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Consequências psicológicas de um sequestro

Na segunda (18/12/06) o personagem Luciano da novela “Páginas da Vida” – Rede Globo -, interpretado por Rafael Almeida, foi vítima de um seqüestro e está em cativeiro. Familiares, namorada e conhecidos estão abalados com a situação, enquanto Luciano, longe da liberdade, sofre com os maus tratos, com o medo da morte, com seus pensamentos voltados para seus familiares e às pessoas que ama. Se na ficção sofremos e torcemos por um final feliz, imagine o tormento que vivenciamos quando somos protagonistas na vida real.
O assunto abordado pelo novelista Manoel Carlos, em maior ou menor grau, infelizmente, está cada vez mais em alta no nosso dia-a-dia, principalmente, para quem vive nos grandes centros urbanos. Ficamos aliviados e emocionados quando a mídia noticia que uma vítima foi libertada, especialmente quando está ilesa. Afinal, a vida para todos que sofreram parece que seguirá seu curso normal. No entanto, esquecemos de algo muito importante: quais são as conseqüências psíquicas de experiências tão traumáticas? Como será que esses trágicos destinos marcarão e conduzirão a vida de cada um deles dali para frente? São os perversos reflexos da “força bruta” dos tempos modernos que não distinguem credo, raça, sexo e idade.
Além de todo o sofrimento durante o período do seqüestro, a situação traumática é capaz de desencadear uma doença denominada Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT). As pessoas que sofrem desse transtorno são capazes de recordar não somente as imagens do ocorrido como também reviver e remoer de forma intensa, persistente e sofrível toda a dor e o terror que lhes abateu. É o flashback do tormento!
Os portadores do TEPT são pessoas que passaram por eventos de natureza excepcionalmente ameaçadora ou catastrófica; testemunharam a morte de perto; correram risco de vida; vivenciaram momentos de violência ou fatos violentos como assaltos, seqüestros, acidentes de carro, desastres naturais, guerras, torturas psicológicas e físicas, abusos sexuais, etc., corroborados por sentimentos de impotência, medo e horror. São fatos que lhes marcaram profundamente e que desencadearam uma série de sintomas físicos e psíquicos, sinalizando que o trauma não foi superado.
É natural que pessoas que estiveram cara a cara com o perigo, necessitem de um tempo de adaptação para que as experiências dolorosas possam ser processadas, diluídas e cicatrizadas. Mas para quem sofre do transtorno em si, a memória freqüentemente traz à tona todas as lembranças do ocorrido. O evento traumático perpetua-se de forma intensa, provocando seqüelas psíquicas às suas vítimas, mostrando sinais evidentes de que ele continua vivo na memória.
Atualmente, o transtorno é diagnosticado com relativa freqüência nos consultórios de psiquiatria e psicologia do mundo todo e está tomando força expressiva, a exemplo do que ocorreu com a depressão e o pânico. Nos Estados Unidos as pesquisas apontam que 8% a 12% da população já desenvolveram ou vão desenvolver os sintomas, configurando-se em uma patologia.
A predisposição para que o transtorno se instale, varia de indivíduo para indivíduo e está muito relacionada à sensibilidade emocional de cada um. São as predisposições pessoais e a capacidade individual de lidar com situações adversas que determinam quem cairá ou não nas “redes” implacáveis do transtorno.
É importante esclarecer que nem sempre os sintomas aparecem imediatamente após o evento traumático, podendo levar meses até o seu surgimento. Outro fator importante para se fechar o diagnóstico de TEPT é o fato de a pessoa apresentar recordações vivas, intrusivas (involuntárias e abruptas) do acontecimento traumático. O indivíduo revive persistentemente a situação na forma de recordações aflitivas e repetitivas. Nestes casos, incluem-se as imagens, pensamentos, percepções, pesadelos ou flashbacks (como cenas de um filme), inerentes ao evento.
A pessoa também pode sentir um sofrimento psicológico intenso quando exposta aos fatos que lembram o trauma original, com fortes respostas fisiológicas que se assemelham ao ataque de pânico: taquicardia, sudorese intensa, ondas de frio ou de calor, sensação de desmaio, falta de ar etc. A revivescência das suas dolorosas recordações e com extrema realidade podem estar “à espreita” nos pequenos detalhes. Desta forma, muitos evitam repetidamente tudo o que está relacionado ao evento traumático (pessoas, assuntos, lugares), pois pensar sobre o evento pode ser uma verdadeira tortura.
Em muitos pacientes observamos o aparecimento de sentimentos de “anestesia” em relação às emoções, como se fosse um embotamento emocional. São os sentimentos de “anulação” de seus prazeres que se encontram sufocados pelas lembranças marcantes e que, via de regra, determina o afastamento de pessoas importantes de seu convívio.
Pessoas com TEPT também estão mais predispostas a explosões de raiva, insônia, dificuldade de concentração, estado de alerta permanente e/ou sustos e sobressaltos. Além disso, sensações de futuro abreviado, onde as perspectivas de tempos melhores e de planos prazerosos podem estar comprometidas e deturpadas pelo trauma.
É essencial que o indivíduo procure ajuda logo após o trauma, pois as chances de melhoras e superação das recordações aflitivas são maiores. O tratamento precoce também diminui a probabilidade do indivíduo desenvolver outros transtornos como depressão, pânico, abuso de drogas etc., que podem trazer seqüelas para o resto de suas vidas, com prejuízos evidentes nos setores sociais, profissionais e/ou acadêmicos.
Parte do texto foi extraída do livro “Mentes com Medo: da compreensão à superação”.
Autoria: Ana Beatriz B. Silva*
Editora: Integrare
*Dra. Ana Beatriz B. Silva é médica psiquiatra, conferencista e escritora. Diretora das clínicas Medicina do Comportamento – RJ e SP.

Fonte: Segs.com.br

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