Amarga estréia
A nomeação de Guido Mantega para o Ministério da Fazenda e suas declarações,
logo pela manhã, de que o país deveria ter ´taxas de juros civilizadas´
ecoaram de forma negativa no mercado financeiro durante quase todo o dia de
ontem. A Bolsa chegou a operar em queda de 2,9% e o dólar, em alta de 2,9%,
com o receio dos investidores sobre a condução da política econômica. Ao fim
da tarde, o discurso do novo ministro tranqüilizou os analistas, mas não fez
frente à previsão de que o aperto monetário nos Estados Unidos vai além do
inicialmente previsto – o que pode levar o capital estrangeiro a abandonar o
Brasil.
Na Bolsa de Valores de São Paulo, os negócios encerraram em queda de 2,54%,
aos 36.682 pontos. O dólar fechou em alta de 1,75%, a R$ 2,207. O risco
Brasil subiu cinco pontos, fechando em 241 pontos.
Antes da abertura dos mercados, Mantega afirmou que, com a inflação sob
controle, nada impediria que o país tivesse taxas mais baixas. O nervosismo
era agravado pelo temor de que o presidente do Banco Central, Henrique
Meirelles, teria o mesmo destino de profissionais técnicos que se
demitiram – Joaquim Levy, da Secretaria do Tesouro, Murilo Portugal, da
Secretaria Executiva do ministério, e Marcos Lisboa, do Instituto de
Resseguros.
O discurso de Mantega na segunda-feira também contribuiu para o nervosismo.
– Ele disse que não fazia parte do BC, mas integrava o Conselho Monetário
Nacional. Isso levou à especulação de que poderia atuar para elevar a meta
de inflação (este ano, de 4,5%), permitindo afrouxamento dos juros. E, ao
comentar que poderia mudar a equipe, sugeriu que poderia dispensar
Meirelles – avalia Marcelo Voss, economista-chefe da corretora Liquidez.
Os investidores voltaram à razão por um breve instante quando o governo
afirmou que Meirelles seria mantido.
– Com o discurso pela manutenção da política monetária, Mantega indicou que
não vai interferir nas decisões do BC. Mas só teremos certeza disso no
dia-a-dia – avalia o economista-chefe do ABN Amro Real, Mário Mesquita.
– A presença de Meirelles garante que não haverá mudanças na política
monetária. Mas Mantega terá de conquistar a confiança do mercado na prática,
em ocasiões como a decisão sobre a TJLP (que baliza as taxas de
financiamentos no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) –
opina Marcelo Mesquita, economista-chefe do UBS.
O efeito positivo gerado pela entrevista de Mantega foi derrubado, porém,
pelo anúncio de que a taxa de juros americana foi elevada de 4,5% para 4,75%
ao ano.
– O comunicado sobre a decisão do Federal Reserve (Fed, o BC americano)
deixou claro que o ajuste da taxa irá além do esperado – comenta Voss.
A elevação dos juros nos EUA torna os títulos americanos mais atraentes ao
capital externo em relação aos emitidos pelos governos de países emergentes.
A possibilidade de aperto maior nos EUA pode provocar uma fuga de recursos
dos mercados de maior risco – caso do Brasil. O resultado se refletiu de
forma imediata na Bovespa e na cotação do dólar.
Fonte: Jornal do Brasil