Economistas: recuperação será lenta
A retomada da economia brasileira deve ser lenta, e, enquanto a crise política persistir, a tendência é de que investidores mantenham cautela. Paralelo a isso, os consumidores e os empresários continuarão a enfrentar desafios para manter as contas em dia, em meio à alta do endividamento e das taxas de juros ainda em dois dígitos. As afirmações foram feitas por economistas que participaram ontem do evento Correio Debate – Desafios para 2017, realizado no auditório do Correio Braziliense e mediado pelo editor executivo Vicente Nunes.
A recuperação do Produto Interno Bruto (PIB) será gradual porque as famílias e as empresas brasileiras estão endividadas, explicou o economista Tony Volpon, ex-diretor do Banco Central (BC). Ele relembrou que, em outros períodos de recessão, o Brasil se recuperava rapidamente, mas que a crise atual decorre de uma série de fatores mais complexos. Entre eles, bolhas de investimento e exageros nos mercados imobiliário, automobilístico e de petróleo. “E resolver esses problemas não é fácil. Vários setores foram afetados e isso traz problema para toda a economia”, afirmou.
Volpon destacou que essa é a primeira recessão após o período de rápido crescimento do mercado de crédito brasileiro. Esse segmento, segundo ele, dobrou de tamanho em relação ao PIB entre 2002 e 2016, mas os estímulos excessivos ao consumo tiveram implicações macroeconômicas. “Se você olhar aquilo que o governo Dilma Rousseff estava fazendo entre 2012 e 2014, era para a pessoa se endividar cada vez mais. Esse endividamento foi estimulado com o objetivo de ter o desenvolvimento econômico rápido, e não deu certo”, comentou. Com isso, antes de voltar a gastar, as companhias e a população precisam colocar as contas em dia.
Para piorar a situação, destacou o ex-diretor do BC, o país mantém uma política fiscal frouxa e expansionista, ao lado de uma autoridade monetária imbuída na missão de levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, em 2017, o que pode ser considerado uma contradição. “Para ter um processo de recuperação mais célere, o que sobrou é política monetária. Uma queda de juros mais agressiva, de 0,5 a um ponto percentual por reunião do Copom, exigiria maior aperto na política fiscal a curto prazo, não no ritmo atual, que simplesmente joga a conta para o próximo governo. Mas, se a gente puder mudar o mix fiscal e monetário, o BC será induzido a reduzir os juros drasticamente”, explicou.
A deterioração das contas públicas nos últimos anos, ressaltou o economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, é uma das explicações para a crise do país. Entretanto, ele destacou que a recuperação da confiança com a mudança de governo não é a única condição para que a economia volte a crescer. Nas contas dele, os desafios do país são enormes no curto prazo, sobretudo para conter a escalada da dívida pública. “O que gerou o deficit foi uma queda relevante das receitas. O desafio vai ser aumentar a arrecadação e só existem dois caminhos: ou você eleva impostos, ou incentiva a economia. Não tem outro jeito de pensar isso`”, destacou.
Reformas
Nas contas de André Perfeito, a economia terá um tímido crescimento, de 0,2%, em 2017. Com o aumento dos ruídos políticos após a delação premiada da Odebrecht, porém, existe uma chance de o PIB ser, mais uma vez, negativo. Ele lembrou que, em outras oportunidades, o governo incentivou o consumo para sair da crise, mas observou que essa fórmula está ultrapassada. “O problema principal do Brasil é político: é preciso estabilizar essa crise. Estamos muito tensos o tempo todo. Como economista, nós já não aguentamos mais essas mudanças bruscas”, avaliou.
A recuperação econômica passará pela execução de reformas estruturais, assinalou o ex-diretor do BC, Carlos Eduardo de Freitas. Ele destacou que, após a aprovação da emenda constitucional que impõe um teto para o crescimento dos gastos públicos, o governo precisará alterar as normas para concessão de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Entretanto, Freitas alertou que o governo ainda não detalhou como será o fluxo de caixa da Previdência se a reforma for aprovada pelo Congresso Nacional. “Alguma coisa vai ter que ser feita para realmente reduzir o deficit nas contas do INSS. Mas a maneira de olhar precisa ser aberta para debate. O que trago aqui é a ideia de que a sociedade deve debater, e isso é uma sugestão de abordagem”, ponderou.
Freitas lembrou que os economistas de esquerda sustentam que não há deficit nas contas da Previdência porque ela está inserida na Seguridade Social, e o orçamento prevê fontes de financiamento para custear os benefícios. Entretanto, ele observou que o regime é de repartição simples, no qual os trabalhadores da ativa custeiam as aposentadorias dos mais velhos. “Minha visão do problema da Previdência é que temos um deficit. O governo fala que vai ter uma economia de “não sei quantos bilhões” nos próximos anos. Para mim, isso não diz nada. Quero saber quais as premissas e como ficarão os deficits”, disse.
Fonte: Correio Brasiliense