Hipoteca reversa, uma engenharia financeira que aposta entre viver e morrer
Depois de anos na pauta do mercado segurador, a equipe do super ministro Paulo Guedes chamou executivos do setor para entender melhor o produto hipoteca reversa. De forma simples, é um aluguel pago em forma de renda vitalícia a um idoso que tem uma casa por uma seguradora ou outra instituição financeira. Se o cliente morrer rápido, a seguradora ganha, pois passa a ser dona da casa e a vende para realizar o capital. Se o cliente viver mais anos do que o estimado no cálculo atuarial do contrato, prejuízo para a companhia de seguros, que pagará valores mensais por mais tempo do que o capital previsto.
Acredita-se que este é um mercado que atrairá mais o interesse de seguradoras do que de bancos, uma vez que as características do produto são mais de riscos probabilísticos, como sobrevivência da pessoa e desvalorização do imóvel, e não financeiros, afirma um experiente segurador neste tema, que pediu anonimato.
Um exemplo financeiro. O cálculo para a renda vitalícia prometida para o cliente tem como base a idade, a expectativa de vida, a inflação e a desvalorização que o imóvel durante o período do contrato. Um cálculo simplista de hipoteca reversa para uma pessoa com 75 anos, com expectativa de vida de 15 anos, com imóvel avaliado hoje em R$ 2 milhões e depreciação de 50%, em bairro nobre de São Paulo, considerando-se inflação de 0,25% ao mês, resultaria numa renda vitalícia de R$ 6,9 mil.
“Trata-se de um produto de nicho. Não é para todos”, afirma o especialista. Segundo ele, nenhuma seguradora vai negociar imóveis em regiões que tendem a sofrer uma potencial desvalorização por falta de mobilidade ou infraestrutura questionável, por exemplo. O produto é desenhado para aqueles que tiveram uma vida laboral plena, mas as reservas foram consumidas por “n” motivos. E chegaram aos 75 anos vivendo do teto do INSS (cerca de R$ 5 mil) e mais uma aposentadoria privada que somadas resultam num valor insuficiente para pagar condomínio, impostos, saúde, remédios, empregados.
Ai que entra o produto, já consolidado em países como Reino Unido, Canadá e Espanha, mas que no Brasil o governo estuda regulamentar. Seguradores enfatizam que esse produto serve somente para complementar uma renda e para ele existir é preciso que a regulamentação deixe clara a segurança jurídica. Um dos pontos citados é que o contrato assinado tem de ser respeitado, com risco de judicialização zero, afirma. O temor é que haja o risco de familiares entrarem com ações alegando ser o único imóvel da família e que o idoso tomou uma decisão sem ter sido bem informado. Os impostos e a manutenção do imóvel também devem estar em dia quando a seguradora for quitar o contrato diante do aviso de morte do cliente.
Outro ponto em discussão é o funding de longo prazo para o produto. Enquanto não existir um mercado de portabilidade, o lastro da operação pode sair de uma seguradora de vida e previdência, que tem reserva de longo prazo e que pode aportar um percentual das reservas no negócio, desde que se mude a regulamentação. Atualmente, as seguradoras são proibidas de aplicar em imóveis.
A diferença entre condições da engenharia financeira estará no ponto de vista das seguradoras sobre o futuro do mercado imobiliário. Tem as companhias tradicionais, que apostam em imóveis acima de R$ 2 milhões, com mais de quatro suítes. Outras mais despojadas já apostam na valorização de imóveis menores, porém funcionais, uma vez que o número de filhos é bem menor, localizadas em bairros emergentes com infraestrutura moderna e construções feita com o uso de materiais evoluídos que requerem menos custos com manutenção. Esse ponto traz uma diferença significativa no valor da renda vitalícia a ser paga e deverá ser bem avaliado pelo comprador do produto, alertam especialistas.
Ainda não há um prazo para o governo regulamentar o produto. Mas sinaliza a intenção de inovação do mercado segurador. O senador Paulo Bauer (PSDB-SC) apresentou, em 2018, proposta de criação do instrumento para maiores de 60 anos. O texto aguarda designação de um relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
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