fazer o cálculo do benefício pela média dos salários, corrigidos pela inflação.
A manutenção do Benefício de Prestação Continuada (BPC) é outro tema que tem grande apoio na Câmara e preocupa o governo. O deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG), um dos defensores da manutenção das regras atuais, foi retirado da comissão especial porque votaria contra o texto.
“Francamente, acho que a PEC não alcançará os 308 votos nem mesmo fazendo mudanças. Essa é a minha leitura política”, afirma.
O parlamentar tem dúvidas de que as negociações avancem. “Não sei se o governo está disposto a ceder, porque cada hora vejo alguém falando uma coisa diferente. Primeiro diz que não pode ceder, depois afirma que tem que esperar o tempo necessário. Não acho que essa reforma será concluída tão cedo”, avalia Barbosa.
Fonte: Correio Braziliense