A dificuldade de medir danos
Faz mais de 30 anos que os riscos de responsabilidade civil estão na ordem do dia das seguradoras dos países do primeiro mundo. A razão para isto foi a explosão de ações desta natureza nos Estados Unidos, ainda na década de 1970.
Daí para frente, a discussão aumentou, com os sinistros se alastrando pelo mundo, com exemplos como Bophal, na Índia, Chernobil, na antiga União Soviética e Three Miles Island, nos EUA, dando uma nova dimensão para este tipo de dano.
Atualmente, ninguém sabe quantificar o tamanho do dano máximo possível decorrente de um sinistro de responsabilidade civil. Qual o valor que um sinistro envolvendo uma usina nuclear pode atingir? Para dar um parâmetro, as indenizações calculadas para os danos decorrentes do acidente de Chernobil, se a antiga União Soviética contratasse seguros, seria de mais de US$ 100 bilhões. Com um detalhe: Chernobil não era situada numa região de forte concentração humana e alta capacidade de geração de renda.
Trazendo a questão para um universo mais próximo, qual o tamanho do sinistro máximo decorrente de uma ruptura da barragem de Itaipu? Será possível quantificar a destruição provocada pela água antes de atingir o mar, incluindo boa parte da cidade de Buenos Aires?
Reduzindo mais o espectro, a cidade de São Paulo recebe todos os dias dezenas de caminhões transportando cargas perigosas. Qual seria o tamanho dos prejuízos causados pelo vazamento de um gás tóxico letal, numa das marginais? Não faz muito tempo a cidade assistiu, ou melhor, sentiu o cheiro das conseqüências de um acidente envolvendo um produto tóxico usado para chamar a atenção para um eventual vazamento de gás de cozinha.
E por aí a toada vai. Os sinistros de responsabilidade civil podem causar danos desproporcionais à sua causa. O tombamento de um caminhão é um prejuízo barato, mas se ele transporta um gás ou substância altamente tóxica que escapa, qual o valor dos prejuízos? E se em vez de escapar um gás, houver uma explosão, qual o custo das vidas humanas, acrescido das perdas materiais e patrimoniais decorrentes da explosão?
E se este sinistro envolver a usina nuclear de Angra 1, qual o total dos prejuízos com a morte imediata, mais a morte a longo prazo de milhares de pessoas, mais a destruição de milhares de casas, além da interdição para qualquer uso da região por vários anos, mais os danos ambientais de toda sorte, e os lucros cessantes, decorrentes apenas da interrupção do turismo? São valores inquantificáveis, mas que podem se tornar realidade, o que faz do seguro de responsabilidade civil a proteção obrigatória para qualquer um que tenha a propriedade, a posse ou manuseie qualquer tipo de produto ou bem com capacidade de causar danos em massa.
Mas será que o escrito até aqui não abre outros tipos de preocupação? Será que o proprietário de um automóvel pode ter certeza de que não se envolverá num acidente com alguém de altíssimo poder aquisitivo? Será que o dono de um apartamento com um vaso de samambaia pendurado no terraço pode ter certeza que ele não vai cair na cabeça de alguém passando na calçada?
Responsabilidade civil começa em atos tão simples e tão banais quanto derramar café no carpete do amigo ou sentar em cima dos óculos do vizinho. O prejuízo está lá e tem de ser indenizado. O problema é que estes danos podem tomar um vulto tal, que o patrimônio do seu causador é insuficiente para pagar só um pedaço das perdas. Para evitar isto, a ferramenta se chama seguro.
Fonte: O Estado de São Paulo