Setor automotivo sofre duro golpe e retrocede quase 20 anos
Para uma indústria que há tempos opera com cerca de metade da sua capacidade, o resultado de janeiro foi um duro golpe.
A produção de veículos no primeiro mês deste ano voltou ao nível de 19 anos atrás e as vendas internas retrocederam ao volume de 17 anos atrás.
Vale lembrar que o parque industrial do setor nesses dois anos era bem menor do que hoje. Nos janeiros de 2003 e 2005, o país não tinha, ainda, a fábrica da Nissan, em Resende (RJ), ou a da Stellantis em Pernambuco (PE), por exemplo.
Isso significa que, mais uma vez, o setor automotivo volta ao passado, apesar de apto a produzir mais. O agravamento da pandemia, em número de contágios, e a falta de semicondutores interferiram na atividade do setor nas últimas semanas.
Algumas empresas também esticaram férias coletivas em janeiro, depois do esforço para produzir mais em dezembro.
Vale lembrar que as empresas dessa indústria gostam de poder produzir e principalmente vender mais em dezembro.
O último mês do ano encerra também a participação de cada marca no mercado. Meio ponto percentual a mais pode fazer diferença entre marcas concorrentes e mexe com resultados de desempenho das equipes de vendas e de marketing.
Os volumes de janeiro podem ter sido impactados, como sustentou esta semana a Anfavea, associação que representa o setor, por pandemia, falta de peças, férias coletivas e até mesmo chuvas acima da média, como destacou o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes.
Além disso, a disseminação do surto sanitário, pela variante ômicron se refletiu na atividade do setor.
Levantamento da Anfavea indica índices de absenteísmo nas montadoras em janeiro entre 6% e 7% somente por conta dos contágios.
O que, no entanto, mais preocupa os dirigentes do setor é o que vem pela frente a partir das decisões do Comitê de Política Monetária (Copom).
A escalada da Selic, que, depois do último ajuste tem levado economistas a estimar uma taxa de juros de mais de 12% em 2022, perturba um setor cujas vendas dependem de financiamento.
Em torno de 60% dos carros vendidos no país são financiados. Tudo o que está atrelado à alta dos juros interfere no mercado.
Se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficar acima do teto de 5%, conforme o BC estimou nesta semana, a meta de inflação será ultrapassada pelo segundo ano consecutivo, o que afeta o poder de consumo das famílias.
Bens duráveis mais caros, como carros, tendem a ser mais atingidos num cenário de perda do poder aquisitivo.
A direção da Anfavea deixou clara a preocupação com os prejuízos da escalada dos juros na demanda por automóveis. E criticou a dose do BC na elevação da taxa Selic.
Qualquer retrocesso nas chances de recuperação da atividade desse setor pioram um cenário que já está turbulento pela baixa participação do Brasil nas estratégias de desenvolvimento global de novas tecnologias para veículos.
Por meio de um comunicado, divulgado à imprensa na terça-feira, o presidente da Toyota do Brasil, Rafael Chang, voltou a apontar a necessidade de o Brasil ser mais competitivo.
Desta vez, porém, não se trata de repetir um clichê que os representantes dessa indústria gostam de usar. As subsidiárias brasileiras de um dos setores mais globalizados da indústria se veem ainda distantes do processo de desenvolvimento dos carros do futuro.
A Anfavea começa a se alinhar às previsões de que o crescimento do Produto Interno Bruto ficará abaixo do que se esperava no início do ano.
Em janeiro, os fabricantes de veículos esperavam que o PIB em 2022 pudesse crescer 0,5%. Mas agora já refazem as contas.
Apesar do mau desempenho em janeiro, a Anfavea mantém as previsões para o ano. A entidade calcula chegar a uma produção de 2,46 milhões de veículos, um avanço de 9,4% na comparação com 2021.
Para o mercado interno, a expectativa é chegar a 2,3 milhões de unidades, alta de 8,5%. Puxadas pela demanda de países como Colômbia, México e Uruguai, as exportações foram menos prejudicadas em janeiro, com crescimento de 6,6% em relação a janeiro do ano passado.
A Argentina, o maior mercado no exterior, continua, no entanto, a apresentar dificuldades para as montadoras. O mercado vizinho depende, em grande parte, da produção no Brasil. Mas o baixo nível de reservas em moeda estrangeira dificulta a liberação de dólares na entrada de veículos importados do Brasil.
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