Fiat cresce e chega a liderança adotando o “jeito mineiro”
Sem expansão industrial, a Fiat produz hoje três vezes mais automóveis do que há uma década. Os planos são de aumentar ainda mais o ritmo de produção, que está em 2,2 mil carros por dia. O presidente da empresa, Cledorvino Belini, já faz planos de superar a capacidade da fábrica, de 2,5 mil/dia. Ele quer chegar a 2,7 mil unidades diárias, o que significa ter quase todos os setores funcionando em três turnos ao invés dos dois de hoje. Ele conta que já comunicou aos fornecedores para se prepararem porque as encomendas vão aumentar.
Ao contrário das outras três veteranas – Volkswagen, Ford e General Motors -, que construíram novas fábricas de automóveis no Brasil para aproveitar incentivos fiscais de um programa do governo federal exclusivo para montadoras em meados da década de 90, a Fiat optou por ter apenas uma linha de montagem de automóveis no país.
No chamado regime automotivo, Volkswagen, GM e Ford construíram uma nova fábrica de carros cada uma. Hoje, Volkswagen e GM têm três unidades cada uma e a Ford, duas. A GM tem problemas de ociosidade na fábrica de São José dos Campos (SP), a Ford tenta resolver problema semelhante com um novo projeto de carro em São Bernardo do Campo (SP) e a montadora alemã enfrenta problema crítico de excesso de pessoal em São Bernardo do Campo.
Nos cinco últimos anos, a Fiat só perdeu a liderança do mercado interno de veículos leves, para a GM, em 2004. A montadora italiana não exporta tanto quanto as suas concorrentes. Mas capacidade ociosa é um problema que não a incomoda. E se faltar capacidade, Belini lembra que ainda tem a fábrica da Argentina, que deixou de produzir automóveis há seis anos.
Não ter embarcado na onda dos incentivos fiscais para fazer mais automóveis, foi, em parte, resultado da avaliação de que a economia brasileira sempre foi marcada por ciclos, conta Belini. Por outro lado, o programa de incentivos fiscais seduziu o grupo Fiat, a investir, em parceria com a Iveco, do mesmo grupo, numa fábrica de furgões em Três lagoas (MG). Essa unidade opera hoje com metade da capacidade.
As projeções dos consultores e de outros fabricantes indicavam que o mercado brasileiro saltaria dos 1,9 milhão de veículos em 1997 para 3 milhões, em 2004. As vendas este ano devem encostar em 1,8 milhão de unidades.
Última das quatro grandes a se instalar no Brasil, há três décadas, a Fiat foi a primeira a construir uma fábrica fora de São Paulo, em Betim (MG). Mas a distância dos fornecedores provocava desvantagem de custos. Belini, então diretor de compras, foi à luta em 1987 para atrair os fornecedores para perto da linha de produção mineira.
A montadora italiana conseguiu, sem fazer muito barulho, reduzir drasticamente o número de empregados
Diante da resistência de todos, Belini decidiu ir ao Japão, falar diretamente com a matriz de um dos fabricantes de peças, a Sumitomo, que acreditou no plano de expansão da montadora. Aos poucos os demais fornecedores aderiram ao que se apelidou de “mineirização”.
Isso ajudou a empresa a adotar os sistemas de entrega imediata conhecidos como “just-in-time” e “kanban” em Betim. O processo permitiu a abrir espaços dentro da unidade. Assim, a fábrica projetada para produzir 500 carros por dia, passou para uma média diária de 800.
Tempos depois, houve um grande movimento de terceirização. Processos como de fabricação da suspensão e logística foram entregues a outras empresas. Com isso, a montadora conseguiu, sem fazer muito barulho, reduzir drasticamente o número de empregados.
A Fiat Automóveis chegou a ter 25 mil empregados. Hoje são 15 mil. A empresa também já passou por tempos melhores que o atual. Seu pico de produção chegou a 650 mil automóveis por ano em 1997 (agora a média está em 500 mil) graças às exportações. O volume vendido ao exterior, incluindo a matriz na Itália, chegou a 250 mil unidades por ano. Em 2006 serão 100 mil. Mas Belini diz que é melhor exportar menos do que ter prejuízo com a valorização do real.
A montadora também apostou nos carros pequenos, que dominam o mercado brasileiro. As linhas de Palio e Uno com motor 1.0 representam 55% das suas vendas no Brasil. A empresa tenta investir agora em segmentos de consumidores de melhor poder aquisitivo. Belini acredita que o mercado tende a se expandir mais por conta, principalmente, do crescimento do Produto Interno Bruto. “A volatilidade da economia diminuiu e há indicações de que o Brasil tem condições de seguir um crescimento sustentado”, afirma.
Com 33 anos dentro do grupo Fiat – no qual também trabalhou em empresas de autopeças, como Magneti Marelli – Belini representa outro diferencial na indústria automobilística. É hoje o único brasileiro no comando de uma montadora no país e seu quadro de executivos é também quase todo formado por brasileiros.
Maior operação fora da Itália, a receita da filial brasileira da Fiat, de R$ 13 bilhões no ano passado, representa 15% do que a companhia fatura em todo o mundo. A expectativa de Belini é que a operação feche com lucro novamente este ano, a exemplo do que ocorreu em 2005.
Fonte: Valor