Sucessão na Dedini expõe diferenças entre os herdeiros
Antigas diferenças familiares vieram à tona na disputa pelo comando de uma empresa que, embora ainda careça de modernização, é cobiçada pelo excepcional potencial do setor de etanol.
A empresa responde por mais da metade do fornecimento de equipamento para usinas de açúcar e álcool no mercado doméstico, com faturamento de R$ 1,6 bilhão no ano passado. E apenas começou a explorar o mercado internacional, com exportações principalmente para o Caribe.
Não há uma contenda aberta entre os herdeiros de Dovílio, mas os caminhos sucessórios indicados pelo empresário alimentaram insatisfações e criaram incertezas sobre os rumos da empresa. Uma polarização que já existia ficou ainda mais evidente: de um lado, a família de sua filha Juliana Dedini Ometto, de outro, a do filho Mario Dedini Ometto. Mario estava afastado da empresa e do convívio familiar mais íntimo há alguns anos por conta de desavenças com o pai e a irmã, mas dividia com Juliana a maior parte do capital da holding Doado, que controla a Dedini com cerca de 52% de suas ações. Dovílio mantinha uma fração residual de ações, que lhe deixavam na posição de fiel da balança. Pelo menos, era o que se acreditava.
Um processo no Fórum de Piracicaba mostra que menos de vinte e quatro horas após a morte de Dovílio, Mario solicitou a abertura do inventário do pai, reivindicando para si o papel de inventariante. Segundo pessoas próximas a Mario, ele acreditava que, como filho mais velho, lhe cabia tomar a dianteira e passar a clientes e fornecedores a mensagem de que não haveria uma descontinuidade no grupo. Para uma pessoa ligada a sua irmã Juliana, Mario desejava mais do que isso. “Tudo leva a crer que ele pensava que assumiria o controle da empresa e por isso tentou acelerar o processo de sucessão. Mas não foi o que aconteceu.”
Mario foi surpreendido por uma decisão tomada em segredo por Dovílio e da qual Juliana tinha conhecimento. Ainda vivo, o empresário transferiu para a filha ações que lhe deram uma fatia majoritária na holding Doado. E foi além, nomeou Juliana – e não Mario – responsável por conduzir o seu inventário. As relações entre pai e filho andavam estremecidas havia alguns anos e o patriarca deixou clara a intenção de beneficiar a filha. Mas sua decisão só se tornou conhecida por todos com a abertura do testamento, que listava apenas alguns poucos bens não transferidos em vida. A situação de Mario dentro da Doado permaneceu inalterada, com pouco menos da metade das ações da holding. Cláudia, outra dos três filhos, tem participação residual na Doado.
O que já se desenhava como um caso de sucessão conturbado, se complicou ainda mais com a morte prematura da herdeira Juliana, em 28 de janeiro deste ano, aos 57 anos. Pouco tempo depois da morte do pai, a filha descobriu uma doença fulminante.
Foi assim que o filho mais velho de Juliana, Giuliano Dedini Ometto Duarte, um arquiteto de 40 anos e que morou na Itália para estudar desenho industrial na Scuola Politecnica di Design em Milão, ascendeu ao controle. Sentou-se também na cadeira da presidência do conselho da Dedini.
Com morte da irmã, Mario assumiu finalmente o papel de inventariante. Nessa posição, pode agora contestar ou não as decisões do pai. Outra possibilidade é que busque entrar em acordo com os herdeiros da irmã Juliana em relação à governança da Dedini. Até agora não esboçou reação.
Mas, segundo uma pessoa próxima, Mario deverá reivindicar um papel mais ativo no grupo. “Hoje ele não está presente em nenhum dos conselhos de administração, das holdings ou da empresa. Mas a Dedini é um patrimônio importante, do qual ele não vai descuidar”, diz essa pessoa. O Valor tentou ouvir o acionista, sem sucesso. Foram deixados recados em sua residência, em Piracicaba, e também houve tentativa de contato por meio de seu representante legal, o respeitado advogado da área de contencioso, Celso Mori, do escritório Pinheiro Neto.
Os herdeiros de Juliana são representados pelo escritório Mattos Filho, que já advoga para a família há anos. Especificamente no tema da sucessão de Dovílio, o advogado contratado por Juliana foi Arnoldo Wald, importante nome do direito brasileiro. Ele a representava no inventário do pai e agora é o advogado do seu próprio espólio.
Nessa disputa velada entre os herdeiros de Dovílio, em que cada um observa qual será o próximo movimento do outro, algum apoio poderá ser buscado nos outros ramos da família que, reunidos nas holdings AD e Nidar, detêm 49% da Dedini. O advogado Mário Sérgio Duarte Garcia, que representa a Nidar, diz que seus clientes nada têm a ver com a disputa em curso. “É apenas dentro da Doado que se fará a sucessão do senhor Dovílio. Nossa posição é apenas de aguardar os acontecimentos.”
Pessoas próximas ao processo sucessório especulam que Mario poderia tentar comprar parte das ações pertencentes a AD e Nidar e, com isso, fortalecer-se como acionista. Conta a seu favor o fato de estar com o bolso recheado pela venda, no ano passado, da Dedini Agro ao grupo espanhol Abengoa, por 200 milhões de euros em dinheiro (fora dívidas assumidas). Mario e seu filho Adriano compraram as ações dos demais familiares na Dedini Agro há alguns anos por um preço muito inferior, separando-a do restante do grupo.
Fonte: Valor