Lula sanciona Lei do Inquilinato, mas veta pontos polêmicos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei do Inquilinato, mas vetou quatro pontos relativos a imóveis comerciais. A lei não será aplicada imediatamente: terá prazo de 45 dias para entrar em vigor. A razão da extensão do prazo é dar tempo hábil para que as pessoas afetadas pelas normas conheçam o conteúdo do texto e estudem seus efeitos.
O texto foi publicado nesta quinta-feira no Diário Oficial da União. Entre os vetos, foi derrubada a regra que diz que o locatário terá de desocupar o imóvel comercial em 15 dias – contados da intimação – quando houver uma proposta financeira melhor de um terceiro, interessado naquele determinado imóvel. O assessor jurídico da Fecomércio-SP, Raphael Noschese, explicou que esse prazo mudou para 30 dias, no texto aprovado por Lula.
No projeto de lei enviado ao presidente, uma das formas de o locatário atual manter seu imóvel comercial seria oferecendo as mesmas condições do terceiro. A execução provisória da retomada ficaria condicionada à prestação de caução em valor não inferior a seis meses nem superior a 12 meses do aluguel.
Também foi vetado que o proprietário de imóvel comercial precise concordar com a manutenção da empresa na loja em caso de mudança de sócios. Foi mantido o pagamento de indenização em caso de solicitação do imóvel comercial antes do fim do contrato por proposta melhor de terceiros. Foi vetado o item que impedia responsabilidade solidária entre proprietário e proponente da melhor oferta na indenização do atual locatário comercial.
Uma das novidades na Lei do Inquilinato, que não foi objeto de veto, é o prazo de 30 dias para desocupação, em caso de não-renovação do contrato. Anteriormente, esse prazo era de seis meses.
Ainda segundo a nova lei, em caso de “ausência, interdição, recuperação judicial, falência ou insolvência do fiador, declaradas judicialmente”, fica definida a prorrogação da locação por prazo indeterminado, uma vez notificado o locador pelo fiador de sua intenção de desoneração, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante 120 dias após a notificação ao locador.
Além disso, o locador poderá notificar o locatário para apresentar nova garantia locatícia no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de encerramento da locação.
A nova lei tem causado preocupação aos locatários, especialmente os de imóveis comerciais. A Fecomercio-SP foi taxativa e explicou que as mudanças prejudicam inquilinos.
– A lei reduz prazos para desocupação – explicou o assessor jurídico da entidade, Raphael Noschese.
Uma das novas regras diz respeito à caução a ser depositada pelo locador. Para executar o despejo e tomar posse do imóvel, segundo Noschese, o locador tinha de depositar um montante equivalente a 12 a 18 meses do valor do aluguel. Com a nova lei, o depósito deve equivaler a um valor correspondente a seis a 12 meses de aluguel.
Segundo Norchese, o prazo para desocupação do imóvel comercial quando há uma proposta melhor ao proprietário, apesar de subir de 15 para 30 dias, continua apertado:
– A lei atualmente em vigor prevê 180 dias para o despejo, após o trânsito em julgado da sentença, ou seja, após a decisão do tribunal. Nesse meio tempo, o locatário tinha tempo para se preparar e procurar outro imóvel. A mudança pode até causar desemprego, já que as empresas prejudicadas, muitas delas de pequeno porte, possuem inúmeros funcionários. As pequenas empresas são as principais empregadoras do país.
Esse ponto também chamou a atenção de Mario Cerveira Filho, sócio do escritório Cerveira, Dornellas e Advogados Associados:
– A lei vai fazer com que as ações de despejo fiquem muito mais rápidas do que eram, tanto no caso do imóvel comercial quanto no caso do residencial. Embora eu admita que a lei em vigor hoje vem beneficiando maus pagadores.
Outro ponto perverso da lei, segundo ele, diz respeito ao atraso no pagamento:
– Na lei antiga, o locatário podia atrasar o aluguel duas vezes, no máximo, em um período de 12 meses. Na terceira vez, o locador tinha direito de não aceitá-lo mais como inquilino. Na lei nova, o locatário somente pode atrasar o pagamento uma única vez em um período de dois anos. Mas e se ele esquecer de pagar, ou ficar doente, ou viajar?
Na contramão das opiniões, o presidente da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (Abadi), Pedro Carsalade, afirma que a lei, na realidade, favorece o inquilino:
– A Lei do Inquilitano não mudava há 18 anos. Nós temos uma série de imóveis fora do mercado exatamente porque o trâmite no Judiciário era demorado. Levava-se 14, 15 meses para despejar um inquilino que não estava pagando o aluguel. Além de não receber o aluguel pelo imóvel, o locador tinha de esperar mais de um ano.
Segundo ele, as pessoas ligam proprietários de imóveis a grandes investidores, o que não é verdade.
– Há pessoas que juntaram dinheiro ao longo de suas vidas e conseguiram comprar um imóvel para alugar, como complemento de renda. Só que muitas delas não estavam alugando justamente por conta da inadimplência – afirmou Carsalade.
Como o mercado de imóveis também é guiado pela lei da oferta e da demanda, a aposta de Carsalade é de queda nos preços dos imóveis para locação.
Quanto à polêmica questão da oferta de um terceiro, que pode levar o locatário a sair perdendo, ele diz que uma das críticas dizia respeito à simulação dessa oferta, o que não passaria de uma especulação, já que é fácil descobrir esse tipo de manipulação e as penalidades são altas. Para ele, a lei apenas trouxe equilíbrio entre as partes envolvidas.
Fonte: O Globo