Redução dos juros favorece a procura pelo banco ideal
A portabilidade na área financeira começou a ganhar mercado no final do ano de 2006, mas os seus efeitos ainda são incipientes.
Na avaliação de associações e especialistas do setor, a possibilidade
de migração de operações financeiras de clientes entre as instituições
bancárias, criada há três anos por meio de uma resolução do governo,
aumentou a competição entre os bancos. Para não perder o cliente, que
pode mudar muito mais facilmente de banco, a instituição passou a
negociar condições melhores de crédito e financiamento. “Muitas vezes,
o cliente tem um histórico de operações com a instituição e prefere
continuar onde está. Mas a facilidade com que ele agora pode sair de um
banco abriu espaço para que sente à mesa para buscar melhores condições
de negociação”, diz Alexandre Chaia, professor de derivativos e riscos
do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper, ex-Ibmec São Paulo).
Especialistas acreditam ainda que a recente queda na taxa básica de
juros, atualmente em 9,25% ao ano, poderá tornar o cliente mais
motivado a buscar condições financeiras mais adequadas para quitar
débitos e renegociar contratos. E isso pode favorecer uma nova onda de
portabilidade.
Últimos dados disponibilizados pelo Banco Central mostram um avanço no volume de clientes que optaram pela portabilidade.
Segundo cálculo da entidade, em dezembro de 2006, foram registradas 28
operações de migração de saldo devedor, enquanto que, em julho de 2007,
o volume total atingiu 1.723. A soma movimentada passou de R$ 300 mil
para R$ 18,9 milhões no mesmo intervalo de tempo – o que dá uma média
de quase R$ 11 mil por operação. O BC informa que não há números
atualizados sobre o tema na base de dados. “Não há previsão
regulamentar para fornecimento periódico de informações sobre a
portabilidade”, informou a entidade por meio de sua assessoria de
imprensa.
Na área de previdência privada, o número de transferências de planos cresceu a partir de 2007, após o início da portabilidade.
“Tínhamos de duas a três mil transferências por mês há cerca de três
anos. Hoje, esse número atinge cerca de cinco mil ao mês e já tivemos
pico de seis mil operações em 2008″, informa Marco Antonio Rossi,
vice-presidente da Federação Nacional da Previdência Privada e Vida (Fenaprevi).
“Acreditamos que o direito do usuário à migração tem forte peso nisso”, completa.
Em setembro de 2006, o Conselho Monetário Nacional estabeleceu na
resolução 3.401 uma série de normas fundamentais para o início da
portabilidade de crédito no país. A resolução garante ao cliente o
direito de quitação antecipada de débitos, mediante o recebimento de
recursos transferidos por outra instituição. Também determinou que um
banco deve fornecer dados cadastrais a outro, quando formalmente
autorizado pelo cliente – sem custo algum para o usuário.
Ainda foi criada a portabilidade do salário, na resolução 3.402 de
2006, que possibilita o recebimento do salário por meio de contas
especiais, isentas de tarifas, sendo que o valor total do salário pode
ser transferido para a instituição da escolha do cliente.
Essas normas são de extrema importância porque, até então, além dos
custos que o usuário teria de arcar com a migração, a elevada
burocracia desanimava a troca. No passado, para antecipar um pagamento
de dívida (com recursos obtidos em outra instituição), as tarifas
variavam entre os bancos. Hoje ela é fixa e proporcional ao tempo que
restava para quitar o débito. Por exemplo, se o usuário pagou seis
parcelas de um financiamento de automóvel e vai antecipar o pagamento,
por meio de novo financiamento em banco concorrente, a taxa na
instituição original tem de cair 50%.
Analistas de bancos acreditam que as principais áreas favorecidas pelas
novas regras são o crédito consignado e imobiliário e a conta-salário.
Isso porque a base de clientes em ambas as áreas é alta e já havia uma
demanda de mercado interessada em migrar de banco. “A portabilidade
está a todo vapor em determinadas operações, como conta-salário, por
exemplo. Como o trabalhador muda de emprego várias vezes ao longo da
vida, ele carregava muitas contas e encargos, em diferentes bancos”,
afirma o presidente da Associação Brasileira de Bancos, Renato de Oliva.
Na avaliação de Alberto Borges Matias, diretor do Instituto de Ensino e
Pesquisa em Administração, a falta de conhecimento, por parte dos
clientes, do direito à migração sem custos ainda impede maiores avanços
nesse processo.
Segundo Matias, as primeiras campanhas de esclarecimento a respeito da
portabilidade foram fundamentais para aumentar a base de clientes
interessados na migração. Mas, desde 2007, elas foram diminuindo.
Para ele, há ainda outra questão que pesa de forma negativa.
“Existe um fator cultural de peso nesse processo”, diz ele. “O
brasileiro ainda está pouco habituado a buscar melhores condições na
hora de negociar um crédito com bancos. A tendência é que ele busque a
empresa onde tem conta”, completa. No entanto, ele entende que já
existe uma postura mais ativa do que no passado.
“O ponto positivo é que o cliente já entende que há uma competição entre as grandes instituições.
Mesmo que ele não usufrua da portabilidade, pelo menos ele começa a
abrir um canal de negociação com seu banco.” Mas, há outras operações
que não fazem parte da resolução sobre portabilidade do BC. Os fundos
de investimento, por exemplo, não foram incluídos nessa cesta. Se o
cliente mudar de banco e não quiser manter os recursos aplicados na
instituição financeira, a única solução é resgatar o dinheiro e voltar
a aplicá-lo. No entanto, é cobrado o Imposto de Renda proporcional.
Outras aplicações, como em ações e títulos do governo estão fora da
portabilidade. Isso porque, na prática, sempre foi possível fazer essa
migração sem dificuldades e custos, entre bancos e corretoras. No caso
das ações, é necessário abrir uma conta no agente financeiro escolhido
e a corretora de origem procede a transferência eletronicamente, sem
gastos para o cliente. Tambémé possível transferir títulos públicos
adquiridos no Tesouro Direto, sem precisar resgatá-los. É preciso se
cadastrar junto à nova instituição e solicitar a mudança ao agente
antigo. Não há custos para o investidor ou cobrança de Imposto de Renda
Fonte: Valor