Lavagem de dinheiro preocupa setor de seguros
O mercado de seguros é vulnerável a lavagem de dinheiro? A resposta é sim. Um relatório produzido em 2005 pelo Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Dinheiro – Financial Action Task Force on Money Laundering (GAFI/FATF), intitulado “Lavagem de Dinheiro & Tipologias de Financiamento de Terroristas” (Money Laundering & Terrorist Financing Typologies), aponta o risco de os contratos de seguros serem utilizados nesse tipo de crime. No relatório, o GAFI/FATF manifesta, ainda, sua preocupação em relação à falta de conscientização do setor de seguros quanto a atração que seus produtos exercem sobre os criminosos que atuam na lavagem de dinheiro. No Brasil, a Lei 9.613 de março de 1998 definiu medidas legais e preventivas contra a lavagem de dinheiro, instituindo, inclusive, o sistema de comunicação de operação suspeita e a criação de uma Unidade de Inteligência Financeira (UIF). A mesma lei também introduziu na legislação brasileira uma série de iniciativas previstas em acordos de cooperação mundial, entre as quais as 40 + 9 Recomendações Especiais do GAFI/FATF. No âmbito do mercado de seguros, a Susep editou em 2008 a Circular 380, que não apenas segue essas recomendações especiais, como estabelece outras medidas de combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo. Para discutir a necessidade e o impacto dessas novas regras, a Marítima Seguros organizou, juntamente com a Câmara dos Corretores de Seguros do Estado de São Paulo, o evento “Lavagem de dinheiro – O mercado de seguros está vulnerável”, realizado em outubro de 2009, no auditório do Sindicato das Seguradoras de São Paulo (Sindseg-SP). Samy Hazan, diretor do RamoVida, e Cesar Rienzo, gerente de Compliance, ambos da Marítima, participaram como palestrantes, com a mediação do assessor jurídico da Câmara dos Corretores, Plínio Rizzi. Seguro é vulnerável. Na introdução ao tema da palestra, Samy Hazan deixou claro que o combate à lavagem de dinheiro não é uma preocupação apenas da Susep, mas do Brasil e de todo o mundo. Trata-se, segundo ele, da tendência de manter o país alinhado aos padrões e normas internacionais, como é o caso das regras de capital e solvência, que se tornaram uma proteção a mais para as empresas contra a crise financeira. No mesmo contexto estão outros normativos da Susep, com o de controles internos, de auditoria e avaliação atuarial, plano de negócios, ouvidorias e certificação técnica. Samy Hazan explicou, ainda, que a Circular 380/08 foi antecedida pela Lei 9.613/98, a qual introduziu na legislação brasileira uma série de iniciativas internacionais contra o financiamento ao terrorismo e a lavagem de dinheiro. A lei brasileira surgiu anos depois de os países que compõem o G-7 criarem, em 1989, o FATF, cujas recomendações contra esses tipos de crime são seguidas em todo o mundo. Para Samy Hazan, o relatório produzido em 2005 pelo GAFI/FATF mostra o quanto o setor de seguros é vulnerável à ação de criminosos na lavagem de dinheiro. Entre os inúmeros exemplos apresentados pelo estudo está a fraude em sinistro de seguro patrimonial. Nesse caso, o criminoso adquire com dinheiro ilícito bens de alto valor, provocando, em seguida, um sinistro de perdas ou danos. Outra forma de lavagem ocorre por meio da comunicação de falso sinistro em imóveis “fantasmas”. Invasão de privacidade. A Circular 380/08 estabelece a obrigação de serem comunicadas todas as operações de seguro incompatíveis com o perfil socioeconômico, capacidade financeira ou ocupação profissional do segurado. Segundo Cesar Rienzo, até mesmo as propostas que não forem convertidas em apólices, mas que apresentem indícios de operações suspeitas devem ser informadas. E detalhe: a Susep quer saber inclusive dos casos em que houve resistência do segurado em fornecer dados. Para Cesar Rienzo, o objetivo da Susep ao editar a circular foi fechar o trânsito para o terrorismo e as facções criminosas, privando-os do produto do crime. Tanto que um dos alvos são as pessoas expostas politicamente (PEP), aquelas que exercem cargos públicos, de chefes de Estado até os presidentes de empresas públicas, autarquias e outras. Todos os segurados PEP devem ser identificados pelas empresas seguradoras, corretoras e resseguradoras. “As novas medidas não vão provocar nenhum impacto significativo no dia-a-dia dos nossos clientes. Mas, algumas mudanças significativas são esperadas do lado das seguradoras, como o a aumento das exigências de informação sobre nossos clientes pessoa física e jurídica”, explicou Samy Hazan. A invasão de privacidade do segurado, um dos argumentos contrários à circular apresentados durante o evento foi rebatido pelo advogado Plinio Rizzi. Ele recorreu à Teoria Tridimensional do Direito, criada pelo jurista Miguel Reale, para explicar a evolução do conceito de valor na sociedade. “No Direito, um valor cede a vez a outro que é mais importante. Com a Lei 9.613, estamos deixando de lado a privacidade para priorizar a entrega da informação”, disse. Na ocasião, alguns corretores de seguros se queixaram da circular, alegando que suas exigências, especialmente as relacionadas às informações sobre os segurados, poderiam emperrar a comercialização. “Mas, essa não é a intenção da Susep”, alertou Samy Hazan. Ele também acredita que o objetivo da Susep não é transferir o problema para a ponta, isto é, para os responsáveis pela venda do seguro. De acordo com Cesar Rienzo, uma solicitação das seguradoras enviada à Susep por meio da entidade que as representa, a CNSeg, propõe uma revisão na circular. “Estamos tentando fazer com que algumas exigências da circular, que são muito duras, sejam flexibilizadas. Mas, a Susep ainda não respondeu”, disse.Para o Samy Hazan, as novas regras dificultarão a lavagem de dinheiro, permitindo que os players do mercado – seguradoras, resseguradoras e corretores -, desempenhem seu papel de financiadores da economia de maneira mais saudável e sustentável. “Podemos encarar o combate à lavagem de dinheiro como uma política do tipo conheça seu cliente. Ou seja, precisamos saber com quem fazemos negócio, de onde vem o dinheiro, e para onde ele vai”, disse. Como o seguro pode servir à lavagem de dinheiro. Tipo de crime: Fraude em sinistro de seguro patrimonial envolvendo mercadorias compradas com recursos ilícitos. Como ocorre: O dinheiro é lavado utilizando-se recursos ilícitos para adquirir mercadorias de alto valor, apresentando em seguida um sinistro relativo à perda ou dano de tais mercadorias. Alternativamente, imóveis “fantasmas” são segurados e sinistros são comunicados. Exemplo: O sujeito comprou um imóvel na praia e um seguro de acidentes para sua lancha. Pagou prêmios elevados e reclamou alguns sinistros sobre o imóvel e a lancha que foram indenizados. No entanto, teve o cuidado de garantir que os sinistros fossem sempre inferiores ao valor dos pagamentos dos prêmios, de forma que a seguradora tivesse um lucro razoável sobre a apólice. Os recursos pareciam vir de uma companhia de seguros de renome, e poucas pessoas questionaram sua origem. Mas, após alguns meses, descobriu-se que o segurado estava “lavando dinheiro” através da apólice de seguro, já que os recursos usados para pagamento do prêmio tinham origem criminosa. Tipo de crime: Resgate antecipado da apólice de seguro de Vida Dotal ou Vida Resgatável. Como ocorre: Quando uma apólice de seguro é emitida e depois resgatada antecipadamente (antes do prazo previsto). Normalmente esse método chama a atenção, já que o cliente pode optar pelo resgate antecipado, apesar de realizar uma perda financeira. Tipo de crime: Pagamento de prêmios por terceiros. Como ocorre: O método envolve o pagamento dos prêmios de seguros por terceiros que não são o segurado e não foram identificados por meio dos procedimentos normais quando da assinatura da proposta de seguro. Exemplo: Uma apólice de seguro de vida foi emitida. Verificou-se que o titular da conta utilizada para pagamento dos prêmios não era o segurado, mas sim uma empresa no exterior à qual o proponente era sócio. Investigações revelaram que o cenário foi idealizado para encobrir a origem ilícita dos recursos que vieram de um esquema grande e organizado de fraude fiscal do qual o cliente fazia parte.Tipo de crime: Contratação de seguro paga em “dinheiro vivo”. Como ocorre: A lavagem de dinheiro ocorre por meio de grandes pagamentos de prêmios feitos em dinheiro vivo. Este é o método mais tradicional de lavagem de dinheiro, principalmente quando o valor do sinistro reclamado é igual ou inferior ao prêmio pago.
Fonte: AIDA