A verdade tóxica sobre o açúcar
O argumento da livre escolha é fraco em dois aspectos. O primeiro: não é possível haver livre escolha num ambiente de ignorância. Quem é capaz de entender qual é a quantidade de açúcar encontrada nos zilhões de produtos industrializados encontrados nos supermercados e associá-la aos tantos males que podem causar à saúde?
Compramos produtos salgados sem saber que há açúcar ali. E vice-versa. Os rótulos cumprem a obrigação legal de informar sobre a composição dos produtos, mas estão longe de ser suficientemente claros. Num universo alimentar dominado por infinitos itens altamente processados e de baixo custo, até as pessoas que estudaram por mais tempo são ignorantes em matéria de escolhas saudáveis.
A classe média emergente e os mais pobres, que no Brasil alcançaram o paraíso do consumo recentemente, estão perdidos. Não vai demorar para que as estatísticas de saúde tornem evidentes as consequências dos novos (e péssimos) hábitos alimentares desses milhões de brasileiros que hoje podem comprar infinitas guloseimas baratas e sem valor nutricional.
O segundo problema do argumento da livre escolha é o seguinte: o limite da minha liberdade de ação deveria ser o prejuízo que causo à coletividade, certo? Se escolho (de livre, informada e espontânea vontade) me entupir de açúcar, de sal, de gordura, de bebida e de cigarro, devo arcar com as consequências disso inclusive com os custos do meu tratamento médico quando as doenças surgirem.
É justo que um cidadão que passou a vida chutando o balde exija, muitas vezes por meio de ações judiciais, que o SUS ofereça a ele o melhor tratamento inventado pela indústria farmacêutica? Se o sistema público de saúde — apesar dos altos impostos que todos nós pagamos é subfinanciado, você aceitaria pagar um pouco mais para garantir o tratamento dos que fizeram mau uso do próprio corpo a vida inteira?
É bom ir pensando nessas questões incômodas porque o problema vai se agravar nos próximos anos. Nas últimas cinco décadas, o consumo de açúcar triplicou no mundo. Ele pode ser responsabilizado por grande parte das doenças não-transmissíveis que hoje causam 35 milhões de mortes anualmente.
Não é um problema apenas dos países ricos. Todos as nações que adotaram a dieta ocidental (fast food, muita gordura, produtos baratos e altamente industrializados) enfrentam esse dilema o Brasil está claramente entre eles. Atualmente, no mundo, o índice de obesos é 30% superior ao dos desnutridos.As autoridades consideram o açúcar como calorias vazias, escreveu Lustig no artigo da Nature. Calorias vazias são aquelas que não garantem nutrientes e só engordam.Na verdade, não há nada de vazio nessas calorias., afirma ele.
Fonte: O Globo