Vou de táxi?
Em meio ao trânsito pesado durante o trajeto entre sua residência no Itaim Bibi, bairro da zona sul de São Paulo, e seu escritório, na região central da metrópole, o executivo Eduardo Barella pode se dar ao luxo de se desligar do estressante mundo fora do automóvel. Sua rotina nos 40 minutos do caminho até o trabalho consiste em abrir calmamente o jornal, ler e responder e-mails e estudar projetos. Para conseguir esse momento só seu, o CEO do grupo de engenharia Progen, companhia com mais de 2,6 mil funcionários, decidiu fazer uma troca que muitos considerariam radical: vendeu o carro e há seis meses só usa táxi.
O que convenceu Barella a realizar a mudança, na verdade, nem foi tanto o ganho em bem-estar. No início, a troca teve uma motivação puramente financeira. “Coloquei no papel os principais gastos com meu veículo e vi que economizaria quase a metade se usasse táxi”, afirma. Com o argumento irrefutável dos números, no fim do ano passado o executivo vendeu sua Mitsubishi Pajero, investiu o dinheiro e passou a se locomover por meios alternativos. “Para mim, carro próprio nunca mais. Além de economia, consigo mais agilidade nos deslocamentos, porque os motoristas podem usar os corredores de ônibus para fugir do tráfego nas avenidas”, conta.
A experiência do executivo fornece combustível a uma dúvida recorrente: afinal, andar de táxi é ou não mais barato que manter um carro? Na verdade, a pergunta deveria ser outra: em que situações vale a pena substituir o veículo próprio pelo táxi? Na avaliação de especialistas, a balança pende de um lado para outro de acordo com inúmeras variáveis, como distância percorrida por dia, valor do veículo, depreciação, tipo de combustível usado e, claro, a bandeirada e o preço por quilômetro cobrado em cada praça.
No caso de Barella, para a conta fechar, o cálculo levou em consideração o fato de que, devido às exigências de sua função, ele passou um terço do ano passado fora de casa. Além disso, um utilitário de luxo tem custos fixos, entre impostos, seguro e manutenção, três vezes mais altos que os de um automóvel popular. Por isso, como a economia em valores absolutos é maior, a vantagem do táxi fica mais evidente.
Esmiuçar o tema, como fez Barella, na prática, significa lançar luz sobre os custos “invisíveis” de ter um automóvel, que, embora pesem no orçamento, costumam passar batidos. O especialista em finanças e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Samy Dana cita a depreciação e o custo de oportunidade como dois fatores ignorados pelos proprietários. O primeiro conceito diz respeito à perda de valor de mercado com o tempo. De acordo com o pesquisador, um carro se desvaloriza em média 10% a cada ano. O outro custo invisível leva em consideração o que se deixa de ganhar se o valor correspondente ao veículo estivesse aplicado, por exemplo, na caderneta de poupança. “Carro não é investimento. Com a aquisição de um automóvel o dinheiro fica imobilizado, ou seja, além de não render juros, perde valor”, explica Dana.
Junto com a depreciação e o custo de oportunidade, o cálculo dos gastos anuais com veículos deve levar em conta vários itens: o seguro, em média de 4% do valor do carro; o IPVA, com alíquotas de 3% a 4% para a maioria dos automóveis e utilitários; manutenção, o que inclui reparos e trocas preventivas de peças como filtros de ar e óleo, pastilhas de freio e pneus; despesas com licenciamento e seguro obrigatório; gasto de combustível e com estacionamento.
Em simulação feita pelo especialista da FGV, mesmo sem levar em conta despesas pontuais, como multas, furtos e acidentes, o desembolso anual para um veículo com valor de mercado de R$ 30 mil e que rode apenas 10 quilômetros por dia na cidade de São Paulo alcança R$ 12,9 mil – acima dos R$ 12,3 mil em gastos com uso de táxi em bandeira 1. Acima dessa distância, o carro próprio é mais econômico na capital paulista.
O custo médio para manutenção de veículos, apurado pelo Índice de Manutenção do Carro (IMC) da agência Autoinforme, alcançou R$ 11,9 mil em 2011. Isso significa que, com base em despesas reais, o táxi levaria vantagem sobre o carro próprio para quem se desloca até 285 quilômetros por mês em São Paulo.
O IMC, levantado mensalmente, reflete a média ponderada dos preços de produtos e serviços automotivos na cidade de São Paulo para automóveis populares, médios e utilitários. De acordo com o diretor da Autoinforme, Joel Leite, o levantamento considera os valores de praticamente todos os itens envolvidos, de peças de reposição a seguro, sem considerar a depreciação e o custo de oportunidade.
Essa relação entre táxi e carro próprio, no entanto, varia de cidade para cidade. Uma pesquisa do departamento de Engenharia de Transportes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) investigou os custos das modalidades de transporte e concluiu que na capital fluminense para quem se desloca até 500 quilômetros por mês é mais barato usar os serviços de um chofer. O coordenador do levantamento, o professor Paulo Cézar Ribeiro, faz uma ressalva sobre o resultado: “A bandeirada, o custo do quilômetro, a distância média e até o preço do combustível podem ser diferentes em cada município. Então, o que vale para o Rio pode não funcionar em São Paulo ou em outra capital, por exemplo”.
De fato, o valor do quilômetro rodado é por volta de 32% menor nos táxis do Rio de Janeiro do que em São Paulo. Com isso, os cariocas podem rodar até 16 quilômetros por dia contra 10 dos paulistanos – considerando a hipótese de troca do carro no valor de R$ 30 mil pelos serviços de táxi.
Qualquer simulação de gastos, no entanto, vai ser sempre incompleta. Há custos – e ganhos – impossíveis de se medir na escolha entre táxi e carro próprio, como o prazer de dirigir ou o status. Para o executivo Eduardo Barella, a vida ficou mais simples sem automóvel. Mas para milhões de motoristas talvez o que importa mesmo seja a possibilidade de fazer o seu próprio caminho – mesmo que não seja, eventualmente, o mais rápido ou o mais econômico.
Fonte: Valor