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Uma mulher gorda – depoimento pessoal sobre a gordofobia

Está na mídia a toda hora, nos bombardeando… casos como o da Paola Oliveira – lindíssima e ótima atriz, rainha da bateria da Grande Rio, Escola de samba no Rio de Janeiro.

Paola foi atacada em seu perfil nas redes sociais, no final de janeiro, após participar de um ensaio geral da escola, por pessoas que lhe diziam que ela estava “gorda”, “fora de forma”, sendo que um destes detratores chegou a usar a expressão “braço de merendeira” para ser pejorativo com o tamanho do braço de Paola…  

Outro caso recente, também ocorrido no final de janeiro, envolveu a modelo Yasmin Brunet, participante do BBB da Globo, que se viu também atacada por seu corpo e pela sua forma de comer (comentada como compulsiva).

Neste outro caso um dos “brothres”, que, posteriormente foi eliminado da casa, disse que o corpo da modelo era “estranho” e foi entrevistado no programa de Ana Maria Braga, sendo confrontado com suas falas.  

Ana Maria Braga falou sobre o desrespeito do “brother” ao falar que o corpo de Yasmin Brunet seria “estranho” durante uma conversa com Rodriguinho e Pizane. Bastante emotivo, ele analisou seus comentários e se reconheceu como machista, e até usou a expressão “idiota” para se autodescrever.

Em mais outro caso recente, ainda no final de janeiro, a funkeira Jojo Todynho, musa da Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel, que passou por cirurgia bariátrica e já perdeu mais de quarenta quilos, também foi criticada nas redes sociais por sua celulite e pelo tamanho de sua bunda… ao que revidou dizendo “Corpo da mulher brasileira é isso aí.”   

O assunto reverberou nas mídias impressas e sociais – “corpo de mulher é um domínio público”, alvo de controle social.

Mas, este controle social não é equitativo, “em uma sociedade altamente hierarquizada, racismo e etarismo contribuem para que as exigências sejam ainda maiores para quem não é branca, magra e jovem. As velhas tornam-se invisíveis, as não brancas precisam afirmar que são sujeitos”. (frase de Maria Carolina Medeiros, professora da FGV e da ESPM Rio) .  

A mesma professora nos ensina que “Quando Simone de Beauvoir escreve que “não se nasce mulher, torna-se” ela fala de opressão. O homem nasce um ser completo, mas a mulher precisa confirmar sua humanidade a vida toda, e isso se dá pela aparência e pelo comportamento.”

Dito tudo isto, a título de preâmbulo, venho aqui compartilhar a história de uma mulher gorda: eu – que sempre, desde os oito anos de idade, lutei para me entender, me aceitar e me respeitar.  

Desde cedo, na escola, no vestiário, eu não conseguia ficar nua diante das outras meninas lindas e magras, que se despiam e desfilavam no espaço – eu não tirava a roupa e ia suja para casa, por vergonha de expor meu corpo.

Demorei a ter namorado e sempre achava que eu ocupava um espaço maior na sala de aula do que eu devia… esbarrava nas carteiras, ao me movimentar… pura insegurança.  

A coisa seguiu no ensino médio e na faculdade. Meu peso não podia ser falado ou comentado, porque era muitos quilos a mais do peso considerado “normal.

Sim, fiz dietas, todas: da lua, da proteína, de frutas, jejum intermitente … e conseguia, com extrema dificuldade, perder poucos quilos, que eram, após, recuperados em curto espaço de tempo.      

Lembro que um dos comentários que mais gostei no meu primeiro casamento, vestida de noiva, foi que que eu parecia mais magra… ufa! Que felicidade!

Para engravidar de meu primeiro filho eu fiquei magra com uma dieta severíssima e na gravidez engordei vinte e três quilos (comi com felicidade – tudo o que queria) voltando ao meu peso original.   

Oscilava entre tentar emagrecer e ser feliz relaxando os controles.

Não sou paciente indicada para bariátrica, porque meu IMC não é tão alto assim e não tenho comorbidades, mas coloquei um balão intra-gástrico e depois, mais uma vez, retornei ao peso que sempre tive – uns quinze a vinte quilos acima do que “deveria ser”.  

Hoje ainda estou “fora do padrão” dos corpos esbeltos, mas aprendi, com muita luta interna, a gostar de mim e a entender que posso fazer atividades físicas que me dão prazer, mesmo não sendo “atlética”.

Esta descoberta foi espetacular! Adoro me exercitar e isto me ajuda a me equilibrar física e mentalmente.  

Também aprendi que tenho uma intolerância a glúten e que, quando retiro este elemento de minha alimentação, eu sigo melhor.

Aprendi a cozinhar para mim, coisas legais, gostosas e não tão calóricas.

E coloquei como meta maior para mim: ser saudável em primeiro lugar.  

Hoje aos quase sessenta anos de idade, posso declarar que me acho bonita, interessante e que gosto muito de mim mesma, mas foi um árduo caminho de aprendizado até chegar aqui.

E por isto resolvi escrever este artigo para mostrar o quanto sofremos com as cobranças sociais e com nossas próprias cobranças.

Não merecemos isto!  

Merecemos felicidade, autocuidado e respeito com nossos limites e com nossas características pessoais.

Para finalizar, confesso aqui para todas que, quando aprendemos a ter nossa autoestima preservada, estar acima do peso (ser gorda) não faz diferença para termos namorados. Eu os tive e muitos!

Vamos ser felizes e nos amar porque quem se ama encanta o próximo(a)!

Liliana Caldeira

Liliana Caldeira é Presidente da Sou Segura, advogada, graduada pela UFRJ, pós-graduada em Direito Empresarial pela FGV/RJ e mestre em Direito Econômico, pela UFRJ, licenciada em Filosofia pela UERJ. É professora da Escola de Negócios e Seguros – ENS da graduação e pós-graduação. Participa ativamente de Associações como a AIDA (Associação Internacional de Direito de Seguros).

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