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De olho no mercado

O retrospecto da semana foi positivo, com o índice se mantendo acima dos 40.000 pontos e quebrando os 41.000. A marca dos 43.753 é a resistência a ser superada para configurar-se uma tendência de alta mais consistente no curto prazo. Antes dela, o índice tem que vencer os 42.360. É bem possível que haja um movimento lateral antes de qualquer subida mais determinada. O patamar entre os 41.000 e 40.000 deve voltar a ser testado, abaixo do que, uma correção mais aguda poderia se alongar até as faixas dos 39.000, 38.000 e depois 36.000, respectivamente. A bolha dos Títulos do Tesouro dos EUA Sobrevalorização extrema é a expressão escolhida pelo historiador e analista econômico Edward Chancellor para definir uma bolha financeira. Uma das principais características destas subidas excessivas de preços é a de sempre haver algum fato justificador, espalhando um clima de euforia em relação a determinado ativo. O agente catalisador de hoje é a deflação. Traços de uma recessão global e o colapso de instituições financeiras estão associados a narrativas sombrias sobre a depressão dos anos 30 e a estagnação do Japão nos anos 90. Segundo Chancellor, o recente impulso extraordinário no mercado de títulos dos EUA possui todas as características de uma bolha clássica. A princípio, ela estaria sendo motivada mais por medo do que por ganância. Investidores procuram proteção contra a deflação e um mercado de ações declinante, adquirindo cegamente os supostos papéis livres de risco do governo americano. Na visão do historiador, os treasuries de dez anos, por exemplo, pagando os juros reais mais baixos em meio século, se enquadram perfeitamente nos parâmetros de uma bolha. Com rendimentos anuais de pouco mais de 2%, eles não oferecem nenhuma proteção contra a possível volta da inflação durante a próxima década. Efeito especulativo Em 2008, o mercado de títulos dos EUA experimentou o seu melhor rali anual em mais de 25 anos. O retorno dos T-bonds de 30 anos (para quem comprou os títulos no começo e os vendeu ao final do ano) chegou a 45%, o seu melhor desempenho desde 1982. No geral, os títulos americanos proporcionaram um ganho médio de 14%, superando o índice de ações S&P500 por uma margem de 53 pontos percentuais, a maior margem desde que a Merrill Lynch iniciou os cálculos da rentabilidade de instrumentos de renda fixa, em 1978. Obviamente, num momento onde qualquer outro tipo de investimento está dando baixo retorno ou retorno negativo, além de embutirem, teoricamente, riscos maiores, há uma corrida para os treasuries. Outro fator que detona o efeito manada é a expectativa da obtenção de lucro especulativo rápido, mediante a compra e venda durante o rali. Títulos em alta, juros em baixa Vale lembrar que o rendimento proporcionado por um título do governo cai à medida que o preço pelo qual o título está sendo negociado se eleva. Isto acontece porque os juros continuarão a serem pagos sobre o valor de face (100), independente do novo valor que o ativo adquira no mercado. Os juros do cupom (fixos) são estabelecidos para o valor de face 100. Se o valor do ativo vai a 131 no mercado, a remuneração efetiva sobre o investimento irá encolher em proporção. No caso desta taxa pré-fixada original ser, por exemplo, 4,75% ao ano, quando calculada em relação ao preço atual de venda do título (de 131), ela corresponderá a um rendimento de apenas 3,63% ao ano (4,75 / 131). A difícil missão de não errar a dose A compra dos treasuries de longo prazo é, a esta altura, uma aposta num período prolongado de recessão com provável deflação. Nesta conjuntura, o valor dos títulos poderia continuar subindo e a própria remuneração (os juros), embora baixíssima, não seria corroída pela subida de preços. Além de serem mais atrativos do que ações, que em tal cenário, manteriam a tendência de queda. Só que, conforme realça Chancellor, num sistema de papel moeda, o governo guarda sempre o poder, em última instância, de aumentar o consumo e criar inflação. Assim, investidores que compram títulos de longo prazo, pagando os inflados preços atuais, também estariam apostando na possibilidade de uma equipe de governo determinada, junto ao FED, com a máquina de fabricar dólares nas mãos, perderem a batalha contra a deflação. De acordo com Chancellor, a chance disto acontecer é praticamente nula. Por outro lado, a possibilidade dos responsáveis pela política econômica errarem a dose das medidas que estão sendo implementadas é grande. Perigos do excesso de estímulo Até o fim de Outubro, a oferta de dinheiro crescia anualmente nos EUA a uma taxa de 38%. A última vez que houve um crescimento remotamente próximo a este foi em 1939, quando a oferta se expandiu em 28%. Expansão monetária drástica normalmente significa inflação. Pois bem, a partir de Outubro o Federal Reserve acelerou ainda mais este processo. Em dezembro de 2007, a base monetária era de US$ 836 bilhões e saltou para US$ 1.48 trilhões em Dezembro de 2008, fechando o ano com expansão de 76%. Considerando-se apenas os últimos três meses do ano passado, a oferta de dinheiro cresceu a uma taxa anualizada de 300%. Paralelamente, o déficit orçamentário de 2009, mesmo antes de Obama assumir e gastar qualquer centavo, está na casa de US$ 1.2 trilhões. Estima-se que o pacote de estímulo econômico possa acrescentar 2/3 ao montante no vermelho. O banco Morgan Stanley projeta que em 2009 o déficit fiscal bruto dos Estados Unidos exceda 10% do PIB, novo recorde, bem superior ao anterior, de 6% do PIB em 1983. Quem vai querer bancar? Vai ficando claro que com esses níveis exponenciais de expansão tanto do déficit fiscal, quanto da base monetária, tão logo a inflação ressuscite, deverá crescer aceleradamente. Outra consequência da exacerbada expansão monetária é que vai se tornando mais difícil e mais custoso para os EUA financiarem o seu débito, num período no qual eles dependem demais deste financiamento. A próxima etapa então seria a monetização do débito. Este processo consiste na emissão de títulos pelo Tesouro para compra pelo Banco Central (o FED), via impressão de dinheiro. Ou seja, com a crescente emissão e indiscriminada oferta de títulos do débito americano, quem é que vai querer ficar com eles? Esta monetização pode até segurar o valor dos títulos por um tempo, mas até quando? Como em todas as bolhas, o momento exato de sair e migrar para outros investimentos é difícil de ser determinado. O que fica visível é que o suposto porto seguro está se tornando cada vez mais arriscado. Seja quando os títulos são analisados sob o aspecto de rentabilidade (juros); seja quando avaliados segundo o potencial de ganho especulativo, já que cresce a possibilidade de uma queda brusca do valor destes ativos. Prolifera também no meio acadêmico o questionamento (já antigo) da própria capacidade de solvência dos Estados Unidos. Até quando o mundo estará disposto ou será capaz de financiar a sua maior potência? Possibilidade de uma segunda perna recessiva As autoridades mundiais vêm tomando medidas jamais vistas em qualquer recessão anterior. Análises convencionais começam a apontar que, dada a agressividade do pacote de medidas do governo americano (e do FED), os EUA poderão sair da recessão ainda no primeiro semestre e apresentar um crescimento robusto já a partir da segunda metade do ano. Os indicadores positivos seriam certamente acompanhados e até antecipados por novos ralis nos mercados de ações mundiais. Porém, ao aproximar-se o final do ano ou lá pelo começo de 2010, o ressurgimento da inflação e a derrocada do mercado de títulos do governo causariam uma elevação significativa nas taxas de juros de longo prazo, como também exigiriam uma reviravolta na política de juros zero de curto prazo do FED. A administração Obama começaria a ser pressionada a cortar gastos públicos ou até a aumentar impostos. É justamente aí que reside o maior perigo. Uma reversão tão radical das políticas expansionistas poderá ter um efeito devastador, originando um segundo ciclo recessivo. Antes disto se consumar, os mercados de ações já teriam retomado a tendência de baixa, desta feita com as políticas monetárias e fiscais sendo forçadas a manterem-se restritivas. Clima para um novo Glass-Steagall Act Baseado nas semelhanças entre o ambiente que antecedeu o crash de 1929 e a presente fragilidade do sistema financeiro internacional, o economista Hilário Muylaert espera do novo governo americano, ações na direção da regulação dos mercados tão ou mais incisivas que as ocorridas a partir de 1933. Naquele ano é votado e aprovado o Glass-Steagall Act, que definia as operações ativas e passivas das diversas instituições financeiras existentes na época. Basicamente, separou as funções e atividades dos bancos comerciais, dos bancos de investimentos, cias. hipotecárias, seguradoras, fundos de pensão, etc. Paralelamente, o Federal Reserve introduzia tetos para as taxas de juros, tanto para captação como para os empréstimos, e proibia o pagamento de juros sobre depósitos à vista, através das Regulations Q. Também em 1933, foi criado o FDIC – Federal Deposit Insurance Corporation – com o propósito de garantir depósitos bancários em bancos comerciais até determinados limites, procurarando restabelecer a confiança dos depositantes. Em 1934, foi aprovada pelo legislativo americano a criação da Security Exchange Comission -SEC- órgão regulador do mercado de capitais. Hilário observa que os mercados, no entanto, estão sempre descobrindo maneiras de driblar as regulamentações estabelecidas e extrapolar os limites prudenciais dos acordos da Basiléia. A partir de fins da década de 70, com a introdução da securitização de recebíveis, os bancos comerciais americanos criaram um novo modelo de atuação, baseado na transferência de risco de crédito, que proporcionou o aumento da alavancagem de suas operações ativas, sem nenhuma interferência dos órgãos reguladores e fiscalizadores. A seguir, este processo foi potencializado com a invenção dos CDS, um derivativo de crédito muitíssimo utilizado pelos bancos comerciais para vender seus riscos de crédito, limpando sua carteira de ativos. Durante as décadas de 80 e 90, boa parte da estrutura regulatória criada nos anos 30 foi sendo desmantelada pelos governos republicanos, que endossavam as práticas de auto-regulação correntes do mercado. O poder oculto do laissez-faire O tiro de misericórdia foi desferido pelo Gramm-Leach-Bliley Financial Modernization Act, de 1999, no governo do democrata Bill Clinton, que acabou com a segmentação das atividades das instituições financeiras, a título, como o próprio nome sugere, de uma suposta modernização dos mercados. Alan Greenspan, o então venerado presidente do Federal Reserve, louvava e incentivava o que descrevia como criatividade financeira. Cabe notar que na ocasião (em 1999), o poder legislativo apenas ratificou as mudanças, que na verdade já vinham sendo praticadas pelo sistema financeiro. O legislador sanciona o mercado. Enfim, a história se repete e, mais uma vez, em 2008, fica nítida a ausência de regulação das atividades das diversas instituições financeiras. As securitizações evoluíram para o empacotamento de diversos tipos de ativos em um único título. Tais papéis foram chamados de Collaterized Debt Obligations – CDOs – e reuniam hipotecas, cartões de crédito, empréstimos, etc. Também proliferaram os CDS (Credit Default Swaps), fora de qualquer controle por parte das autoridades reguladoras. As operações de bancos comerciais se misturaram novamente com as de bancos de investimento, observando-se a multiplicação dos bancos universais (ou múltiplos). Parece claro que as autoridades governamentais, não apenas dos EUA, mas de todo o mundo, os diversos órgãos reguladores nacionais e internacionais, os representantes dos bancos centrais, o BIS – Bank for International Settlements – e demais órgãos competentes, deverão nortear suas discussões no sentido do desenvolvimento de uma nova arquitetura financeira que restabeleça pelo menos a lógica do Glass-Steagall Act. Hilário acredita que esta tarefa deva começar por um literal retorno aos princípios adotados na década de 30, com a precisa e rígida delimitação das atividades de cada tipo de instituição, dos seus ativos e passivos. Como decorrência, os bancos universais deixariam de existir. Outras medidas importantes viriam no âmbito do acordo de Basiléia II, como por exemplo, a exigência de capital para riscos operacionais e maior transparência na divulgação de informações ao mercado. Na visão do economista, é necessária a padronização dos critérios de avaliação de riscos, com a contínua fiscalização das agências classificadoras, assim como um eficaz acompanhamento dos métodos de gerenciamento de riscos usados pelos bancos e demais instituições financeiras. Para completar, a exemplo do que já é feito no Brasil pela CETIP, os derivativos financeiros negociados nos mercados de balcão deveriam passar a ser registrados em algum órgão destinado a este fim. A morosidade com que a comunidade internacional lida com a situação é o fato preocupante. Todos parecem em compasso de espera pela nova equipe econômica dos EUA. Enquanto isso, os mercados não param. Cabeças pensantes seguem exercitando sua capacidade criativa, a preço de ouro.

Fonte: Escola Nacional de Seguros

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