Resseguradoras investem em “cat bonds” contra impacto de grandes desastres
Enquanto mercados de títulos de todos os tipos são assolados por um coquetel de juros altos, apreensão diante dos déficits governamentais bancos centrais em modo contracionista, uma classe de instrumento de dívida vem rendendo retornos superiores a 10% aos credores: o bônus catástrofe (cat bonds, em inglês).
Os que investiram nesse segmento têm ficado literalmente a salvo de tempestades e vêm colhendo retornos de até 16% em 2023. Em razão da forma como são estruturados, as taxas de cupom desses papéis continuam em alta, acompanhando o rendimento dos títulos do Tesouro dos EUA. Além disso, o investidor ganha um alto prêmio de risco sobre seu capital, desde que nenhuma catástrofe de fato aconteça.
A dinâmica tem chamado a atenção de um número cada vez maior de emissores e gestores de recursos. Andy Palmer, encarregado da estruturação de cat bonds na Swiss Re na Europa e Ásia, disse que a emissão no acumulado de 2023 até setembro soma US$ 10,2 bilhões, 27% a mais do que no mesmo período do ano anterior. Ele descreve o clima no mercado como de entusiasmo.
Grandes resseguradoras, como Swiss Re e Munich Re, assim como empresas da chamada economia real, vêm dando cada vez mais atenção aos cat bonds como forma de proteção contra o impacto financeiro de grandes desastres.
Em julho, a Blackstone valeu-se de uma emissão desse tipo para proteger ativos imobiliários de eventuais perdas em desastres naturais. AAlphabet, dona do Google, também fez uma emissão do tipo, para o caso de sua sede na Califórnia ser atingida por um terremoto. Por sua vez, gestores de recursos vêm fazendo fila para ter acesso aos grandes retornos oferecidos pelos papéis. Também gostam da diversificação que os bônus catástrofe oferecem a seus portfólios, porque os papéis têm comportamento diferente daquele das ações e outros títulos de renda fixa.
A Schroders e a GAM Investments, da Suíça, operam os maiores fundos de cat bonds, segundo a Morningstar. Credit Suisse, Amundi e Axa são bastante atuantes no segmento.
Ainda assim, os investidores precisam ter sangue-frio o suficiente para assumir um tipo muito particular de risco, que vem se intensificando e um mundo onde os padrões ambientais são perturbados pelas mudanças climáticas.
Os investidores em cat bonds ganham dinheiro desde que a catástrofe específica descrita nos termos do título – um furacão, uma inundação extrema ou um terremoto – não aconteça.
Caso se materialize, os detentores dos títulos podem perder parte ou todo o dinheiro, que é então usado para cobrir o custo dos danos causados pelo desastre natural.
Os retornos têm aumentado porque os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA estão em alta e são repassados automaticamente aos cupons dos cat bonds, que são instrumentos de taxa variável.
Os investidores também estão ganhando prêmios mais altos por assumir o risco de eventos climáticos severos, que é cada vez maior. Houve uma reavaliação dos preços do risco de catástrofes em todo o mundo, especialmente em lugares como Califórnia, Flórida e Austrália disse Steve Evans, dono da Artemis, firma que acompanha o segmento cat e mercados de ativos vinculados a seguros.
Os cat bonds funcionam da seguinte maneira: uma resseguradora ou uma empresa emite um título quando deseja dividir o risco de uma catástrofe específica com participantes do mercado de capitais.
Os investidores recebem o pagamento integral, desde que o evento – meticulosamente definido em termos de gravidade ou impacto para o patrocinador ou de métricas como a velocidade exata do vento – não se materialize. Alguns dos maiores investimentos se referem a tempestades com ventos de alta velocidade, especialmente na Flórida.
Se a catástrofe definida acontecer, os investidores podem perder parte ou todo o dinheiro investido.
A empresa de seguros, então, usa esse dinheiro para ajudar a pagar as apólices. Os investidores recebem uma taxa de cupom variável – muitas vezes baseada nas taxas dos títulos do Tesouro dos EUA – somada a um prêmio por assumir o risco da catástrofe. Dessa forma, o retorno total do índice de cat bonds da Swiss Re subiu para 7,55% em meados de maio, maior retorno anual em dez anos, em comparação aos 5% do fim do primeiro trimestre. Agora, os retornos médios estão superando o 16%, de acordo com a Swiss Re.
Há apenas um ano, as justificativas a favor do investimento não eram tão fortes. Os retornos variaram entre 2,8% e 5,8% no período de 201 2021, segundo o índice da Swiss Re.
O cenário mudou em 2022, quando o furacão Ian atingiu a Flórida, causando mais de US$ 50 bilhões perdas. Muitos investidores perderam dinheiro e o tamanho das emissões encolheu. Foi um evento muito grande, disse Paul Schultz, executivo-chefe da Aon Securities, um banco de investimento que organiza colocações de cat bonds. Em termos gerais, a inflação em alta, os custos relacionados à força do dólar e o impacto do furacão Ian causaram uma reavaliação significativa do preço do risco, disse Schultz. E essa reavaliação energizou o mercado.
Em 2023, em grande medida, os investidores em bônus catástrofe têm sido poupados de grandes eventos que acionam cláusulas de proteção. Analistas do Citigroup estimam que as perdas totais seguradas no terceiro trimestre somaram cerca de US$ 17 bilhões, abaixo do normal para esse período ativo.
Fonte: NULL