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Juros: BC evitou ainda mais se comprometer com fim do ciclo

A Selic deve cair a 7% até o fim do ano e se manter nesse patamar ao longo de 2018, prevê Paulo Gala, diretor-geral da Fator Administração de Recursos, baseado na sinalização dada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) no comunicado da decisão de ontem. Para o executivo, ainda há efeito positivo do juro baixo a ser observado na economia, o que tende a manter a atratividade do mercado de ações.

O colegiado do Banco Central reduziu a Selic em 0,75 ponto percentual, para 7,50% ao ano. Ao lembrar o fato de o Copom ter excluído a expressão “encerramento gradual do ciclo”, Gala não descarta que o mercado possa incrementar apostas de redução do juro no começo de 2018. Mas ressalva que o BC aparentemente buscou não se prender a indicações, deixando as decisões ainda mais em aberto.

O executivo não vê o Câmbio como risco primordial para a manutenção da Selic em patamar mais baixo e acredita que o mercado de ações pode ser beneficiado mesmo após o fim do ciclo de queda de Juros, contanto que os prêmios de risco na curva de DI diminuam e a retomada econômica se consolide. Veja a seguir trechos da entrevista.

Valor: Que sinal o Copom deu no comunicado? A taxa Selic cairá abaixo de 7%?

Paulo Gala: Acho que o colegiado do BC emitiu um recado completamente dentro do esperado. A indicação de moderação do ritmo de corte foi mantida – ou seja, a redução em dezembro deverá ser de 0,50 ponto percentual. Um ponto que me chamou atenção, porém, foi o BC ter retirado a menção sobre “encerramento gradual do ciclo”, que sugeria como ele terminaria o processo de queda da Selic. Ao excluir essa referência, penso que o BC evitou ainda mais se comprometer com o término do ciclo.

Valor: Mas a exclusão dessa referência pode alimentar especulações sobre mais corte de Juros no primeiro trimestre de 2018?

Gala: Isso pode acontecer, e provavelmente quem apostar nessa direção vai se basear no fato de as projeções de inflação do Copom para 2018 (4,3%) e 2019 (4,2%) estarem abaixo do centro da meta para esses anos. Mas eu prefiro dizer que o BC deixou a sinalização ainda mais em aberto. O único compromisso aparente assumido pelo Copom é o de arrefecer a magnitude dos cortes de Juros. Esse é o recado mais claro. E ao fazer isso, o BC brasileiro segue a cartilha dos principais BCs do mundo, que é a de evitar se prender a uma decisão específica. O cenário pode mudar rapidamente, para um lado ou para o outro.

Valor: O senhor se refere a que exatamente?

Gala: O BC repetiu no comunicado a importância das “reformas” – que entendo principalmente como a Reforma da Previdência – e o efeito sobre prêmios de risco. Ou seja, mesmo que a reforma não venha no ano que vem, ainda é possível o juro cair, se a inflação assim permitir. É apenas um exemplo, mas serve para ilustrar que, se o exterior continuar benigno, se o Câmbio se mantiver comportado e a economia se recuperar de forma apenas gradual, o juro terá espaço para cair ainda que o cenário esperado para a Reforma da Previdência não se materialize ano que vem.

Valor: O que mais irá definir os próximos passos da política monetária?

Gala: Eu diria que o cenário interno está dado. Então resta o plano externo. E o que vem atraindo atenção tanto do mercado quanto dos Bancos Centrais é quem comandará o Fed depois do atual mandato de Janet Yellen. A Yellen continua com chance razoável de ser reeleita, mas se Kevin Warsh (ex-governador do Fed) for o escolhido, então haveria uma mudança na configuração externa, uma vez que ele é tido como mais “hawkish”. Tudo que mexe com expectativas de Juros nos EUA é um fator que o BC brasileiro olha atentamente, e nesse sentido o plano fiscal de Trump também é algo cujo desenrolar pode alterar os planos da nossa política monetária.

Valor: Em meio a esses fatores externos, o dólar voltou a ganhar força no mundo, inclusive no Brasil. Em que medida o Câmbio pode atrapalhar a queda e a manutenção do juro em patamar mais baixo?

Gala: Acho pouco provável um risco material vindo do Câmbio. Primeiro porque nossas contas externas estão robustas, com uma balança comercial que tem superávit de quase US$ 60 bilhões no ano e investimento direto de mais de US$ 80 bilhões (em 12 meses). Isso quer dizer que simplesmente não existe quadro de restrição externa para o Brasil em 2018. E mesmo considerando um cenário alternativo mais extremo, não acredito que o dólar passaria de R$ 3,50. Uma desvalorização do real dessa ordem, de 7%, mesmo 10%, não chega a ser inflacionária. Isso porque o “pass through” (repasse cambial a preços) está mais baixo, devido à conjuntura de recuperação lenta, grande ociosidade na capacidade instalada da indústria, desemprego elevado… Para o Câmbio se tornar inflacionário precisaríamos estar mais próximo de um quadro de juro dos Treasuries (de dez anos) perto de 3%, junto com o desemprego no Brasil em queda surpreendente, o que não parece razoável neste momento.

Valor: Há um tempo se comenta sobre os efeitos positivos do juro baixo sobre o mercado de ações. Com a aproximação do fim do ciclo de afrouxamento monetário, a bolsa pode perder impulso?

Gala: Mesmo que o juro pare de cair, a bolsa ainda pode se beneficiar caso o mercado retire prêmios de risco da parte longa da curva de Juros. Isso indicaria maior convicção numa Selic mais baixa, perto de 7%, por mais tempo, o que por sua vez até elevaria a atratividade do mercado acionário como opção de investimento.

Fonte: Valor

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