O papel de cada um no gerenciamento de riscos
Todas as pessoas podem ser agentes de mudança no gerenciamento de risco das empresas onde trabalham e talvez não saibam disso. Lendo o recente artigo Por que gerenciar riscos?, de Berenice Areias, publicado neste site, senti necessidade de desenvolver o tema no âmbito dos processos organizacionais, de modo a contribuir para o fomento e a disseminação da cultura de gerenciamento de riscos através da tentativa de desmistificar seu modus operandi, principalmente no que diz respeito ao risco operacional inerente ao funcionamento de qualquer organização. Quando se fala em risco operacional deve-se pensar na organização como um todo, ou seja, seus processos, procedimentos, normas e rotinas – o modo como toda e qualquer atividade ou tarefa é executada, em qualquer nível ou área da organização, seja, na recepção de um cliente, na elaboração e publicação de um comunicado interno, na concessão de um empréstimo ou na contratação de um seguro. A mudança é de paradigma e implica em olhar a interdependência dos meios e controlá-los para minimizar os prováveis eventos finais indesejáveis, reduzindo deste modo os custos de inspeção e aumentando a receita pela aceitação de novos tipos de riscos, dado que os processos encontram-se controlados. A dificuldade na implantação da cultura de gerenciamento de riscos reside na necessidade de se criarem mecanismos de controle em graus de maturidade compatíveis com o risco. E encontrar a dose certa de “apetite de risco” que se quer correr em uma organização não é tarefa simples, pois há uma tendência em se passar do “controle frouxo” para o “controle apertado”, o que, à primeira vista, leva a uma percepção de engessamento do fazer diário. No entanto, se a organização é capaz de transmitir a finalidade para a qual os controles são necessários e como os ganhos obtidos revertem para os públicos envolvidos – clientes, empregados, acionistas, parceiros comerciais – fica claro para qualquer um o modo como os riscos se propagam e são transferidos na cadeia produtiva, e como eles acabam, por fim, influenciando na economia de mercado. Conforme colocou Berenice, se olharmos para nossas rotinas pessoais, a cultura de gerenciamento de riscos e controles está na essência do ser humano, na sua luta pela economia de esforços, pela proteção contra os perigos e pela sobrevivência. Ao escolher um caminho, rua ou avenida para ir ao trabalho e retornar ao lar, dentro de um trajeto que possui trechos perigosos, identificamos os “pontos de risco” e adotamos “controles” em nosso roteiro, tais como conhecer vias alternativas, atentar para opções de saída e regular horários. À medida que repetimos esta tarefa, vamos experimentando a freqüência e a probabilidade de ocorrência dos eventos, obtendo uma percepção mais aproximada do risco real. Aí está a chave da questão, pois, como o risco muda, somente a partir da experimentação freqüente é possível decidir se os controles serão mais relaxados ou rigorosos para mitigar os riscos identificados, porque é nesse momento que se consegue definir um patamar adequado para a sua implementação. No dia-a-dia das organizações, se conseguimos esquematizar ou desenhar as nossas rotinas e processos e identificar neles quais atividades ou tarefas, uma vez controladas, evitarão a ocorrência de eventos indesejáveis no final da cadeia, estamos aptos a identificar os controles, implantá-los e “experimentá-los”. Após a experimentação, periodicamente, é possível ajustá-los segundo a freqüência de ocorrência. Isso é simples de fazer, mas requer de cada indivíduo o exercício de pensar a cadeia fim-a-fim, identificando a interdependência entre o seu trabalho e como ele é afetado pelas áreas internas fornecedoras; como ele afeta as áreas internas clientes; como ele afeta o produto ou serviço que está sendo entregue para o cliente. Se este produto ou serviço consome recursos da organização de forma desnecessária poderá estar impactando negativamente no EVA e colocando em risco sua sobrevivência. Ou seja, os riscos que ameaçam uma organização ameaça indiretamente todos os públicos envolvidos – acionistas, empregados, clientes e parceiros comerciais – pela interdependência que aquela tem com o mercado e com as economias local e global em que subsiste. Como fazer isso? Retomando a capacidade, que cada um de nós tem, de fazer escolhas e avaliar o impacto ou o resultado de nossas ações. A evolução tecnológica, ao aumentar a complexidade das interações e o distanciamento do “saber fazer” pela interposição de equipamentos e tecnologias de sistemas, fez com que, sem que percebêssemos, passássemos a olhar o mundo como uma máquina, criado por outra pessoa e não por nós próprios. Por exemplo, um técnico de uma linha de fabricação de aviões é capaz de fazer uma peça essencial para o seu funcionamento, mas não chega sozinho ao produto final. O problema não é a especialização em si, mas a perda da visão geral, que pode ser resgatada. Para fazer face a isto é necessário estar aberto às percepções sobre o que acontece à volta, refletir e decidir sobre o que efetivamente importa. Uma outra forma de desenvolver o raciocínio sistêmico consiste em pensar sobre o presente para poder pensar sobre o futuro enquanto possibilidades e riscos, pois é no presente que atuamos como agentes da criação do futuro. Por analogia, o presente é tal qual os processos e rotinas de nossas empresas, como eles transcorrem, e é onde podemos interferir, pela análise não apenas de como estão definidos, mas como e porque eles foram assim definidos, permitindo a identificação clara do que é preciso controlar e da forma como fazê-lo para que, em lugar de “evento incerto futuro” se tenha “resultado desejado certo futuro”. Fomentar uma cultura de gerenciamento de riscos é, portanto, exercitar a reflexão sobre a relação de causa-efeito pela consciência de que “o risco é o futuro” e “o controle é o presente” e, na trajetória entre um e outro, estamos nós, indivíduos, atuando como agentes responsáveis pelo resultado.