Falta de regulamentação atrasa a receita da União com óleo do pré-sal
O governo federal esperava obter este ano a primeira receita com a venda do petróleo do campo de Libra que cabe à União. Libra foi o primeiro campo do pré-sal licitado, em 2013, no novo sistema de partilha de produção. O governo previa receita de R$ 768 milhões em 2017 com a venda do óleo e o dinheiro foi considerado no cálculo feito para alcançar a meta fiscal. Em setembro, a previsão foi reduzida para R$ 190 milhões. Por uma série de atrasos, no entanto, não ingressará um único centavo nos cofres do Tesouro neste ano.
Mesmo a receita de R$ 507 milhões com a venda de petróleo do campo de Libra, prevista na proposta orçamentária para 2018, está ameaçada, pois a Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), a estatal responsável pelo gerenciamento do sistema de partilha, ainda não escolheu a empresa que irá comercializar o óleo que caberá à União. Essa indefinição resulta, de acordo com fontes credenciadas do governo, da falta de uma regulamentação clara sobre a venda do óleo da União, o que tem afastado as empresas do setor.
A arrecadação que será obtida com a venda do óleo é importante porque é considerada uma receita primária, ou seja, poderá ser usada para pagar despesas primárias, ajudando, assim, o governo a financiar os seus gastos. O dinheiro arrecadado irá para o Fundo Social, instituído pela Lei 12.351.
De acordo com a lei, os recursos serão usados em programas nas áreas de educação, cultura, esporte, saúde pública, ciência e tecnologia, meio ambiente e mitigação e adaptação às mudanças climáticas. O atraso no ingresso desses recursos agrava o quadro fiscal da União.
O chamado Teste de Longa Duração (TLD) do campo de Libra está atrasado. A previsão inicial era de que ele começaria em julho deste ano, com produção de 30 mil barris de petróleo por dia. Quando estiver operando plenamente, o FPSO (plataforma) Piloto de Libra vai produzir 180 mil barris de óleo e 12 milhões de m3de gás.
Há um desencontro de explicações para o atraso. A primeira razão apontada foi a falha em um equipamento chamado “Umbilical Eletro Hidráulico”, que são mangueiras e cabos elétricos usados para operar equipamentos submersos e monitorar temperatura e pressão dos poços. A Petrobras informou que esse problema já foi superado.
A outra razão seria o pedido de waiver feito pela Petrobras para o não cumprimento do conteúdo local nesta fase de exploração de Libra. O pedido da empresa foi feito em agosto de 2016, mas a Agência Nacional do Petróleo (ANP) só concedeu um waiver parcial no início deste mês – mais de um ano depois.
O diretor-geral da ANP, Décio Oddone, negou que tenha ocorrido atraso na decisão do órgão. “Demorou porque as regras são muito complexas”, disse Oddone ao Valor. “Houve um processo que durou meses e foi judicializado, prova de que o modelo é impraticável em larga escala”, afirmou. “Se não formos capazes de resolver esses problemas continuaremos retardando projetos e prejudicando principalmente a sociedade”, acrescentou.
Oddone lembrou que, no caso de Libra, da renda que sobra depois que investimentos e custos são descontados, 75% correspondem às diferentes participações governamentais, enquanto 25% ficam para as companhias responsáveis pelos projetos. “Assim, a sociedade é a maior prejudicada com os atrasos”, observou. “Por isso, a nossa luta para destravá-los”.
O presidente da PPSA, Ibsen Flores Lima, disse que, de fato, houve atraso na produção. Além disso, ele explicou que o governo definiu, inicialmente, uma estratégia para a comercialização do óleo da União em duas fases. Na primeira, a Petrobras seria o agente comercializador do petróleo e, na fase seguinte, seria feito uma licitação internacional para a escolha do agente. “A Petrobras, no entanto, não manifestou interesse”, disse ao Valor.
Nos bastidores do governo, a história contada diz que em dezembro de 2016, a PPSA baixou uma portaria que criava a figura do agente comercializador. Entre as normas da portaria, de acordo com as fontes, existia a obrigação de que o agente teria de provar que a venda do petróleo da União realizada tinha sido o melhor negócio. A prova seria, é claro, submetida ao Tribunal de Contas da União (TCU). Ou seja, o risco seria todo da empresa que iria vender o óleo. Além disso, o serviço prestado pela empresa seria remunerado com recursos do Orçamento da União. As regras teriam desestimulado a Petrobras, disseram as fontes.
O Ministério de Minas e Energia abriu licitação para contratar um estudo sobre a política de longo prazo para a comercialização do petróleo e do gás pertencentes à União. A consultoria terá 240 dias para entregar o relatório final. O presidente da PPSA informou que não vai esperar a conclusão do estudo para fazer uma licitação internacional para a escolha do agente comercializador, o que será feito no próximo ano. “Mas isso é uma coisa de longo prazo”, observou. No curto prazo, Lima pretende consultar empresas do setor para tentar realizar a venda do óleo.
Quando o governo conseguir resolver os problemas, a União terá uma nova e importante receita. A ANP prevê que apenas com os blocos das 2ª e 3ª rodadas de partilha da produção no pré-sal, que serão licitados no dia 27 deste mês, a União terá uma receita estimada em US$ 35 bilhões, ou algo em torno de R$ 110 bilhões pela cotação de ontem do dólar, ao longo da vida útil dos contratos.
Fonte: Valor