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O Dever de Casa da Cidade Inteligente

“Smart Cities” são aquelas que usam de forma inteligente, inovadora, criativa, sustentável e eficiente os recursos disponíveis e quando eles não são suficientes criam ferramentas para otimizar seu uso, ou criam novos recursos, quebrando paradigmas, questionando verdades urbanísticas e revendo processos estabelecidos e fazem isso integrando novos conceitos de tecnologia de informação, automação e comunicação, ferramentas digitais e smart computing aplicadas em todos os segmentos da gestão municipal. O objetivo final é sempre ser mais eficiente e elevar de forma sustentável a qualidade de vida de quem está na cidade. A “Smart City” busca ser permanentemente um lugar melhor para se viver, criar os filhos, trabalhar, empreender, se divertir, investir, visitar e envelhecer.

Para estar preparada para se beneficiar com todas as possbilidades que os avanços tecnológicos podem oferecer, inclusive aquelas trazidas pela nova revolução industrial em curso, “Revolução 4.0″, é preciso primeiro organizar a casa. Planejamento urbano, governança inteligente, práticas amplas de sustentabilidade, introdução de tecnologia em todos os processos e busca pelo uso pleno da cidade.

Governança inteligente que promova as transformações necessárias, quebre paradigmas, questione verdades urbanísticas, reveja processos consolidados e busque soluções simples.

Que privilegie o uso estratégico, inovador, inteligente, sustentável e eficiente da infraestrutura instalada na cidade e dos recursos disponíveis, inclusive econômico, energia, capital humano, e serviços de informação e comunicação, sempre com a preocupação de se fazer mais com menos e de maneira ágil.

Que assuma verdadeiramente o protagonismo dos temas locais, persiga a autonomia na geração de receita e captação de recursos para investimentos, e defina ações de estado de médio e longo prazos, com criação de mecanismos de proteção contra efeitos deletérios do ciclo político eleitoral. Autonomia Financeira significa Independência Administrativa. Governança que compreenda a importância do comprometimento e participação da sociedade na definição dos temas prioritários, desde a elaboração do planejamento estratégico e orçamento até os mecanismos de controle e supervisão da gestão (Gestão Participativa).

Que persiga a redução extrema da burocracia com o objetivo de facilitar o empreendedorismo e a atividade empresarial, reduza a estrutura municipal e privilegie investimentos privados por meio das parcerias púbico privadas lato sensu como adoções, autorizações, permissões, concessões e demais formas de delegação (Serviços Públicos Não Estatais). Que estabeleça sistema de transparência dos atos governamentais, prestação de contas e responsabilização (Accountability). Que valorize a cooperação e conexão intermunicipal e a visão indispensável da governança metropolitana (Estatuto da Metrópole).

Que construa permanentemente uma base de dados da cidade, conectados em rede (“data-driven networking urbanism”), alimentada de forma dinâmica com a participação da sociedade, capaz de produzir indicadores específicos e cujas informações possam ser partilhadas pelo mercado e cidadãos. Que estabeleça metas com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Planejamento Urbano que seja fundamentado em Plano Diretor Participativo e revisado em períodos mais curtos (hoje o PDP é decenal com revisão quinquenal).

Que utilize as ferramentas elencadas no Estatuto da Cidade. Que busque o adensamento e mais o uso misto, através do desenvolvimento de centros urbanos autônomos (Centralidades) capazes de oferecer serviços, mercadorias e empregos para a população residente na região, com o objetivo de incentivar a economia local, reduzir a circulação diária de pessoas no movimento pendular de ida e volta do trabalho. Que tenha a clara percepção de que o ideal é otimizar o uso da “cidade” já construída, evitando o espraiamento e investimento desnecessário em mais infraestrutura urbana.

Que prescreva legislação edilícia que normatize apenas a volumetria das edifcações, abrindo espaço para as soluções arquitetônicas criativas e estimule a construção da cidade na escala das pessoas e para pessoas e não para veiculos. Que assuma que o protagonismo em mobilidade urbana intramunicipal é da prefeitura.

Que estabeleça rede de modais interconectados e hieraquizados conforme sua capacidade de transporte, com horário previsível, preço justo, conforto e segurança. Que entenda a importância da mobilidade ativa que tem inúmeras vantagens como: promoção da saúde, melhor uso das áreas públicas, redução de emissão de gases, socialização das pessoas, economia de recursos. Que ataque o déficit habitacional sob a ótica da construção das centralidades. Favelas e loteamentos irregulares, já naturalmente adensados, podem ter regras de construção flexibilizadas, mas bem definidas, e serem formalizados e incluídos no cadastro de imóveis, tornando-se centros de bairro autônomos, se passível de serem urbanizados.

Que exija que Habitação de Interesse Social seja política de estado permanente (e não de governo) com fundo municipal, plano de habitação, agência e conselho e o mercado seja incentivado a investir no segmento.

Práticas amplas de sustentabilidade amparadas nas três vertentes, econômica, social e ambiental, de maneira interligada de modo que o equilíbrio de uma não seja possível sem o apoio das demais. Que contemplem a percepção de que o desenvolvimento econômico deve ser suficiente para implementar os projetos de transformação permanente da cidade, com uso eficiente dos recursos disponíveis, inclusive na erradicação da pobreza e nas medidas que facilitem a mobilidade social, dando maior dinamismo à cidade. Que incentivem práticas de mercado comprometidas com o equilíbrio econômico, social e ambiental por uma questão de consciência, mas também por saber que o desenvolvimento econômico do todo depende da decisão individual e em última análise porque o consumidor privilegiará a escolha dos seus produtos.

Que valorizem novas práticas de consumo para que não haja produção de lixo excessivo nem desperdícios. Que considerem como investimento e não como despesa a coleta seletiva e toda a rede de ações derivadas do reaproveitamento do lixo até que se torne uma atividade lucrativa e a sociedade atribua valor às melhores práticas de consumo e ao melhor aproveitamento do resíduo produzido. Que asumam o protagonismo no saneamento. Como tema local o município é o responsável pela gestão do lixo, coleta e tratamento de esgoto e captação, tratamento e distribuição de água. A prefeitura poderá delegar a execução, mas não deixar de participar do planejamento e fiscalização dos serviços prestados.

Que estabeleçam como meta a universalidade da coleta e tratamento do esgoto, avanço imprescindível numa cidade inteligente e melhor forma de promover saúde e proteger os mananciais, praias, rios e lagoas.

Tecnologia aplicada em todos os processos. Inovação e criatividade num ambiente inicialmente de “Web 2.0” e contexto de “Smart Computing” buscando a criação de ferramentas digitais de informação e comunicação para reduzir obstáculos da burocracia e acelerar a solução para os problemas da administração da cidade, segurança pública, mobilidade e transporte, educação básica, promoção e assistência à saúde, edifícios públicos, preservação de áreas verdes e mananciais, tornando os serviços mais inteligentes, interconectados e eficientes.

Que se crie Centros de Controle e Monitoramento da Cidade alimentados por informação geradas por câmeras e municiados por aplicativos colaborativos de interação com a sociedade, uso de software de reconhecimento facial e plataformas e aplicativos de comunicação da população, com o objetivo principal de fundamentar ações em mobilidade urbana, prevenção de desastres e segurança pública. Precisamos de preparação gradual para o uso de inteligência artificial, internet das coisas e “cloud computing” de maneira integrada e interativa.

Necessitamos uso pleno da cidade porque não deve existir território urbano que não se possa visitar, esta é a “Livre Circulação”. Que a cidade seja universal (Desenho Universal) e construída para todas as pessoas (Acessibilidade Total). Que todo morador sinta que a cidade também é sua, ou seja, “Pertencimento”.

Que seja integrada por opções de mobilidade ativa, como rotas acessíveis e plano cicloviário, por transporte público ágil e com preços justos. Que o tempo de deslocamento de casa para o trabalho e retorno seja reduzido para que haja momentos para lazer e atividades culturais (Qualidade de Vida). Que os alunos possam receber educação integral e não necessariamente escola integral, pois o currículo básico pode ser complementado com atividades esportivas e culturais fora do ambiente escolar em equipamentos públicos muitas vezes pouco aproveitados (Apropriação da Cidade).

Que o município assuma definitivamente seu importante papel em segurança pública e contribua para que o cidadão possa circular sem medo de sofrer violência (Polícia Municipal). Que se ocupe, de forma sustentável, tendo preservados direito ao sossego, áreas públicas com atividades econômicas, esportivas e culturais compatíveis, para que haja maior construção de conexões entre as pessoas (Socialização).

Essa “Smart City” do futuro, que no presente fez seu dever de casa, como descrevemos acima, estará pronta para receber a chamada “Revolução 4.0” que promoverá a interoperabilidade, que é a comunicação entre máquinas, sistemas, dispositivos e pessoas e a integração de tecnologias de ponta.

A cidade inteligente utilizará em sua administração a Inteligência Artificial (planejamento, tomada de decisão e controle por máquinas) que, em conjunto com a Internet das Coisas (internet integrada a ferramentas, equipamentos, instrumentos) e o “Cloud Computing” (um super serviço de armazenamento de dados), vai agilizar e transformar toda a cadeia de serviços de uma cidade. Esses sistemas com inteligência artificial e com total conexão e interação entre seus componentes e alimentado com as demandas permanentes da sociedade terá autonomia na tomada de decisões simples e descentralizadas com maior rapidez e percentual de acerto. Um futuro que gera ansiedade pela imprevisibilidade do que virá até no curto prazo, mas que, por outro lado, permitirá que vivenciemos grandes transformações positivas do mundo como o conhecemos hoje em dia.

 

Fonte: Alexandre Arraes, colunista da Revista Plurale

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