Concentração dificulta o crédito
Além do aumento dos juros, que botou uma trava na disposição de muita gente de se endividar, sobretudo depois do estouro da crise mundial em setembro último, um fator importante está dificultando ainda mais o acesso ao crédito: a concentração do setor bancário no Brasil. Estudo da agência de classificação de risco Austin Rating revela que, no fim de 1994 (ano de implementação do Plano Real), os cinco maiores bancos do país respondiam por 56,8% das operações de crédito. Em dezembro de 2008, esse índice saltou para 77,5%. Com menos concorrência, essas instituições se sentiram fortalecidas para impor condições mais duras aos consumidores e as empresas.
A concentração maior foi resultado de dezenas de fusões e aquisições nos últimos anos e de quebras no meio do caminho, como a do Banco Santos. No fim do ano passado, por exemplo, Itaú (então 2º do ranking) e Unibanco (6º) se fundiram e o Banco do Brasil (1º) comprou a Nossa Caixa (10º) e metade do Votorantim (8º). Quando há mais instituições, a retomada de uma crise tende a ser mais rápida, pela própria dinâmica de competição por maior participação de mercado, diz o presidente da filial brasileira da seguradora de crédito Coface, Fernando Blanco. Se há 50 grandes bancos brigando, alguns se animam antes dos outros (a voltar a emprestar) e, com isso, acabam puxando o setor inteiro, explica.
Para o analista da Austin Rating, Luís Miguel Santacreu, o Brasil enfrenta, a um só tempo, dois desafios. Um estrutural, que é a concentração bancária, e outro conjuntural, que é a crise de crédito global que nos pegou em cheio, ressalta. Tal realidade o faz elogiar as medidas anunciadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) no fim de março, cujo objetivo é aumentar a liquidez dos bancos menores. O CMN elevou para até R$ 20 milhões a cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) para aplicações em Recibos de Depósitos Bancários (RDBs). Espera-se, com isso, que investidores voltem a comprar esse tipo de papel emitido por bancos menores, o que permitiria que voltassem a emprestar. Esses bancos têm mais proximidade com o cliente e, por isso, têm mais agilidade, explica.
Rodolfo Riechert, diretor do banco UBS Pactual, concorda. Os bancos menores têm uma função social na economia. Segundo ele, os pequenos e médios são as principais fontes de recursos para pequenas e médias empresas. Essas, por sua vez, empregam a maioria dos brasileiros. O professor da Universidade de São Paulo (USP) Alberto Borges Matias não vê relação clara entre concentração bancária e a retomada do crédito no pós-crise. Mas acredita que o fato de o Brasil ter cada vez menos bancos relevantes é ruim. Em primeiro lugar, porque dá a eles muito poder na definição de preços e tarifas. Em segundo, porque cria um risco para o próprio sistema financeiro.
Fonte: Correio Braziliense