Para analistas, queda na bolsa é temporária
Mercado de capitais Papéis de empresas focadas no mercado interno de consumo estão se saindo melhor
As ações das empresas de shopping center garantiram retornos estonteantes para os investidores nos últimos anos. Somente em 2012, a valorização superou os 50%, pelo menos no caso das quatro grandes, Aliansce, BR Malls, Iguatemi e Multiplan. Neste ano, acabaram afetadas pela tendência generalizada de baixa da bolsa. Mas a queda é cerca da metade do que a bolsa está perdendo e está longe de ter apagado os ganhos do passado.
Além disso, os analistas especializados continuam otimistas e não hesitam em recomendar as ações do setor. A queda é temporária, garante Eduardo Silveira, analista da BES Securities. Houve um movimento de aversão ao risco nas últimas semanas que afetou praticamente todo o mercado de ações. Mas os papéis de empresas focadas no mercado interno de consumo estão se saindo melhor. Para quem investe a longo prazo não é preocupante, disse Daniel Utsch, da Fator Corretora de Valores.
Guilherme Rocha, analista do Credit Suisse que acaba de soltar um relatório a respeito de shopping centers, afirma que, passada a queda, as ações do setor voltam a representar uma boa oportunidade de investimento.
O analista alinha pelo menos quatro argumentos. Um deles é que as ações de shopping centers são consideradas uma defesa para o investidor em um cenário de indefinição e de inflação em alta porque a receita das empresas do setor acompanha a variação dos preços. É prática comum entre os shoppings reajustar os aluguéis das lojas por índices como o IGP-M, o que garante que o faturamento não fique defasado quando a inflação acelera, como ocorre no momento, pressionada pela valorização do dólar e elevação dos alimentos. Outro é que o juro real de longo prazo está perto do pico, depois da escalada das últimas semanas, desencadeada pela elevação da taxa básica de juros. Isso favorece as ações de shopping, que costumam subir quando os juros caem ou estacionam e vice-versa.
Além disso, há a expectativa de recuperação das vendas no segundo semestre, não só por motivos sazonais mas também pelo desenvolvimento dos novos projetos das empresas do setor. Os economistas esperam que o varejo tenha um desempenho melhor quando arrefecer a tendência de alta da inflação, em algum momento no terceiro trimestre.
Foi o repique da inflação, especialmente de alimentos, que explicou o crescimento menor das vendas entre o último trimestre de 2012 e o primeiro deste ano. Os negócios mais atingidos foram os voltados ao público das classes B e C. De toda forma, as vendas dos shoppings sempre crescem mais do que o varejo em geral. Enquanto o varejo desacelerou de um crescimento de 8,4% no quarto trimestre de 2012 para 3,5% no primeiro trimestre deste ano, as vendas dos shoppings mantiveram uma expansão ao redor de 7,5%.
Rocha acredita que as vendas dos shoppings continuarão crescendo mais do que a média do varejo e que as empresas mantenham seus ambiciosos planos de expansão, que também contribuiu para o aumento das receitas.
O surgimento de novos shoppings, dizem os analistas, não deve prejudicar o crescimento do setor. A oferta de espaço para lojistas deve continuar relativamente reduzida mesmo após 2014, avalia Rocha, porque há muita oportunidade para crescimento nas cidades médias. O Credit Suisse calcula que existam 76 shoppings atualmente em construção, que vão ampliar em 2,2 milhões de metros quadrados a Área Bruta Locável (ABL) até o fim do próximo ano, cerca de 20% a disponibilidade atual.
Cerca de um quarto dos novos empreendimentos estão sendo construídos em cidades sem nenhum shopping no momento e 60% onde a disponibilidade de ABL por habitante é inferior a 100 metros quadrados.
Há, porém, a expectativa de que as fusões e aquisições continuarão ocorrendo no setor, embora em ritmo menos acelerado do que no passado uma vez que os alvos mais óbvios já foram adquiridos e a oferta de oportunidades está diminuindo. O setor ainda é muito fragmentado, afirma Rocha, uma vez que os dez maiores do setor detêm cerca de 30% dos negócios.
Silveira, da BES Securities, atribui boa parte da recente queda das ações de shoppings às vendas de posições feitas pelos investidores estrangeiros, que foram mais influenciados pela expectativa de alta dos juros nos EUA, que surgiu depois que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) sinalizou que pode reverter a política de afrouxamento quantitativo até o fim do ano. Espera-se que assim que economia americana melhorar e a taxa de desemprego diminuir no país, o Fed vai reduzir as compras de títulos públicos feitas para injetar liquidez nos mercados. Em um segundo passo, os juros americanos devem subir, atraindo de volta o capital que foi para outros lugares em busca de retornos mais elevados.
Os estrangeiros absorveram cerca da metade de recentes emissões de ações da Aliansce e Multiplan. Eles gostam do investimento em shopping pela mesma vantagem que atrai Silveira: a previsibilidade do fluxo de caixa. O caixa de um shopping depende de fatores simples como área alugada para as lojas, receita de aluguel, taxa de vacância, perspectiva de crescimento das vendas e inflação. Os shoppings, disse o analista, têm alta geração de caixa, uma característica bastante desejável em um investimento. A margem em relação ao lucro antes dos impostos, juros e depreciação (Ebitda) varia de 70% a 80%. O resultado acompanha principalmente a receita com a ocupação e, em menor proporção, as vendas das lojas.
O poder de negociação com o lojista é elevado, e facilmente os aluguéis são corrigidos a taxas acima da inflação, disse Silveira. Mesmo durante a crise internacional, em 2008 e 2009, os shoppings conseguiram repassar a inflação para o aluguel, que em geral tem um percentual fixo (80%) e uma parcela variável conforme as vendas.
Índice feito pelo Fator com a evolução das ações das seis empresas de shopping negociadas em bolsa, ponderado pelo valor de mercado das companhias, mostra que o setor vem superando o Ibovespa desde 2010, com descolamento relevante, informou Tales Paes, especialista na área da Fator.
Fonte: Valor