Governo amplia poderes punitivos da CVM e do BC
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e o Banco Central (BC) tiveram seus poderes punitivos ampliados com a edição de medida provisória (MP) assinada ontem pelo presidente Michel Temer. Parada desde 2015 na Casa Civil, a MP avançou na esteira da delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Desde que as delações do controladores da JBS vieram à tona, as conversas entre os órgãos reguladores e o Planalto se intensificaram, conforme fonte diretamente envolvida nas discussões.
A MP multiplica por cem o teto das multas que a CVM, órgão regulador e fiscalizador do mercado de capitais, pode aplicar – o limite saltou de R$ 500 mil para R$ 500 milhões. Alternativamente, a autarquia poderá aplicar pena de até duas vezes o ganho obtido com atuação irregular ou até 20% do faturamento do grupo econômico.
A edição da medida está diretamente relacionada às investigações em andamento para averiguar se a JBS e seus controladores cometeram crime de “insider trading” com as transações de compra de dólar futuro e de venda de ações, antes da divulgação do conteúdo da delação dos Batista.
No caso do BC, que regula e fiscaliza as instituições financeiras, o valor máximo das multas aplicadas ficou 8 mil vezes maior: saiu de R$ 250 mil para R$ 2 bilhões.
O total que a CVM poderá cobrar em suas condenações daqui para frente é superior às multas previstas no acordo dos Batista. O Ministério Público Federal (MPF) determinou que Joesley e Wesley paguem R$ 110 milhões, cada um, em dez parcelas mensais, a partir de junho de 2018. Essa foi a única a pena dos irmãos instituída pelo MPF, pois foi acordado que eles não cumprirão nenhum tipo de reclusão – o que fez os acordos de colaboração ficarem conhecidos como “ultrapremiadas”.
As novas penas que os reguladores podem aplicar já estavam definidas em 2015, conforme reportagem publicada pelo Valor em outubro daquele ano. Faltava só a assinatura presidencial. Também já havia previsão de sobre para acordos de leniência nessas instituições. O conjunto de leis até então vigentes tinha mais de 50 anos.
Durante esses dois anos em que não avançou, o projeto enfrentou oposição no governo, conforme apurou o Valor. A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega são investigados em processos ligados aos atos de corrupção praticados na Petrobras – ambos são ex-conselheiros da estatal.
O principal inquérito na CVM sobre a JBS se deve a operações com derivativos cambiais no pregão anterior à divulgação de informações sobre a gravação feita por Joesley Batista durante conversa com Michel Temer, antecipadas pelo jornal “O Globo”. No dia seguinte, por causa da disparada do dólar, o ganho potencial com a posição chegou a R$ 700 milhões. A JBS alegou que transações no mercado de câmbio são triviais na gestão de suas finanças. Além dos contratos de dólar, consta da investigação vendas de R$ 330 milhões em ações do frigorífico pelo controladores, após ao menos um ano sem alterarem suas posições.
A CVM tem mais outros dez processos administrativos envolvendo a companhia e seus controladores em andamento.
No caso do BC, a modernização do processo administrativo é uma das ações prometidas pelo presidente Ilan Goldfajn e está dentro da “Agenda BC mais”. A edição da MP acontece um dia após Ilan se encontrar com Temer no Planalto.
Com a nova regra, o BC também conseguir uniformizar parâmetros para aplicação de diferentes penalidades aos vários segmentos supervisionados – bancos, corretoras, financeiras, consórcios e as empresas de cartão de crédito. A medida ainda amplia poderes afastar administradores, auditores independentes e pessoas jurídicas que prestem serviços aos investigados. O órgão poderá até exigir informações sob pena de multa.
A MP estabelece que as multas aplicadas pelo BC e pela CVM vão alimentar, respectivamente, o recém-criado Fundo de Desenvolvimento do Sistema Financeiro Nacional e Inclusão Financeira e o Fundo de Desenvolvimento do Mercado de Valores Mobiliários, instituído com a medida – cuja gestão será da autarquia.
Fonte: Valor
