Seguradoras nacionais não estão imunes à crise
A maior prova de que as seguradoras não estão imunes à crise que avassala o mundo é a entrada do governo americano na AIG, até então a maior seguradora do mundo, com um empréstimo emergencial de US$ 85 bilhões.
Já escrevi que as seguradoras brasileiras não correm o risco de passar por uma situação semelhante. A razão é simples: as companhias nacionais não correm soltas como acontecia nos Estados Unidos e na Europa. Ao contrário, as regras de solvência aplicáveis a elas e os controles mensais da Susep dão ao órgão fiscalizador um retrato quase diário da posição das empresas em atividade no País, tanto no que diz respeito aos seus investimentos, como quanto aos riscos assumidos.
Além disso, por força da legislação, as seguradoras em operação no Brasil são obrigadas a investir praticamente a totalidade de suas reservas comprometidas com o negócio de seguro em títulos do governo.
Com isso, os segurados ficam bastante protegidos, já que o comprometimento da seguradora com seus riscos é garantido por títulos federais, em princípio, fora da área de turbulência, na medida em que não há qualquer indicação de que o governo brasileiro pretenda dar algum calote.
O dado desconhecido é qual o grau de gravidade com que o Brasil será atingido pelo tsunami que varre as economias de Europa, Estados Unidos e Japão. Imaginar, como queria o presidente, que apenas uma marola passará pelas nossas praias é desconsiderar os mecanismos de funcionamento da economia internacional.
Prova disso é a rapidez com que o dólar saltou de perto de R$ 1,50 para quase R$ 2,50 em menos de dez dias. Um salto desses acende a luz vermelha porque significa uma grande exposição do País às variações do humor dos controladores dos fluxos financeiros internacionais.
Como parte deles está suportando grandes prejuízos nos Estados Unidos e precisa de recursos para cobrir as perdas, a solução mais fácil é sacar o que têm em outros mercados, enquanto ainda dá para realizar algum lucro. E é o que estão fazendo.
A Bolsa de Valores, em razão disso, perdeu perto de 50% do valor que tinha no começo do ano. Várias ações tidas como entre as melhores já sofreram quedas acentuadas, de até 60% em relação ao mesmo período. E isso quer dizer que quem tem esses papéis em seu portfólio está evidentemente mais pobre.
É uma situação lamentavelmente verdadeira para várias empresas, incluídas companhias de seguros, já que as seguradoras podem aplicar parte das reservas de longo prazo em ações. Com a bolsa mais pobre, elas também ficam mais pobres, e, ainda que sem ter as reservas para fazer frente aos riscos e garantir as indenizações afetadas, seus balanços podem ter resultados menos expressivos do que os apresentados nos últimos exercícios.
Como, de outro lado, a carteira de automóveis da maioria delas não está tendo um bom desempenho ao longo do ano, as margens operacionais ficam estreitas e também impactam o resultado final do exercício.
Finalmente, a economia no ano que vem não apresentará o mesmo desempenho experimentado no passado recente. Ante a possibilidade de crescer menos, investimentos que gerariam novas necessidades de seguros estão sendo adiados. Além disso, no mercado interno, o esfriamento da economia deve significar queda nas vendas de imóveis e de veículos, duas atividades que, pela própria essência, são geradoras de seguros.
Quanto ao campo externo, não há como evitar uma queda da receita de nossas exportações. Em primeiro lugar, é clara uma sensível redução no preço dos nossos principais produtos. E, em segundo, é de se esperar também uma queda nos volumes exportados, já que a crise traz embutida nela uma redução da demanda internacional.
Assim, embora no momento não haja risco de quebra das seguradoras expressivas que atuam no Brasil, todas elas, como qualquer outra empresa, serão de alguma maneira afetadas pela situação internacional.
Fonte: O Estado de São Paulo