Financiamento ou carro por assinatura: qual é a melhor opção?
A pandemia de coronavírus vem transformando hábitos e comportamentos. Com a quarentena e o isolamento social para grande parte da população, comprar um carro ou mesmo trocar de modelo passou a ser uma decisão tomada com mais cautela ou em alguns casos foi deixada para depois com receio de dívidas em um momento de incertezas.
Quem estava pensando em comprar um carro, agora em home office passou a considerar também outras alternativas, como o serviço de assinatura de veículos, em que você paga uma taxa fixa por mês para utilizar o carro de uma locadora, ficando responsável apenas pelo custo de abastecimento — seguro, imposto e manutenção ficam a cargo da empresa que você contratou o serviço.
Embora a dinâmica do setor automotivo esteja mudando, a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) ainda prevê um crescimento de 15% nas vendas de totais veículos de todas as categorias em 2021 no Brasil, na comparação com 2020. A produção, porém, chegou a cair 99% no ano passado, e foi se recuperando ao longo do segundo semestre.
O InfoMoney consultou especialistas do setor para entender os prós e contras das duas alternativas, o financiamento de um veículo e o serviço de assinatura com uma locadora: quando eles valem a pena?
Com algumas fábricas ainda fechadas e falta de peças afetando toda a cadeia de produção automotiva no país, os preços dos carros novos e seminovos vêm aumentando: há uma demanda por aquisição de carros, mas uma oferta baixa de carros zero quilômetro devido, principalmente, aos problemas logísticos, além da pandemia.
Como consequência da falta de carros novos, as pessoas vão em busca de modelos seminovos, inflando as buscas pelo segmento e os preços também sobem. O InfoMoney detalhou os motivos desse efeito nos preços em reportagem recente.
Há um consenso que os preços dos carros atualmente estão mais altos do que o observado nos últimos meses. “Toda dificuldade que as montadoras estão enfrentando com a falta de peças, especialmente semicondutores, está inflando os preços, já que ainda há uma demanda por parte do público consumidor”, afirma Antonio Jorge Martins, diretor e coordenador acadêmico executivo da FGV.
De fato, segundo a Fenabrave, entidade que representa as associações de veículos, a venda de veículos novos (automóveis e comerciais leves) no acumulado de 2021 até abril apresentou uma alta de 13,3% na comparação com o mesmo período do ano passado — vale lembrar que a pandemia teve início em março e se agravou em abril de 2020.
Considerando o recorte de seminovos (automóveis e comerciais leves), a alta no mesmo período foi ainda mais significativa, de 40,3% na comparação com os primeiros quatro meses de 2020.
Martins entende que a normalização da produção deve acontecer no segundo semestre. “O setor automotivo enfrenta um momento difícil e que pode perdurar por mais meses. O panorama segue o mesmo que já vínhamos observando: faltam peças essenciais, ainda são necessários fechamentos temporários de algumas fábricas, uma preocupação com a retomada da economia em meio à pandemia. O desempenho em termos de produção está comprometido. Espero uma recuperação no segundo semestre, mas dependemos de vários fatores – como as fábricas no exterior, para a normalização da produção”, explica.
De qualquer maneira, ele entende que esse ritmo de alta nos preços vai reduzir à medida que a normalização nas fábricas acontecer porque a oferta de veículos vai aumentar e vai se adequar melhor à demanda. Assim, segundo Martins, “se o consumidor não tem urgência para adquirir um carro, vale esperar um pouco pra comprar”.
Milad Kalume Neto, diretor de novos negócios, da consultoria automotiva Jato Dynamics, também entende que os preços dos carros vêm aumentando, o que é um ponto de alerta para o consumidor que considera financiar um carro nesse momento. Porém, ele acredita que uma redução significativa nos preços não está no horizonte.
“Dificilmente as montadoras vão reduzir os preços justamente diante desse cenário. Com tantos meses difíceis que já passaram, e que ainda vão vir por causa da crise causada pela pandemia, não vejo uma redução de preços significativa o suficiente para que o consumidor aposte todas as fichas nisso. A recomendação é se organizar e se planejar se pretende comprar um carro, e levar em conta um novo cenário com preços mais altos do que vimos meses atrás”, pontua.
O modelo de carro por assinatura, também conhecido por carsharing, é novo no Brasil e vem se consolidando nos últimos dois anos. Na prática, funciona como um aluguel de longo prazo. Em vez de comprar o carro, o consumidor aluga por um, dois ou mesmo três anos o modelo e no fim do contrato devolve o carro podendo renovar a assinatura com o mesmo modelo ou outro. Em alguns casos é possível comprar o modelo ao fim do contrato.
Muitos países ao redor do mundo já contam com essa modalidade há mais tempo e no Brasil montadoras como Fiat, Jeep, Volkswagen, Renault, Caoa Cherry, e locadoras como Movida, Localiza, Unidas já possuem a opção ofertada aos clientes.
Das nove montadoras com a maior participação de mercado, divulgadas pela Fenabrave, Chevrolet, Hyundai, Honda e Nissan não possuem serviços desse tipo no país, por enquanto.
De fato, o mercado de assinatura nesse modelo ainda é incipiente no Brasil. Ainda há algumas limitações de veículos específicos, versões, quilometragem, tempo de contrato. Uma reportagem do InfoMoney explica como funciona essa modalidade. Mas a verdade é que o interesse das montadoras nesse segmento vem aumentando.
“Na prática, a montadora vê a assinatura como mais uma fonte de receita. É mais um braço de negócio. E vai trazer mais concorrência ao setor, já que as locadoras também estão dentro desse segmento de assinatura. Há uma tendência de disputa pelos melhores preços para atrair o cliente. Essa nova dinâmica entre montadora e locadora pode se tornar atrativa”, diz. Nesse sentido, Martins entende que o segmento de carros por assinatura, embora ainda esteja começando, deve funcionar bem no Brasil.
Ana Renata, diretora geral da Cox Automotive, grupo dono da Kelley Blue Book (KBB), consultoria automotiva, acrescenta que o segmento por assinatura atende perfis diferentes ao público do financiamento. “Essas modalidades não vão se canibalizar entre si. Esses modelos vão conviver no mercado brasileiro e solidificar seus nichos de clientes. Assim, entendo que o carro por assinatura vem para atender um público que precisa desse tipo de serviço, o que vai consolidar a alternativa no Brasil”, explica a executiva.
Romain Darmon, gerente geral da Renault on Demand, explica que essa foi uma surpresa positiva para o negócio da empresa. “Tínhamos uma preocupação sobre a canibalização entre os segmentos de assinatura e o de compra, porém, isso não vem acontecendo. Os públicos realmente são diferentes, quem assina geralmente são jovens de classe A e B, e quem compra, geralmente, são pessoas mais maduras e em outras fases da vida, com filhos, por exemplo”, diz o executivo.
Para tomar a decisão há alguns aspectos destacados pelos especialistas. Veja:
Perfil do cliente
Segundo Ana, o perfil do consumidor que, se fechar um plano de assinatura faz sentido é majoritariamente: jovens, como destacado pelo executivo da Renault, e pessoas que usam o carro esporadicamente.
“Jovens, a geração Z, e até Y tem mais a cabeça do consumo e não da posse. Então, ter um carro como propriedade não é um desejo. Nesse sentido o carro por assinatura super resolve o problema de locomoção. Além disso, jovens que vão ganhar o primeiro carro, em vez de comprar testa uma assinatura por um ano, por exemplo. Ainda, quem não usa o carro com frequência também não precisa comprar um, como quem não usa para ir e voltar do trabalho todo dia, por exemplo”. Ainda, outro perfil que vejo como potencial para esse mercado é aquela pessoal que já teve carro, vendeu, ficou um tempo sem e agora quer novamente ter um veículo. Antes de comprar novamente, a assinatura pode ser uma saída para se adaptar”, explica.
Do outro lado, Ana pontuou que pessoas que usam o carro diariamente, para longas distâncias devem considerar a compra. “Os planos por assinatura têm limites de quilometragem, vale a pena conferir para evitar ultrapassá-los e arcar com multas. Além disso, muitos consumidores, principalmente quem tem mais de 40 anos ainda têm o senso de propriedade muito forte. Não é regra, consumidores mais jovens também podem pensar assim. Não há problema nenhum o cliente querer ter o carro para si, mas é um público que não tem aderência ao modelo por assinatura”, complementa.
Ela ressalta que o cliente precisa entender a diferença entre comprar e assinar o carro. “Ao comprar, o cliente faz uma aquisição de um bem. Ao fazer a assinatura, está consumindo um serviço de longo prazo, não adquire o carro, nem aluga por um fim de semana. São formatos diferentes”, explica Ana.
Analise seu orçamento
Alan Pereira, professor de finanças da PUC-PR, alerta que embora, na prática, o carro por assinatura tenha menos custos é preciso avaliar se, de fato, o consumidor vai conseguir arcar com esse custo mensal durante um ou dois anos, por exemplo.
“Pensando puramente do aspecto financeiro, ideal é guardar dinheiro e colocar em uma aplicação para que ao longo de três anos, por exemplo, o cidadão tenha como comprar o carro à vista, sem se endividar. Porém, sabemos que na vida real não é assim. As pessoas têm urgências, necessidades e desejos que também motivam as decisões financeiras”, diz.
Guilherme Mariotto, engenheiro de manutenção, está em busca de um novo automóvel, e vem considerando o carro por assinatura. “Meu carro já tem cinco anos e quero trocar. Me mudei para o Pará e na cidade em que estou não tem concessionária que atende meu carro. Por isso, comecei a pesquisar. Como estou me adaptando por aqui, considerei a assinatura a melhor opção, por enquanto. Tudo é perto e vou para o trabalho com o ônibus da empresa. Olhei as opções da Renault On Demand, Localiza, Unidas, entre outras. Achei esse modelo de assinatura prático”, diz.
Mariana Sousa, veterinária que mora em São Paulo, por outro lado, não achou que a opção de modelo por assinatura faria sentido para ela. “Eu pesquisei o plano por assinatura, comparei com os custos do financiamento, fiz algumas simulações online e conversei com pessoas que tinham o serviço. Mas decidi comprar em vez de alugar devido ao preço final. O aluguel seria cerca de R$ 2 mil, mas com a entrada que dei, as parcelas do financiamento, mesmo com a taxa de juro do meu banco, ficariam mais baratas que esse custo mensal do aluguel por assinatura e o carro ainda seria meu no fim. Preferi investir nas parcelas e ter o carro, do que ter que devolver daqui um, dois anos. Sendo meu posso vender depois, por exemplo, mesmo com a depreciação”, conta.
De qualquer maneira, há dicas que podem ajudar o cliente a decidir. Neto, da Jato Dynamics, separou os principais custos de cada modalidade que devem ser levados em consideração. Vale lembrar que cada montadora e locadora tem suas especificidades, então, pode ser que haja algum custo além dos citados, mas de maneira geral, o padrão de mercado tem se mostrado dessa forma.
Fonte: NULL