A busca pelo frescor e a mineralidade
Vicent Dauvissat: com o mesmo olhar e estilo zen do pai, continua a produzir os melhores, mais puros e requintados Chablis
Não é nenhuma novidade ressaltar a decisiva participação do produtor na qualidade final de um vinho, e no caso de Chablis, tema iniciado na coluna da semana passada, não é diferente. Levando-se em consideração o aumento da superfície plantada e a velocidade com que isso ocorreu na região – de 1000 hectares em 1960 para 4500 hectares atualmente -, atentar para quem assina o rótulo e buscar referências sobre ele ganha ainda mais importância na hora de comprar uma garrafa.
É bem verdade que a ampliação da área não atingiu enfaticamente as zonas delimitadas como Premier Cru e Grand Cru, o que, em tese, manteria os vinhos pertencentes a essas duas categorias livres de maiores riscos. Vale lembrar, porém que tal qual acontece no restante na Borgonha (e em várias outras Denominação de Origem), em Chablis os vinhedos também são bastante fragmentados, o que significa que uma parcela tem em geral vários proprietários, cada um com suas próprias parreiras. Nos seus domínios o produtor impõe sua filosofia e define seus objetivos com liberdade. Uns são zelosos e competentes, limitando o rendimento por planta e trabalhando para extrair as melhores uvas para produzir o melhor vinho. Outros nem tanto. Assim, é possível encontrar, dentro de um mesmo vinhedo, vinhos ótimos, médios e ruins. E isso pode e deve ser estendido para os rótulos básicos, Petit Chablis e Chablis.
Nessa fase de crescimento meio desordenado, muitos vinhedos trocaram de mãos, vinícolas se fortaleceram em tamanho – eventualmente perdendo foco e se enfraquecendo em qualidade -, e a função de négociant se espalhou, em suas diferentes formas de atuação: os que compram vinho pronto de vários pequenos produtores, misturam tudo e comercializam (a pior opção); os que compram mosto (a uva já prensada), fermentam, acompanham sua evolução e vendem; e os que compram a uva, que permite um melhor controle, e se responsabilizam por todo o processo de vinificação e sua colocação no mercado (os mais confiáveis). Nem sempre é possível identificar no rótulo de que maneira determinado negociante trabalha, mas a menção “vinifié, elevé e mis en bouteille”, juntas, é uma garantia a mais. É o caso de Verget, por exemplo, na tabela ao lado que resume o que há de mais representativo em Chablis no mercado brasileiro.
Outras mudanças influenciaram o Chablis de hoje em dia. O primeiro deles é a mecanização da colheita, procedimento que vinícolas de certo porte foram obrigadas a lançar mão em função da insuficiência de mão de obra para dar conta das novas áreas plantadas. Os mais zelosos, se não podem fugir dessa realidade, ao menos colhem manualmente os Grand Crus e alguns dos Premiers Crus.
A segunda questão envolve a utilização de barricas de carvalho, que, em excesso, tende a mascarar exatamente o grande diferencial dos Chablis, o frescor e a mineralidade. Felizmente, no geral, houve um recuo nesse procedimento e muitos dos vinhos têm readquirido seu caráter. Excessos sempre vão existir e visam seduzir consumidores desavisados. Chablis não é chardonnay estilo Novo Mundo. O mercado saberá distinguir.
Fonte: Valor