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Desastres climáticos causam perdas de R$ 28 bilhões no Sul

Desde 1890, a família de Lourenço Caneppele atua na agricultura em uma propriedade nas margens do Rio Taquari, no município de Roca Sales (RS), a cerca de 140 quilômetros de Porto Alegre. Em 133 anos, esses pequenos produtores testemunharam diversas enchentes, mas, segundo relatam, nenhuma delas foi tão drástica quanto a cheia causada pelo ciclone que atingiu o Rio Grande do Sul entre os dias 4 e 5 de setembro deste ano.

Na ocasião, pela primeira vez, o rio transbordou a ponto de alcançar as casas onde moravam Lourenço, sua esposa, dois filhos e seus pais, assim como os galpões para máquinas e animais. “Tivemos que nos refugiar no sótão da casa, porque a água chegou no segundo piso”, lembra.

Perdas como as da família Caneppele multiplicaram-se no Sul do país neste ano. Segundo levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), que o Valor obteve com exclusividade, os desastres climáticos causaram prejuízos de R$ 28,2 bilhões ao agronegócio da região em 2023.

Entraram na conta da entidade as perdas com a seca no início do ano e com as chuvas dos últimos meses. No Rio Grande do Sul, os prejuízos já chegam a R$ 18,1 bilhões.

O Estado, o mais castigado pelos extremos climáticos, sofreu no início de setembro com a passagem de um ciclone, que causou cheias especialmente no Vale do Rio Taquari e levou à morte de mais de 50 pessoas. Só com as enchentes que ocorreram desde setembro, os prejuízos no Sul chegaram a R$ 8 bilhões.

O montante corresponde a 40% de todas as perdas que o agro da região sofreu com excesso de chuvas nos últimos dez anos. Segundo a CNM, entre 2013 e 2023, os prejuízos causados por enchentes nos três Estados do Sul chegaram a R$ 19,5 bilhões. Lourenço Caneppele estima que teve perdas de R$ 1,3 milhão na cheia mais recente. “Os galpões de máquinas e o de suínos foram destruídos. Perdemos quatro bois, 25 porcos, sementes, defensivos, fertilizantes, óleo para máquinas, além de 35 hectares de trigo e 25 de milho”, relata.

O produtor conta que teve que gastar mais de R$ 100 mil só para recuperar as máquinas agrícolas afetadas pela água e pela lama do rio. Tentando refazer a vida, Lourenço decidiu construir uma casa nova para a família em um terreno mais alto, em um pedaço de terra que comprou no ano passado, próximo à sua propriedade. Na primavera, o produtor plantou soja e milho, esperando recuperar parte dos prejuízos.

No entanto, em 18 de novembro, o Rio Taquari novamente teve outra enchente. As águas, embora não tenham chegado ao nível de setembro, cobriram as lavouras novamente. Dessa vez, 25 hectares de soja e 10 hectares de milho foram perdidos com a cheia do rio. O restante dos cultivos está prejudicado pelo excesso de umidade causado pelas chuvas. “Perdi pelo menos mais R$ 200 mil com essa última cheia”, lamenta.

Como os dados da CNM são referentes apenas até o início de novembro, o valor dos prejuízos com as chuvas já deve ser ainda maior. Além disso, o levantamento leva em conta apenas os dados informados pelos municípios que decretaram situação de emergência devido aos desastres climáticos.

Portanto, não inclui outras perdas econômicas, como redução da colheita e da qualidade das lavouras de trigo, devido aos problemas causados por excesso de umidade. O governo do Paraná estima que as perdas financeiras na agropecuária do Estado, provocadas pelas chuvas torrenciais, temperaturas altas e fortes ventos causadas pelo El Niño, chegam a um valor preliminar de R$ 2,5 bilhões.

Já Santa Catarina calcula que os eventos climáticos de outubro e novembro provocaram prejuízos de aproximadamente R$ 3 bilhões nas propriedades rurais catarinenses.

No Rio Grande do Sul, embora não faça um cálculo financeiro, a Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/RS) estima que, em seis meses, 160 mil propriedades rurais tenham sofrido alguma perda com as enchentes, chuvas fortes e granizo. “Desde o dia 15 de junho, quando foi registrado o primeiro ciclone no RS, já ocorreram nove eventos climáticos extremos no Estado. Esses fenômenos estão mais recorrentes, e vamos ter que nos adaptar para lidar com essas situações”, afirma Marcelo Antonio Brandoli, gerente técnico da Emater/RS.

Segundo Brandoli, será preciso que os poderes públicos e produtores invistam em prevenção de riscos em casos de chuvas extremas. “Será preciso investir mais para melhorar a infiltração dos solos, especialmente cuidados com a descompactação da terra, para reduzir a quantidade e velocidade da água que escorre para os rios”, explica.

O gerente técnico também destaca a necessidade das propriedades realizarem terraceamento e curvas de nível em seus terrenos, para conduzir a água. Para Caneppele, o poder público precisa auxiliar os produtores com investimentos e ações de prevenção a danos e auxílio após fenômenos climáticos. Caso contrário, a existência de diversas comunidades rurais será impraticável. “Não sei o que vai ser do Vale do Taquari. Na minha localidade havia dez famílias morando. Mas as chuvas destruíram as casas. Agora, todos estão vivendo com parentes ou de aluguel na cidade”, diz.    

Fonte: NULL

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