Mudança climática traz negócios ao setor
Todo risco tem um preço. Quando o preço não justifica a compra, se busca investidores dispostos a apostar na desgraça. Sinteticamente, é assim que a indústria de seguros tem desenvolvido produtos para atender à demanda criada com as incertezas trazidas pelo mundo moderno, como as mudanças climáticas. Este é o pano de fundo que será apresentado no seminário “Mudanças Climáticas e Seguro”, promovido pela Escola Nacional de Seguros (Funenseg), nesta terça-feira, no Rio de Janeiro.
Os danos causados por eventos da natureza têm aumentado em grande proporção, potencializando a insegurança de segurados e seguradores. “Há investidor para tudo. O que as seguradoras não suportam, passam para investidores com apetite por riscos. Se o pior acontecer, perdem. Se não acontecer, ganham”, diz Gustavo Cunha Mello, professor da Funenseg e sócio Correcta Seguros, palestrante do evento.
Segundo ele, a indústria de seguros conta hoje basicamente três efeitos. Primeiro, diz o executivo, é a evolução das despesas com catástrofes naturais. Apesar das discussões sobre a causa do aumento de eventos como terremotos, tufões, inundações serem causados pelo aquecimento global ou não, o fato é que a incidência dessas catástrofes aumentou muito. De 1970 a 2007, o volume de indenização cresceu a uma taxa de 12% ao ano em termos nominais e 7% em real, diz Mello, citando um estudo da Swiss Re.
2005 trouxe perdas recordes, com cinco furacões nos Estados Unidos. Eles causaram US$ 230 bilhões em perdas para a economia, sendo que US$ 83 bilhões foram indenizados pelas seguradoras em danos materiais, pessoais e paralisação das empresas. “Mas em 2007, boa parte dos custos é com alagamento, furacão, tempestades tropicais e o incêndio na Califórnia, eventos onde se torna clara as conseqüências da mudança no clima”, diz.
Segundo Mello, o segundo impacto das mudanças climáticas ao setor vem da regulamentação ambiental mais rígida na Europa para tentar minimizar os danos causados ao ambiente. Primeiro foi o Protocolo de Kyoto, ratificado há 11 anos. Ele determina que os países que o assinaram têm de minimizar suas emissões em 5,2% entre 2008 e 2012. A nova legislação européia, em vigor desde abril de 2007, determina em 8%. O protocolo de Kyoto criou o certificado de crédito de carbono – um título emitido por um órgão da Organização das Nações Unidas (ONU) por uma empresa que evita lançar gases no ar e que pode ser vendido para uma que polui muito e não atingiu a meta estabelecida pelo acordo. Só em 2007 o crédito de carbono movimentou US$ 67 bilhões, segundo dados do Banco Mundial.
Já a lei européia criou títulos de permissão de poluir, ao contrário do crédito de carbono, conhecidos como “allowance”, que devem movimentar neste ano EUR 45 bilhões. Assim, as empresas tem três alternativas: reduzir a emissão, comprar crédito de carbono ou “allowance”. “Se a empresa estourar o limite e o governo não der novos limites, a fábrica pode ser fechada. E isso impacta a indústria de seguro, pois ela terá de indenizar o prejuízo causado pela paralisação”, explica Mello.
Um mercado novo para as seguradoras é na área de seguro garantia, uma vez que a empresa terá de cumprir o acordo para reduzir a emissão, seja comprando um crédito de carbono, seja protegendo uma área. “Aqui temos outro seguro: o de proteger essa área de plantio”, diz. Caso a aconteça uma queimada ou a empresa não cumpra o contrato, em vez de ser punido com a paralisação, ter de comprar mais crédito de carbono ou mais títulos de permissão de poluir, pode comprar um seguro de garantia. “É um mercado que pode vir a ser atuante aqui também”, diz.
O terceiro aspecto abordado por Mello é a responsabilidade civil. O seguro ambiental, explica, deverá crescer no Brasil com a abertura do resseguro. Este seguro não cobre multas, cujos valores determinados pela justiça têm sido cada dia mais elevados. Cobre despesas com a limpeza e reparação do dano causado, além de proteger o patrimônio de diretores processados por poluir o ambiente.
Hoje praticamente a Unibanco AIG é quem opera com este produto. “Mas empresas como Zurich e XL operam mundialmente e com a abertura do resseguro é possível comprar no exterior uma cobertura que não se encontra no País pelo preço e condições competitivas”, diz Mello.
O mercado internacional está num bom momento. “Antes só quem era poluidor queria fazer o seguro. Agora, com o avanço da legislação ambiental, principalmente na Europa, todas as empresas buscam proteção para minimizar perdas que possam vir a ter diante de uma lei com penalidades mais rigorosa”, acrescenta o professor. Com o aumento da demanda pelo seguro ambiental, novas seguradoras passaram a se interessar por danos ambientais e a concorrência ajuda a reduzir o preço para o consumidor.
Arbitragem no seguro
A Funenseg promove em parceria com a Susep no dias 13 (no Rio) e 14 (em São Paulo) um encontro sobre arbitragem no seguro e no resseguro. “O uso da arbitragem no seguro e resseguro ainda está muito restrito às empresas do setor, que já vêm utilizando esta ferramenta há bastante tempo”, avalia Moacyr Lamha, procurador-geral da autarquia.
Fonte: Gazeta Mercantil