Os fundos de fundos como ferramenta de diversificação – Artigo
A indústria de fundos de investimentos no Brasil alcançou um patrimônio de aproximadamente R$ 3,6 trilhões em maio de 2017, segundo dados da Anbima. A categoria multimercados, que representa cerca de 19% do total da indústria, tem sido a classe preferida de gestores de fundos de fundos que detém alocação de cerca de R$ 106 bilhões em fundos multimercados locais.
Em linhas gerais, fundos de fundos são utilizados por alocadores e gestores de fortunas como ferramenta de diversificação, e podem proporcionar a seus investidores o acesso a fundos fechados para captação, redução de aplicação inicial, além de outros benefícios.
O desempenho dessa classe de ativos indica que houve geração de alfa, ou seja, os fundos de fundos agregaram valor ao investidor e entregaram retornos acima do índice de referência nos últimos anos.
Em março de 2017, considerando apenas a classe de fundos multimercados, os dez maiores fundos alocados detinham 60% dos recursos destinados à classe de ativos e os dez maiores alocadores representavam 83% do volume da indústria de fundos de fundos, segundo dados da Quantum Axis. Para a análise foram considerados apenas fundos multimercados e foram excluídos fundos comprados geridos pelo mesmo gestor do fundo comprador.
Como empresas de gestão de fortunas e bancos de investimentos delegam a seleção de fundos para os chamados gestores de fundos de fundos, entender como pensam e como selecionam seus ativos investidos é de grande importância, supondo que são investidores profissionais, qualificados para a tarefa e tomam decisões de maneira mais eficiente e inteligente do que o público em geral.
Grande parte da literatura sobre o assunto traz como tema principal a construção de carteiras sob a ótica de diversificação, ou seja, discute o melhor método para construção de um portfólio que maximize o retorno minimizando risco. No entanto, queremos entender as características importantes na perspectiva do fundo investido, em outras palavras, se variáveis como risco e retorno são suficientes para explicar a alocação de investidores profissionais em fundos multimercados.
Após algumas exclusões com base em critérios quantitativos, tais como: tamanho do fundo, taxa de administração, número de cotistas e data de início, chegamos a uma amostra de 227 fundos multimercados elegíveis de onde foram extraídas informações majoritariamente quantitativas sobre cada fundo. Dados disponíveis na CVM foram aplicados em um modelo econométrico de mínimos quadrados ordinários (MQO) para testar, na prática, se as variáveis quantitativas foram importantes na ótica dos gestores de fundos de fundos nos últimos anos.
Os resultados mostram que fundos com bom desempenho em 24 meses, geridos por empresas independentes, com captação positiva em 12 meses e patrimônio elevado, podem ter melhores chances de receber recursos de alocadores ou gestores de fundos de fundos.
Entretanto, os resultados sugerem a existência de variáveis omitidas, ou seja, o modelo indica que outras informações importantes para explicar a alocação de gestores de fundos de fundos em multimercados ficaram de fora do modelo. Além disso, por incrível que pareça, nenhuma variável ligada a risco obteve resultado estatisticamente significativo como variável dependente.
Mesmo com diversos artigos acadêmicos defendendo um processo de seleção de gestores baseado majoritariamente na análise quantitativa, é comum encontrar vertentes a favor de uma abordagem mista que leva em conta, além da análise quantitativa, as características qualitativas dos gestores.
Características qualitativas são, de certa forma, mais abrangentes e indiretas. Fatores como: risco de fraude na empresa, controles internos, experiência e formação do time de investimentos, histórico dos principais gestores, nível de rotatividade dos funcionários, potencial conflito de interesses, remuneração e alinhamento de interesses do time de gestão, entre outros, podem ser avaliados e ranqueados e, na maioria das vezes, contribuem e influenciam a decisão de alocação em gestores de fundos multimercados.
Na prática, como sugere o modelo descrito acima, boa parte da decisão de investimentos recai sobre a parcela qualitativa do processo de seleção, ou seja, não é apenas uma questão de risco e retorno, mas sim uma combinação de competências, processos, alinhamento de interesses e, muitas vezes, de confiança na equipe de gestão.
Informações desse tipo não estão disponíveis ao público em geral, são extraídas através de um minucioso método de due diligence e avaliação realizado por pessoas qualificadas e experientes no processo de seleção de gestores.
Obviamente, a boa performance do gestor é normalmente preponderante na decisão, mas nada indica que, por si só, seja suficiente para que o gestor receba recursos deste seleto grupo de investidores.
Fonte: Valor