Copa do Mundo aumenta chance de inflação superar o teto da meta
A Copa do Mundo de 2014 deve aumentar o turismo no Brasil e a procura por produtos e serviços de hotelaria, transportes, bares e restaurantes. Os preços podem subir e, com eles, a chance de o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) a inflação oficial do país superar o limite de 6,5% fixado no sistema de metas brasileiro neste ano, segundo economistas ouvidos pelo G1.
“A gente tem a expectativa de uma elevação um pouco mais forte em preços de serviços. A forma como é feita a medição [do IPCA], que é nas capitais onde vai ter jogos, também contribui. O governo auxiliou evitando um tipo de alta mais forte em bebidas, particularmente em cervejas. Mas a inflação deve desviar da média dos últimos anos uns 10 pontos base para cima, ficando de 0,30% para 0,40% [nos meses da Copa]”, avalia André Perfeito, da Gradual Investimentos.
Calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPCA mede a variação do custo de vida de famílias com renda mensal entre um e 40 salários mínimos das 11 principais regiões metropolitanas do país. Os preços de um conjunto de produtos e serviços são coletados em mais de 28 mil estabelecimentos visitados pelos pesquisadores.
Segundo André Perfeito, a Copa tem impacto na inflação e pode contribuir para o estouro do teto da meta. “Contribui para estourar o teto sim. Mas não sei se é o caso agora”, diz.
O economista-sênior do Espírito Santo Investment Bank, Flávio Serrano, tem opinião semelhante. “Você tem o IPCA composto essencialmente por serviços, a maior parte dos preços livres. Em função dos jogos, sobem os de alguns produtos que não deveriam subir. Passados os jogos, é natural que se observe um retorno de parte dessas pressões.” De acordo com Serrano, a Copa é um dos fatores de risco que pode elevar o IPCA acima de 6,5%. “A gente está muito no limiar [do teto em 12 meses]. A inflação está alta, alguns preços estão represados. Não há espaço para absorver qualquer choque.”
Essa visão, entretanto, não é unânime. A economista da Tendências Consultoria, Adriana Molinari, avalia que a Copa do Mundo não deve trazer pressões adicionais para o índice de 2014, apesar de provável elevação nos meses dos jogos. “As altas observadas devem se reverter em quedas nos meses subsequentes. Portanto, o saldo na inflação de 2014 deve ser nulo”, afirma ela, acrescentando que, por isso, o evento não traz uma possibilidade maior de estouro da meta no ano.
Para Mansueto Almeida, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), normalmente a Copa do Mundo não aumenta a inflação do ano em questão. “Mas muda a sazonalidade [variação de preços conforme a época do ano]. No ano cheio, tem impacto pequeno, irrisório. Pode atrapalhar um pouquinho, mas não tende a ser muito relevante. A inflação de serviços, que é mais no terceiro e quatro trimestre, por exemplo, será antecipada.”
O que pode subir?Cristiano Diehl Xavier, sócio do Xavier Advogados, recomenda a diminuição de alguns gastos durante a Copa do Mundo. A segurança estará na diminuição dos gastos com determinados serviços mais suscetíveis à pressão da inflação. Hotéis, pousadas, restaurantes, bares, agências de turismo, aluguéis, empregados domésticos e médicos serão os segmentos mais afetados.”Na avaliação da economista Adriana Molinari, da Tendências Consultoria, a Copa deve trazer altas “pontuais” de preços, especialmente em itens de serviços, como passagem aérea, hotéis e alimentação fora de casa.
Flávio Serrano, do Espírito Santo Investment Bank, diz que haverá um processo de inflação mais disseminado. “Algumas empresas podem recuperar margens [de lucro] perdidas com o momento favorável. Passagens aéreas vão subir no período, mas é natural que os preços voltem [depois].”
IPCA de junho e julhoNos últimos dez anos, o IPCA de junho e julho ficou, respectivamente, na média de 0,23% e 0,29%. Nos últimos cinco anos, no entanto, o índice ficou bem menor do que isso: média de 0,17% nos dois meses. Trata-se de um período em que, geralmente, a inflação é mais baixa.
Para este ano, a expectativa dos economistas do mercado, em pesquisa feita pelo próprio Banco Central com mais de 100 instituições financeiras, é que o IPCA some 0,34% em junho e 0,29% em julho, números bem acima da média dos últimos cinco anos. Para 2014, a previsão do mercado para o IPCA está em 6,47%.
O que diz o Banco CentralNo relatório de inflação de dezembro do ano passado, o BC informou que, com a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro (em 2016), o IPCA “acumularia” uma alta de dois pontos percentuais em relação ao usual entre 2007 e 2017.
“Nesse sentido, sugere que choques decorrentes da realização de megaeventos podem ser ligeiramente inflacionários”, informou o BC. De acordo com a instituição, o “efeito máximo” do choque de inflação se verifica no “ano seguinte” ao da ocorrência da competição. “O impacto do choque desapareceria seis anos após a realização do evento”, acrescentou o BC.
O G1 questionou a instituição sobre o impacto da Copa do Mundo no IPCA somente de 2014. A autoridade monetária, porém, informou apenas que “não dispõe das informações no nível de especificidade pretendido”.
Chance de estouro do teto da metaNo último relatório de inflação divulgado pelo BC, admite-se que a chance de o IPCA estourar o teto da meta de 6,5% neste ano é de 38% no cenário de referência (com juros e câmbio estáveis) e de 40% no cenário de mercado (com estimativa dos analistas dos bancos para juros e câmbio) – o maior percentual já registrado no relatório de inflação divulgado no fim do primeiro trimestre.
Em março de 2013, por exemplo, o BC previu que a chance do estouro da meta, no ano passado, estava em 25%. O índice ficou em 5,91%, dentro do esperado. Em março de 2011, a estimativa estava em 20% no cenário de referência e 18% no cenário de mercado. Naquele ano, o IPCA somou 6,5%, no limite do sistema de metas.
Fonte: G1