A economia da manipulação e do engano
Há dois anos George Akerlof e Robert Shiller, ambos Prêmio Nobel de Economia, de 2001 e 2013 respectivamente, publicaram um livro que trata da economia da manipulação e do engano (Akerlof, G.A.; Shiller, R.J. Pbisbing for pbools the economics of manipulation and deception. Princeton: Princeton University Press, 2015). Segundo esses autores a economia de mercado, baseada na iniciativa individual com o objetivo do lucro, não somente produz bem-estar, como na mão invisível de Adam Smith, mas também usa a desinformação e as fraquezas do consumidor para ludibriá-lo, induzindo-o a comprar bens e serviços que não aumentam seu padrão de vida. A manipulação e o engano seriam uma falha de mercado que teria de ser corrigida pela regulação.
A manipulação e o engano fazem parte do nosso cotidiano tanto na economia como na política. Comecemos pela economia. Os frequentadores de shopping center no Brasil estão acostumados com as escadas rolantes que nos obrigam a dar voltas desnecessárias. Os donos desses shoppings desejam nos induzir a fazer compras nas lojas pelas quais teremos de passar obrigatoriamente.
O novo aeroporto do Galeão é um puxadão com serviços tão ruins quanto o velho Galeão. Na chegada de viagens internacionais o passageiro tem obrigatoriamente de passar por um shopping tortuoso, com produtos supostamente livres de impostos (duty free), mas que na verdade praticam preços extorsivos de monopólio. Alguns bancos brasileiros oferecem a seus clientes idosos títulos de capitalização, sem que eles saibam exatamente o que estão comprando. Na linguagem de Akerlof e Shiller esses bancos pescaram um bobo.
Na mídia brasileira encontra-se com frequência anúncios de financiamento de automóveis com uma taxa de Juros igual a zero. Outra estratégia para pescar um bobo. Quem vai tomar dinheiro pagando caro para emprestar a zero? Me engana que eu acredito. Papai Noel existe. O programa de milhas das companhias aéreas tornou-se parte da economia da manipulação, pois nesse programa você viaja para onde não quer na data que não deseja. Os lugares que você quer viajar não estão disponíveis, e quando estão o preço em milhas é exorbitante.
A televisão brasileira pretende ser a guardiã da ética e da moral, mas seu telhado de vidro é enorme. Ela anuncia que o programa X será levado ao ar depois do programa Y, sem dizer os horários dos mesmos. Uma tentativa de manipulação que desrespeita o consumidor. Os anúncios de cerveja usam e abusam de mulheres sensuais com um bumbum para senhor nenhum pôr defeito. O bumbum é a preferência do brasileiro. A intenção de manipulação é clara: tornar aquela marca de cerveja preferência nacional. Os operadores de telemarketing nos ligam oferecendo serviços cujos preços seriam imbatíveis, produzindo uma redução substancial nos nossos gastos. Para essa tentativa de manipulação a melhor opção é desligar o telefone.
A economia da manipulação e do engano se aplica também à política. Alguns partidos políticos tentam manipular os eleitores com um discurso baseado na defesa da ética e da moral, adotando uma visão maniqueísta do mundo, onde eles sempre estão do lado do bem. Uma vez no poder se despem dessa fantasia e caem na gandaia. Outros partidos tentam manipular os eleitores com uma proposta ideológica, que ser- viria de guia quando instalados no poder. Na verdade, a ideologia era apenas um biombo, para esconder o fato de que o verdadeiro objetivo era o poder pelo poder.
A grande farra da economia da manipulação e do engano na política ocorre nas eleições. Os partidos políticos contratam os marqueteiros que vão construir personagens para os candidatos do partido e destruir os candidatos dos outros partidos. Um grande marqueteiro é capaz de transformar um poste num grande executivo ou mesmo num estadista. A eleição transforma-se numa competição de marqueteiros, na qual vence o melhor marqueteiro e não o melhor candidato. O povo depois paga a conta pela escolha que fez. A desinformação dos eleitores produz uma falha no sistema democrático, que nem sempre será corrigida na próxima eleição. A melhor opção para lidar com esse tipo de manipulação seria o regime parlamentarista que permite eleições mais frequentes, em vez do sistema presidencialista com eleições definidas em prazos fixos.
Fonte: Revista Conjuntura Econômica