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Os impactos do novo Código Civil no contrato de seguro

O desembargador Silvio Capanema inaugurou o novo auditório do escritório Pellon & Associados Advocacia Empresarial, na última quinta-feira, alertando que o desafio que se abre para os magistrados e advogados com o advento do novo Código Civil “é tentar compatibilizar o tecnicismo e as especificidades do contrato de seguro com os novos paradigmas que emanam do Código Civil”. São eles: função social, boa-fé e efetividade. “Se a antiga jurisprudência era hostil às seguradoras, imagine agora, em que o juiz pode usar esses paradigmas e dizer que determinada cláusula contraria a função social do seguro ou que a contratação foi muito nebulosa, não se informou tudo ao segurado. A tendência, portanto, é agravar ainda mais a postura dos tribunais aos contratos de seguro, já que os juízes não conhecem bem o assunto”, adverte o desembargador.
No conflito entre texto da lei e os princípios que regem o novo Código, o juiz deverá manter-se fiel ao princípio, já que o princípio representa o valor, uma verdade absoluta da sociedade. “Nesses três anos de vigência do novo Código os profissionais de direito já devem ter percebido que houve uma mudança transcendental e o velho sistema do positivismo estrito, emanado do estado liberal clássico, onde o juiz estava escravizado ao texto da lei, mesmo que uma sentença pudesse causar uma catástrofe social, foi abandonado”, disse o desembargador Silvio Capanema. Com isto, a função do juiz e do advogado se transforma inteiramente, pois estes devem adaptar a Lei à realidade social. O juiz passa a ter agora “uma responsabilidade umbilical com a realização da justiça, porque ele não pode mais se escudar comodamente no texto da lei, jogando sobre o ombro do legislador a responsabilidade sobre as tragédias sociais”, afirmou.
“Essa é a mudança e os advogados têm que participar disso na medida em que formularão suas pretensões em consonância com esses novos valores”, explicou o desembargador.
Segundo Capanema, a função social do contrato está permeando todo o direito privado brasileiro e se torna uma cláusula implícita. Todo e qualquer contrato e especialmente o de seguro, que é impregnado dessa função social, está agora vinculado a essa cláusula. Sendo assim, o juiz poderá mergulhar no contrato para aferir se ele está promovendo um benefício genérico para toda a sociedade, e, portanto, para o segurado.
A boa-fé, segundo paradigma eminente do novo Código, de acordo com o desembargador Silvio Capanema, passa a ser dever jurídico e conduta obrigatória. O contrato de seguro era um dos poucos que já incluía o conceito de boa-fé em sua redação e, segundo Capanema, “esse era o grande mérito do contrato”. Como consta nos artigos 122 e 113, a primeira regra da interpretação dos negócios jurídicos é pela boa-fé e pelos costumes do lugar da celebração. “A aferição da boa-fé na interpretação do contrato de seguro será muito mais rigorosa”, enfatizou o desembargador. O juiz vai analisar para verificar se o segurado e a seguradora estão mantendo essa conduta honesta desde a tratativa, que antes nem era mencionada, até depois de concluído o contrato.
“As partes ainda terão que guardar a boa-fé, não revelando os segredos que tomaram conhecimento em decorrência da execução do contrato, após a sua conclusão. É um novo tempo de boa-fé, purificado eticamente. Isso sem dúvida vai repercutir no mundo dos seguros”, avaliou.
O terceiro paradigma é o da efetividade, que busca respostas adequadas e eficazes ao conflito de interesses. O juiz é que vai decidir e responder pela sua sentença, mas a efetividade depende dos advogados. “Isso traz um risco, mas os advogados sempre foram a primeira linha de defesa de liberdade e democracia e saberão se opor aos excessos. Para isso há recursos, representações ao Conselhão. Vocês terão que advogar em função da boa-fé, efetividade e função social, concordem ou não”, disse Silvio Capanema.
Ele admitiu ainda que, apesar dos esforços da Fenaseg e do Sindicato das Seguradoras do Rio de Janeiro em promover seminários de esclarecimentos, o contrato de seguro ainda é pouco conhecido pelos magistrados. Como exemplo, Capanema citou um processo em que o juiz condenou a seguradora a pagar o prêmio ao segurado, ao invés da indenização.
O desembargador também chamou atenção para a redação das propostas de seguro. “Os juízes sempre acham que a proposta de seguro é redigida em grego antigo e que o segurado nunca entende aquilo, o que infringe a questão do direito à informação”. O mesmo acontece com as declarações inexatas:
“O Código diz que é preciso guardar a boa-fé. Portanto, se o segurado prestar informações inexatas, perderá o direito à indenização e o juiz avaliará se houve má fé. Um exemplo é o paciente que se operou três vezes de ponte de safena e fez um seguro de vida, onde declarou que não sofria de doença que colocasse em risco a sua vida. Quando morre de infarto, a viúva reclama na Justiça e o juiz poderá dizer que o falecido era leigo. Quando perguntado se gozava de boa saúde, ele não pensou que aquelas operações poderiam colocar em risco a sua saúde”.
O desembargador também comentou sobre outra grande queixa das seguradoras: o problema das liminares. “Os seguradores alegam que vão acabar quebrando porque os juízes dão liminar com facilidade. Eu sugiro insistir no diálogo com a magistratura, eu sei que tem um custo alto para a seguradora, mas é necessário. Como diz o ditado, água mole em pedra dura tanto bate até que fura”.
Outra sugestão de Capanema para evitar conflitos com os segurados foi a redução dos contratos de seguro, os quais considera “quilométricos”, quando deveriam ter no máximo duas a três páginas. Segundo ele, uma nova redação, em linguagem comum, também facilitaria a solução dos embates. Além disso, ele acredita que deva existir um maior cuidado na aceitação do risco, através de relatórios médicos para o seguro saúde e de vida. “Na hora de receber os prêmios acredita-se em tudo. Na hora de pagar, não”.
Outra providência que deve ser tomada pelas seguradoras é treinar os agentes para que eles não “prometam mundos e fundos aos segurados por conta das metas que têm a cumprir”. E, por fim, as seguradoras devem prestigiar os escritórios de advocacia especializados, como o Pellon & Associados Advocacia Empresarial:
“É muito mais fácil para o juiz julgar quando o advogado sabe o que está dizendo. Quando os advogados nos fornecem jurisprudência facilita enormemente”.
O sócio-fundador do escritório Pellon & Associados Advocacia Empresarial, Luis Felipe Pellon, terminou o encontro agradecendo ao palestrante e afirmando que “estes novos tempos nos animam e nos preocupam, porque vamos passar por uma nova fase de transição e teremos que nos adaptar”.
“Estamos preocupados com a formação dos juízes, porque existe uma grande diversidade de posições na primeira instância que deverá ser mudada. A segunda instância vai passar a ser o fiel da balança, vai dar um direcionamento, porque o discricionismo do juiz tem que ser pautado. A formação do juiz é diferente em cada Estado. E, por outro lado, a segunda instância está perdendo bons desembargadores, que estão se aposentando num momento importante. É muito complicado quando um contrato é interpretado em seus conflitos de maneira muito diversa, não só por juízes do mesmo Estado como de estados diferentes. Os contratos de massa devem ter um entendimento básico. A questão do exame médico é igualmente interessante. Hoje em dia, há um grande temor de que o exame de saúde ofenda a personalidade. Ficamos numa situação em que não sabemos como resolver isso”, concluiu.

Fonte: Monitor Mercantil

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