A Viúva Clicquot e o poder do empreendedorismo feminino.
Barbe-Nicole Ponsardin nasceu em berço próspero. Filha mais velha de um grande empresário da indústria têxtil da região de Reims na França, foi criada para ser esposa e mãe, como toda mulher do século XIX. Viúva aos 27 anos de idade e sem qualquer formação empresarial foi capaz transformar a pequena vinícola familiar em uma das melhores e mais respeitadas marcas de champanhe do mundo, que leva o seu nome.
Num cenário de abundância e oportunidades, pode parecer que o sucesso foi a consequência lógica da sua trajetória como empresária. Não foi. O sucesso da Viúva Clicquot foi uma construção com base em curiosidade, inteligência emocional, busca pela excelência, tomada de risco e inovação. Nenhuma dessas características foi herdada, mas desenvolvida por longos anos.
Barbe-Nicole casou-se com François Clicquot, jovem aristocrata também abastado, que tinha conhecimentos de botânica e era apaixonado pelo cultivo de uvas e, especialmente, por champanhe. Curiosa, entre os afazeres domésticos e cuidados com a filha do casal, aprendeu tudo sobre o plantio das uvas. Com a morte do marido e de posse das terras que havia herdado, aprofundou seus conhecimentos com os produtores locais e passou a dominar todo o processo desde o cultivo, a fermentação, estocagem e distribuição. François era apaixonado pelo champanhe, Barbe-Nicole apaixonou-se pelo negócio.
O início não foi fácil, Barbe-Nicole sofreu todos os tipos de revezes e cometeu muitos erros. O champanhe é temperamental e precisa de clima ideal, fermentação tempestiva e armazenamento adequado. E, ainda assim, nada disso era garantia de sucesso. Muitas safras foram perdidas; algumas pelo fortuito, outras pela teimosia da empresária em seguir apenas com a produção do champanhe. A empresa quase foi à falência por diversas vezes, o que a obrigou a mudar de rota e traçar novas estratégias: manter o mercado interno de vinhos mais simples e menos custosos para suportar os grandes investimentos que o champanhe demandava. Foi preciso muita inteligência emocional para responsabilizar-se pelas escolhas ruins e fazer escolhas melhores.
Superados os percalços iniciais, Barbe-Nicole entendeu que seu produto precisava se destacar. Enquanto os demais produtores vendiam produtos de menor qualidade, Barbe-Nicole buscou um processo de fermentação mais sofisticado, que tornou o champanhe mais puro e mais atrativo para se destacar no mercado internacional. Descobriu que o champanhe já engarrafado fermentava melhor e mais rápido do que em grandes barris e que a garrafa preservava melhor a temperatura durante o transporte. Com o aprimoramento do processo foi possível atingir a excelência do produto.
A essa altura o mercado local já estava dominado e Barbe-Nicole se viu diante do desafio de partir para o mercado internacional. Naquela época, a Europa enfrentava o fim das guerras Napoleônicas e a viúva, antevendo que a vitória dos russos não tardava a chegar, tomou o risco de enviar para Amsterdã sua melhor safra. Foi preciso planejamento para enfrentar os obstáculos dessa empreitada: ultrapassar embargos de Napoleão, a burocracia com licenças e taxas, além do próprio risco da carga se perder. Mas quando a guerra acabou, o primeiro champanhe a chegar à Rússia e conquistar o czar Alexandre I foi o da Viúva Clicquot.
A estratégia da viúva deu a ela vantagem sobre a concorrência, mas o que fez com que o champanhe se tornasse o vinho mais famoso do mundo foi sua grande inovação: a remuage. Barbe-Nicole desenvolveu essa técnica revolucionária de clarificação eficaz do champanhe que retira, em curto espaço de tempo, os resíduos das leveduras acumulados durante a fermentação apenas com inclinação e rotação das garrafas. A técnica permitiu a produção em larga escala e popularizou o champanhe.
Essa é uma de muitas histórias de mulheres empreendedoras, que sabiamente enxergam talentos, facilidades, sacrifícios e vicissitudes como oportunidades para a construção do sucesso. Um brinde a elas!