De bailarinas ao capitão Nascimento, vitrines do Recife são só fantasias
Você logo descobrirá que a cor ou o número escolhido está em falta. Em seguida, ouvirá a explicação do vendedor: “É que agora estamos na coleção carnaval”. E não tardará para ele oferecer um sensual traje de enfermeira à advogada que busca um terninho bem comportado.
No mês da folia em Pernambuco, pouco importa se as cores do verão são o cinza e o amarelo ou se as estampas geométricas estão em alta. O que toma conta das vitrines são as fantasias de carnaval. Lá estão desde as tradicionais roupas de bailarina e palhaço até, para quem realmente quiser ficar na moda, novidades como as vestes do capitão Nascimento, personagem principal de “Tropa de Elite”, filme nacional campeão de bilheteria no ano passado.
Pode parecer estranho para quem mora fora do Recife que as fantasias roubem as araras das roupas “normais” e não sejam vendidas apenas em lojas de artigos para festas. Mas basta brincar um carnaval na cidade para entender. Atrás dos cerca de mil blocos que saem pelas ruas recifenses e pelas ladeiras de Olinda vão hordas de milhares de foliões, quase todos fantasiados, brincando ao som do frevo, do maracatu e do afoxé. Então, por que não transformar esse costume em um negócio?
Foi o que o casal Márcia Lima e Clezinho Santos, fundadores da grife pernambucana Período Fértil, fez. A pedagoga e o engenheiro mecânico começaram criando suas próprias fantasias. Um colega gostou, pediu para eles bolarem um modelito e, quando viram, já estavam vestindo o amigo do amigo do amigo. Por isso abriram uma loja há 15 anos.
Hoje, além das fantasias, eles fazem e vendem roupas do dia-a-dia. Mas o sucesso da moda carnaval perdura. “Vendemos tão bem em fevereiro quanto no Natal”, explica Márcia, que comercializa 600 figurinos na festa do rei Momo.
Para outros varejistas, comercializar fantasias é uma forma de fugir da entressafra de vendas. “Em fevereiro, as pessoas estão sem dinheiro. Já saíram de férias, estão cheias de contas a pagar e ainda precisam comprar o material escolar. A fantasia acaba servindo como um estímulo ao consumo. Se não fossem elas, as lojas venderiam menos”, explica Sílvio Vasconcelos, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas do Recife.
Se a criatividade estiver em alta, ainda dá para reciclar as roupas que não estão saindo bem na loja. É o que faz Magda Coeli, da marca pernambucana Refazenda, que trabalha com rendas, bordados e tecidos regionais. “Em vez de liquidar, reutilizo as peças nas fantasias”, afirma ela, que vende figurinos que vão de R$ 35 a R$ 180.
Nessa montagem, Magda adota uma regra completamente diferente daquela que vale para o calendário tradicional da moda, no qual as tendências variam todo ano de acordo com as estações. “Para a coleção carnaval, vale sempre a mesma coisa: as roupas precisam ser leves, frescas e confortáveis.”
Além disso, para a estilista-foliã é essencial que a própria pessoa faça parte da sua fantasia. “É ela quem vai dar vida à personagem. O carnaval nada mais é do que um grande teatro, onde as pessoas podem ser ou fazer aquilo que sempre quiseram.”
Entre as criações da Refazenda deste ano, por exemplo, está uma Miss Gracinha, para as moçoilas que sempre sonharam em desfilar. E um leque que, quando aberto, parece uma grande folha de alface. “Esse é para os vegetarianos, que não comem carne nem no carnaval!”, diverte-se Magda.
Algumas dessas fantasias a empresária já exportou para São Paulo. Na vitrine da loja recém-aberta na Vila Madalena estão uma colombina passista de frevo, uma palhaça sensual e uma espanhola. “É uma incógnita saber se vai vender. Queremos mais é mostrar a cultura pernambucana.” Para o próximo ano, Magda promete colocar um bloco nas ruas do bairro paulistano tocando frevo.
Fonte: Valor