Da geléia à elegância, as várias faces da Pinot Noir
Na degustação de vinhos elaborados com Pinot Noir, publicada na coluna da semana passada, procurei dar um panorama geral sobre como esta casta tão caprichosa se comporta fora de suas origem, a Borgonha, tecendo comentários sobre alguns dos rótulos que compuseram o painel. O interesse de leitores em relação e a curiosidade acerca de vinhos não especificamente citados, faz valer um adendo à matéria anterior (veja tabela).
Lembrando o critério especificado no último artigo, o painel foi dividido em três baterias. Na primeira, dois borgonhas clássicos tiveram neozelandeses como companhia, afinal são os que, teoricamente, ressaltadas as diferenças de terroir, mais se assemelham aos originais. Isso não só se confirmou como mostrou que os Pinots da Nova Zelândia são a melhor alternativa aos cada vez mais caros franceses da gama intermediária. Do bom desempenho neozelandês destoa o Matariki, eventualmente devido à procedência, Hawkes Bay, situada na zona central da Ilha Norte. Não é o caso do Ata Rangi, da região de Martinborough, considerada, junto com Central Otago, as zonas mais apropriadas para cultivar Pinot Noir.
É de Martinborough, aliás, o Pencarrow, que a despeito de pertencer a uma linha mais simples foi o melhor da segunda série, especialmente composta para, tendo como parâmetro rótulos básicos da Borgonha, avaliar a Pinot Noir fora dela, em outras denominações de origem francesas e italianas. De quebra, uma surpresa, até agradável: o Quinta da Neve, um projeto novo em Santa Catarina, que conta com consultoria do enólogo português, Anselmo Mendes. Ainda que, compreensivelmente, careça de complexidade mostra bom frescor, equilíbrio e uma certa tipicidade, virtude que falta aos dois italianos. Ambos, provenientes de vinícolas conceituadas pecam ainda no quesito taninos – o de Alois Lageder, algo diluído, faz supor que as uvas não atingiram bom nível de maturação, e o de Antinori, foi o mais adstringente de todos da degustação. Interessante, por outro lado o alsaciano, denotando esmero na matéria prima e benéfica evolução ao longo dos seus cinco anos. Os borgonhas decepcionaram, comprovando a teoria que lá, em especial, o fator humano é fundamental.
Reunir a brigada sul-americana foi o que norteou a terceira bateria. São vinhos, regra geral, mais robustos, com mais cor e álcool, e baixa acidez, que os deixa com sensação meio adocicada no final. É bem o estilo americano -jammy (derivativo de geléia, em inglês). Pinot Noir não é ” isso ” . Talvez do Chile, que tem aberto novas frentes com o desenvolvimento de regiões vinícolas mais frias, de onde estão saindo uma leva de belos vinhos brancos, venha no futuro algum digno representante dessa linhagem que se distingue pela elegância. O Amayna mostra esse caminho e o Leyda Lote 21 – o Las Brisas, da mesma vinícola, que o substituiu, é bem inferior – eventualmente confirmaria se estivesse disponível no mercado brasileiro. Da mesma forma que o australiano Coldstream Hills, do Yarra Valley, também em falta.
Fonte: Valor