Mulheres perderam menos empregos com a crise
BRASÍLIA – Até o momento, a crise econômica mundial causou mais desemprego para a população masculina que para a feminina, no Brasil, de acordo com a pesquisadora da Diretoria de Estudos Sociais do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea) Natália de Oliveira Fontoura. No entanto, isso não tem significado vantagens para as mulheres.
A redução de vagas na indústria de transformação e na construção civil, que tradicionalmente empregam mais homens, e a menor remuneração das mulheres são possíveis razões para esse cenário, segundo apontou Natália Fontoura em audiência pública da comissão especial que analisa os impactos da crise nas áreas de serviço e emprego realizada nesta quarta-feira (3).
Dos 585.912 postos de trabalho perdidos de outubro do ano passado a abril deste ano no País, somente 5.273 (0,9%) eram ocupados por mulheres. Segundo a especialista, em alguns setores ocorreu, inclusive, substituição de homens por mulheres. É o caso da construção civil, que demitiu 63.082 empregados, enquanto empregou 3.745 trabalhadoras.
A representante do ministério do Trabalho e Emprego Fátima Rosa Naves de Oliveira Santos acrescentou que, em regra, as mulheres empregadas no setor especializam-se em acabamento, o que lhes proporciona rendimento superior ao dos homens.
Trata-se de uma exceção no mundo do trabalho. De acordo com pesquisa do Ipea, embora as desigualdades de remuneração tenham diminuído continuamente na última década, mulheres ainda recebiam, em 2007, 65,6% da remuneração paga ao sexo masculino. Se forem comparadas trabalhadores negras com homens brancos, o rendimento delas corresponde a apenas 34% do que eles recebem.
Impacto na indústria
Na opinião de Natália Fontoura, embora ainda não haja evidências empíricas, essa menor remuneração das mulheres pode ser um dos fatores que explicam a substituição de homens por mulheres no mercado de trabalho. Outro elemento que explica o fenômeno, segundo ela, é o fato de a crise ter afetado mais profundamente a indústria de transformação e a construção civil. Dos postos de trabalho eliminados com a crise, bem mais da metade – 492.477 – eram industriais.
O setor de serviços, que, ao contrário, sempre empregou mais mulheres, ainda não teve impactos fortes da desaceleração da economia. No período analisado, o setor criou 126.839 vagas. Essa troca de emprego industrial por outros no de serviço também é um problema, pois os empregos no terceiro setor são normalmente de menor qualidade. “Se hoje a remuneração feminina já é menor, com essa mudança as diferenças podem tornar-se ainda maiores”, afirmou Natália.
Sem vantagens
A pesquisadora destaca que a troca de homens por mulheres no mercado de trabalho não significa vantagens para elas. “Ao contrário. Em crises anteriores as mulheres foram as mais afetadas, e nada impede que isso volte a ocorrer. Como mais mulheres tendem a buscar emprego nesse momento, pode haver desemprego ainda maior entre elas e a remuneração pode cair ainda mais”, destacou. Hoje, a taxa de desemprego feminino é da ordem de 54%, contra 26% do masculino.
Outras consequências possíveis da crise, segundo Natália Fontoura, são a intensificação do trabalho informal e o aumento da pobreza, que é maior em famílias chefiadas por mulheres. Com isso, conforme disse, “pode haver regressão no cenário de aproximação entre os gêneros observados na última década”.
Proteção
Autora do requerimento para realização da audiência, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) defende que, neste momento, o Brasil tem de adotar “políticas afirmativas” para mulheres chefes de família. “Nesse primeiro momento são os homens que sofrem mais. Mas, segundo a Organização Internacional do Trabalho, as mulheres são as que mais vão sentir”, afirmou. Segundo ela, o País poderia adotar medidas de proteção do emprego para a mulher trabalhadora ou estender o período de recebimento do seguro-desemprego para essa população, por exemplo.
A deputada também sugeriu que os movimentos organizados pressionem o Congresso pela aprovação da lei que garante aposentadoria para empregadas domésticas (PL 1626/89) e defendeu a criação de uma contribuição especial para mulheres que trabalham apenas em casa. “Muitas vezes, quando o casamento acaba, essas mulheres ficam sem nenhuma proteção”, sustentou.
A deputada Aline Corrêa (PP-SP) lembrou que mulheres e crianças representam 70% da pobreza no mundo e concordou com a necessidade da adoção de políticas para proteger esse grupos. “Precisamos de políticas de proteção para criar uma sociedade melhor. O Estado deve investir mais nessas mães para que elas possam dar mais à sociedade”, disse.
Relator da comissão, o deputado Vicentinho (PT-SP) afirmou que pretende levar seu texto a votação até o dia 10. E, segundo o parlamentar, “o trabalho não seria completo sem a participação das mulheres”.
Fonte: DCI OnLine