Com errata, relatório do BC projeta inflação mais baixa
O Banco Central (BC) publicou, ontem à noite, uma errata do Relatório de Inflação (RTI) divulgado na semana passada. As projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em dois diferentes cenários de uma das mais importantes peças de comunicação da autoridade monetária foram ajustadas para baixo de forma relevante.
Após as correções, no cenário com taxas de juros e câmbio constantes, o antigo “cenário de referência”, a projeção para 2017 caiu de 3,9% para 3,6% e para 2018 recuou de 4% para 3,3%, uma queda de 0,7 ponto percentual.
Segundo o BC, “a projeção é menor do que no cenário anterior porque, como a trajetória da inflação é de queda, o pressuposto de taxa de juros nominal constante resulta em aumento na taxa de juros real, pressionando ainda mais a inflação para baixo.”
Já no cenário híbrido, com taxa de câmbio da pesquisa Focus e taxa Selic constante, a projeção para 2017 caiu de 3,9% para 3,7% e para 2018 mudou de 4,2% para 3,5%. Ainda de acordo com o BC, todas as demais informações, projeções e tabelas do relatório continuam válidas e não foram alteradas.
Em nota, o BC diz que “foi corrigido erro operacional no cálculo dos valores referentes às projeções de inflação”. A correção pegou dois dos quatro diferentes cenários apresentados. Segundo o próprio BC, a projeção que traz mais informação no momento de queda da Selic, como agora, é aquela que considera as trajetórias de câmbio e Selic da pesquisa Focus, o antigo “cenário de mercado”, que mostra IPCA de 4% no fim de 2017, 4,5% em 2018 e 4,6% para os 12 meses encerrados no primeiro trimestre de 2019. Essas projeções não foram alteradas.
O economista-chefe da Icatu Vanguarda, Rodrigo Melo, diz que desde a divulgação do RTI alguns agentes de mercado vinham demonstrando estranhamento com as projeções do documento para o IPCA, consideradas elevadas. Segundo ele, porém, como as estimativas para o cenário de mercado foram mantidas, é provável que o impacto sobre os juros futuros de mercado seja mais limitado.
Nesta semana, analistas econômicos perguntaram a dirigentes do BC sobre as projeções em reuniões fechadas, apurou o Valor, que davam a entender que houve uma perda de potência dos juros.
As projeções apresentadas pelo BC na semana passada davam conta de que, se os juros caíssem a 9% até o fim de 2017, como previsto pelo mercado, e o câmbio se desvalorizasse como antecipado pelos analistas, a inflação de 2018 ficaria em 4,5%. Mas numa outra projeção, em que os juros ficassem estáveis nos 12,25% ao ano atuais e o câmbio evoluísse como prevê o mercado, a inflação ficaria em 4%.
Ou seja, apesar de juros 3,25 pontos percentuais maiores, a inflação ficaria apenas 0,5 ponto percentual menor. Grosso modo, nesse cenário, cada ponto percentual de alta de juros teria um efeito de 0,16 ponto percentual na inflação. Muito menos do que o efeito de cerca de 0,3 ponto que os economistas normalmente encontram nos seus modelos.
Com a correção, a inflação projetada para 2018 cai a 3,3%, considerando juros constantes e a desvalorização prevista pelo mercado. Isso significa que uma alta de um ponto percentual nos juros leva a uma queda de 0,36 ponto percentual da inflação, uma potência da política monetária mais em linha com o histórico anterior.
A errata não tem consequência para a condução da política monetária, mas fica o constrangimento de corrigir um dos mais importantes documentos do BC, depois de uma polêmica envolvendo essas projeções.
Em fevereiro, o BC deixou de divulgar no comunicado do Copom o cenário com juros constantes, com o argumento de que era pouco informativo. Parte do mercado não gostou, porque essa projeção, junto com o cenário de mercado, dá uma ideia do poder de fogo da política monetária. Alguns acusaram o BC de não divulgar o cenário com juros constantes porque ele, segundo essa visão, deixaria claro o quanto o nível atual de juros é alto no Brasil.
O BC tem argumentado, porém, que nem sempre todas as projeções são úteis. Dependendo da situação, produzem mais ruído do que ajudam na comunicação de política monetária.
Resolveu, ainda, abandonar a antiga nomenclatura das projeções do cenário de referência. Na avaliação do BC, esse nome dava a falsa impressão de que essa era a projeção mais importante que as demais. Por isso, resolveu adotar o nome mais neutro de “projeção de inflação com taxas de juros constantes”.
Fonte: Valor