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Juros, Trump e Marco Aurélio

O futuro da economia brasileira estava mais incerto na manhã de terça-feira, quando circulou a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), realizada na semana passada. Ao decidir o novo corte de juros, limitado a 0,25 ponto porcentual, os membros do comitê levaram em conta a insegurança quanto à nova orientação da Casa Branca. O nome do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, em nenhum momento aparece na ata, mas suas promessas de mudança foram discutidas. O primeiro abalo no cenário, no entanto, veio de forma imprevista e por obra de uma autoridade brasileira, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ao acolher, em liminar, a pretensão de um pequeno partido, a Rede de Sustentabilidade, o ministro pôs em jogo a pauta do Senado e, mais que isso, a implementação do programa de ajuste das contas públicas e de reformas do governo do presidente Michel Temer. A primeira dúvida foi sobre a votação, antes prevista para a próxima terça-feira, da Proposta de Emenda à Constituição n.° 55, também conhecida como PEC do Teto.

Esse projeto é fundamental para a execução de um programa de controle da despesa federal, passo indispensável para a recuperação e a disciplina das finanças públicas. Falta sa-

ber se foi apenas um susto ou se as consequências serão de fato graves. Mas a lição é indiscutível. A insegurança mais importante é realmente quanto ao avanço dos ajustes e reformas – problema citado na ata -e os principais fatores de incerteza são mesmo internos e associados a um quadro político sujeito a muita conturbação.

A decisão unânime dos membros do Copom, formado por diretores do Banco Central (BC), foi uma continuação da política de cortes iniciada em outubro. Mas foi uma ação cautelosa, orientada pela avaliação de um conjunto significativo de riscos. A inflação tem caído e as expectativas para os próximos dois anos são de aumentos de preços bem mais moderados. Mas a desinflação, embora prossiga, perdeu impulso recentemente e, além disso, ainda há sinais de alerta em alguns segmentos do mercado. No exterior, os fatores mais preocupantes são o próximo aumento dos juros americanos, esperado para breve, e as incertezas ligadas à sucessão presidencial nos Estados Unidos. O quadro se completa com a evolução, até agora positiva, mas ainda insegura, da pauta de reformas.

Um passo importante foi o encaminhamento ao Congresso do projeto de mudanças na Previdência, mas o sucesso dessa proposta dependerá do apoio à política oficial nas duas Casas do Congresso. Esse fator já era incerto antes da liminar concedida pelo ministro

Marco Aurélio Mello. Na hipótese mais otimista, esse episódio permanecerá pelo menos como um sinal de alerta permanente, um elemento agravante da insegurança do governo.

Ficou muito clara, com a ata, a disposição dos membros do Copom de avançar no corte da taxa básica de juros no próximo ano. Pelo menos essa decisão, a julgar pelo texto, parece bem assentada – ou parecia, até a publicação do documento. Só havia dúvida quanto à velocidade de afrouxamento da política monetária.

“O Comitê”, registra a ata, “entende que o ritmo de flexibilização monetária será calibrado levando em conta as suas projeções de inflação e seus fatores determinantes, de modo a perseguir uma trajetória que permita cumprir a meta para a inflação para 2017 e 2018.” Segundo o texto, “pode haver mais espaço para a flexibilização” que o percebido anteriormente. Apesar da decisão ainda cautelosa, o relatório é marcado por um otimismo bem menos sensível nas atas anteriores.

Houve quem apostasse, no mercado, na manutenção de rumo pelo Copom, mesmo depois da intervenção do ministro Marco Aurélio Mello. É uma avaliação arriscada. Com qualquer desdobramento, o quadro só deverá ficar mais claro dentro de alguns dias. Pelo menos até lá o fator Marco Aurélio tornará o cenário muito mais incerto do que parecia até o começo da semana.

Fonte: O Estado de São Paulo

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