Economizar energia vira desafio em TI
A 35 minutos de carro ao sul da capital islandesa Reykjavic repousa a pequena vila de pescadores de Grindavik. Em certo dia de janeiro, Kristinn Haflioason dirige por alguns minutos até sair da cidade e chegar a uma grande extensão de rocha vulcânica, coberta de neve, que avança sobre o Oceano Atlântico. Ao subir ao local, ele inicia um extraordinário discurso de vendedor que espera ser suficiente para persuadir companhias dos Estados Unidos e do resto da Europa a trazerem suas operações para o lugar. “Dezenas de empresas mostraram interesse”, diz.
Não é piada. Haflioason trabalha na agência governamental “Invista na Islândia”. Ele escolheu o ponto desolado nas redondezas de Grindavik como um local para os centros de dados, as grandes instalações repletas de computadores que as empresas de tecnologia erigem para lidar com os cada vez maiores oceanos de informação digital.
O fato de Google, Yahoo e Microsoft terem checado este remoto canto do mundo serve para dar uma idéia dos desafios enfrentados pelas empresas para operar centros de dados, embora nenhuma tenha se comprometido a nada até agora. O motivo: a Islândia tem a rara combinação de terra desocupada, energia geotérmica barata e de um clima de arrepiar, que tornaria o resfriamento de um centro de dados quase gratuito.
A indústria de tecnologia depara-se com uma crise de energia. O custo com o consumo de eletricidade dos centros de dados dobrou entre 2000 e 2006 nos Estados Unidos, para US$ 4,5 bilhões, e pode dobrar de novo até 2011, segundo estimativas do governo americano. Com os preços da energia nas alturas, o desafio de alimentar e esfriar esses “utilitários-esportivos” do mundo tecnológico tornou-se um dos principais problemas a ser resolvido por empresas e concessionárias públicas. “A economia digital é extensa”, diz Andy Karsner, secretário-assistente do Departamento de Energia dos EUA para questões de eficiência energética. “A demanda para computação crescerá exponencialmente, mas o consumo elétrico não pode crescer da mesma forma.”
A corrida por soluções criativas já começou. Empresas esquadrinham o globo em busca de novas tecnologias e locais privilegiados. A Islândia poderia ter o clima ideal; a Arábia Saudita, os menores custos de energia. Cada empresa do setor procura espremer as despesas, na esperança de tornar-se uma produtora de baixo custo na era digital.
De onde virão as inovações? Todas as concessionárias de serviços públicos, empresas de construção e grupos de tecnologia trabalham na questão. Bruno Michel, pesquisador da IBM em Zurique (Suíça), desenvolve formas para que a biologia do corpo humano possa ser imitada em sistemas de resfriamento de computadores. Mark Bramfitt, gerente de programa da concessionária americana Pacific Gas & Electric (PG&E) experimenta oferecer incentivos para restringir o uso geral de energia. Apenas alguns poucos watts por computador já ajudariam. Um centro de dados eficiente usa cerca de 25% menos eletricidade que um normal. Em uma instalação padrão de médio porte isso representa US$ 4,5 milhões em economia anual.
O centro de dados moderno é como um amplo refrigerador com centenas ou milhares de fogões acesos no interior. Estantes de metal com quase dois metros de altura recheados de computadores do tamanho de caixas de pizza, aparelhos de armazenamento e roteadores de redes alinham-se em fileiras. Ar refrigerado flui sobre os equipamentos a partir de aberturas nos pisos dos “corredores refrigerados”. O ar quente sai pela parte posterior das máquinas e flui para os corredores “quentes”, sendo sugado e expelido para fora das instalações. Dentro dos centros, ouve-se o rugido maçante de grandes volumes de ar passando pelos dutos, aberturas e computadores.
A competição entre as empresas de tecnologia para reduzir os custos de processamento de dados é tão intensa que algumas tratam como segredo de Estado a maneira como usam a energia. Quando o Google construiu um centro de dados ao longo do rio Columbia, no Oregon, há cinco anos, comprou o terreno por meio de um terceiro, de forma que seu envolvimento ficasse sigiloso. O prefeito teve de assinar um acordo de confidencialidade. Na Carolina do Norte, as leis de transparência do Estado obrigaram o governo a divulgar o pacote de incentivos oferecido ao Google para instalar um centro de dados, mas os planos de consumo de energia da empresa foram redigidos como segredos comerciais. Não é de se estranhar. Talvez, no futuro, a competição entre Google e Microsoft no mercado de buscas na internet possa ser decidida tanto pela eficiência energética dos centros de dados, quanto pela empresa que conseguir desenvolver o melhor algoritmo de busca.
Pense nos centros de dados como a “fábrica” da economia da informação. A cada dia, em milhares de instalações que passam despercebidas, em áreas remotas ou nos porões de torres de edifícios, trilhões de blocos de informação, codificados em “uns” e “zeros” são deslocados, armazenados e agrupados em novos formatos. Esses blocos incluem milhões de e-mails, páginas de sites como Facebook, recados em blogs e vídeos como os do YouTube; imensas quantidades de transações eletrônicas; e mais um universo em expansão de dados que precisam ser armazenados, cortados, fatiados e analisados. A consultoria IDC, especializada no setor de tecnologia, estima que, a cada ano, o mundo digital crie cerca de 3 milhões de vezes a informação contida em todos os livros já escritos.
As pessoas normalmente não pensam na informação como algo que possui substância, mas a essência da computação é física. Quando bits de dados na forma de diminutas cargas elétricas movem-se por fios e circuitos integrados feitos de semicondutores, com milhões de transistores ligando-se e desligando-se, encontram resistência. Superar essa resistência exige energia e cria calor. (Quando se movimentam muito rapidamente os chips não pegam fogo, mas racham como o bloco do motor de um carro superaquecido.) Movimente muitos bits e você terá uma conta imensa para alimentar e resfriar o equipamento: os US$ 4,5 bilhões gastos nos EUA em 2006 equivalem às contas de eletricidade de 5,8 milhões de residências no país.
Fonte: Valor